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quinta-feira, abril 14

Um placebo chamado desarmamento

Por Rubem Penz (*)


“Proibir arma legal é combater as drogas na farmácia.”

O magnífico José Sarney, surfando na onda da comoção nacional pela tragédia do Realengo, requentou o tema do desarmamento e arma nova consulta popular. Agora, preparo-me para ler e escutar pessoas que admiro profundamente aderindo à tese de que a proibição do comércio de armas legais resolverá o problema da violência no Brasil. Gente que, assim como eu, não tem arma em casa, não pretende comprar uma arma, não frequenta estandes de tiro. Pessoas de bem, respeitáveis, inteligentes. As mesmas que estarão espantadas ao constatar que sou contra o desarmamento, ao menos nos moldes como estarão propondo. Clemência, por favor – minha posição é defensável.

Imputar às armas legalmente adquiridas no país o status de fonte que abastece o crime é igual a dizer que os remédios de tarja preta são os responsáveis pelo problema nacional das drogas. Desconsideram a maconha, a cocaína e o crack que entram em toneladas no Brasil ilegalmente: isso é outro caso, muito difícil de resolver. Olha o tamanho da nossa fronteira! A substância que, para ser adquirida, demanda receita médica especial, alvo de severo controle, também é droga pesada. Proíbe-se sua comercialização e, na hora, importante modo de drogatização é resolvido. Será?

Ao montar o argumento, não esqueci daqueles para os quais os remédios controlados são indispensáveis à saúde. Ao contrário. Evoco sua lembrança para falar dos que dependem de armas de fogo para manter sua segurança. Pasme: eles existem! Por exemplo, o estancieiro que está quilômetros distante da ajuda mais próxima, isolado e indefeso. Hoje, um delinquente pensa duas vezes antes de entrar na propriedade para suprimir seus bens (na melhor das hipóteses) apenas pelo fato de que poderá sofrer uma resistência letal. Isso é uma exceção? Claro! Assim como é exceção nosso doente que não vê seu problema resolvido com aspirina. Ambos cumprem severa legislação e estão obedientes à lei. A eles a proibição atingiria. Somente a eles.

É óbvio que o problema da violência no Brasil não está na arma legal, assim como o das drogas não está nas substâncias legais. Arrisco dizer, inclusive, que a proporção é a mesma, ao menos na população civil. As consequências de uma consulta popular proibindo armas lícitas, alimentada por uma tragédia nascida de uma arma ilegalmente adquirida, tem a mesma eficácia de o combate ao crack começar pela proibição dos remédios da farmácia. Isto é, prometem-nos a cura do mal ministrando placebo, e seguirão placidamente contando os mortos, livres de dor de consciência. A não ser que o alvo desse tiro seja outro. Mas aí também é outro artigo.

*Escritor e músico

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