Embora o Código de Processo Penal (CPP) determine que os
interrogatórios dos réus sejam individuais, nada impede que o advogado de outro
corréu participe do questionamento. Essa foi a posição adotada de forma unânime
pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao analisar pedido de
habeas corpus em favor de um engenheiro responsável por obra que desabou no
município de Içara (SC).
O engenheiro e dois corréus, o dono da obra e o construtor,
foram acusados pelos crimes de homicídio e lesão corporal culposos, previstos
nos artigos 121 e 129 do Código Penal. Apenas o engenheiro foi condenado, mas
pelo crime de desabamento (artigo 256).
No habeas corpus impetrado no STJ, alegou-se constrangimento
ilegal e cerceamento de defesa, já que o defensor do condenado foi impedido de
participar ativamente dos interrogatórios dos corréus. A defesa afirmou que
houve delação por parte destes, o que teria levado à condenação do engenheiro.
Também afirmou que o representante do Ministério Público pôde
participar dos questionamentos, em desrespeito ao princípio da “igualdade de
armas”. A defesa apontou ainda outros prejuízos ao réu, pois um pedido por nova
perícia não foi acatado e a pena foi fixada acima do previsto em lei.
Garantias constitucionais
A ampla defesa e o contraditório são direitos garantidos
pela Constituição Federal de 1988, ressaltou o relator do habeas corpus,
ministro Jorge Mussi. Segundo ele, não é possível dissociar a produção de
provas dessas garantias ao acusado. Isso é particularmente relevante em
processos como esse, em que há corréus em ação penal com teses conflitantes.
O ministro reconheceu que o STJ já tomou decisões negando ao
advogado de um réu o direito de participar do interrogatório de corréus, pois
estaria interferindo no direito de defesa destes. Porém, nos julgados mais
recentes da Corte e do Supremo Tribunal Federal (STF), essa participação tem
sido admitida.
“Uma leitura de todos os dispositivos que disciplinam o
interrogatório não permite a conclusão de que a defesa do corréu não tem o
direito de questionar o outro que está sendo interrogado, ainda que este não
possa ser considerado testemunha”, esclareceu o relator.
Direito ao silêncio
O artigo 191 do CPP determina que, no caso de pluralidade de
réus, eles serão interrogados separadamente. Para o ministro Mussi, isso não
leva à conclusão de que a participação do defensor de outro dos réus seja
vedada. Essa participação é especialmente importante nas situações em que a
tese de defesa de um dos réus imputa a responsabilidade aos corréus.
“Para que tais declarações possam ser validamente sopesadas
pelo julgador, mister que se tenha dado a oportunidade do contraditório a todos
os interessados, sob pena de se ter incutido no processo um meio de prova
produzido ao arrepio de garantias constitucionais”, concluiu.
O ministro Mussi também observou que, ao ser questionado
pelo advogado de outra parte, o réu não fica na condição de testemunha,
mantendo seu direito ao silêncio, assegurado pelo artigo 186 do CPP. Com essas
considerações, o relator anulou a ação penal desde os interrogatórios,
assegurando a todos os corréus o direito de, por seus advogados, formular
perguntas aos demais acusados.
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