(*) Maurício Morimoto Doi, Defensor Público do DF
Recentemente, o Conselho Nacional de Justiça manifestou-se sobre a posição das partes nas
salas de audiências criminais.
Por mais que a decisão tenha sido no sentido do arquivamento
do feito, sem resolução do mérito, o conselheiro relator, Dr. Marcelo Nobre,
externou o seu entendimento no sentido de que “a igualdade, a tolerância e a
conciliação são valores mais que prestigiados em desfavor da retórica, das
togas e anéis” e que “o importante é definir o modelo, pois a reformulação das
salas de audiência acontecerá gradualmente durante os anos.
O importante é que se nota um grande avanço na discussão
dessa relevante questão que inevitavelmente esbarra em princípios
constitucionais como o da igualdade substancial e o do devido processo legal.
Mas como compatibilizar os diplomas legais pertinentes? Basta, primeiramente,
que o magistrado, o membro do Ministério Público e o defensor/público/advogado
fiquem no mesmo plano que a LC 80/94 e a Lei 8906/94 sejam respeitadas.
Após, é suficiente que o promotor de justiça/procurador da
república, tome assento “imediatamente” à direita do juiz, isto é, contíguo,
sem ninguém de permeio, no seu lado direito. Pouco importa o ângulo formado
entre o magistrado e o representante do MP. O que importa é que não haja
intermediários e que seja no lado direito daquele. Nessa hipótese, a LC 75/93
também estaria sendo cumprida e a prerrogativa ministerial efetivada.
No entanto, a insurgência de alguns órgãos do Ministério Público
é no sentido de que a expressão “imediatamente à direita” impõe que seus
membros fiquem germinados com o juiz. Em verdade, o Parquet procura manter uma
posição de prevalência ou de superioridade simbólica, visto que transmitiriam a
imagem de que seriam completamente imparciais, tal como o magistrado.
E essa simbologia hierárquica torna-se ainda mais perniciosa
nas sessões de Instrução e julgamento perante o Tribunal do Júri, formado por
cidadãos leigos que, muitas vezes, não distinguem as partes processuais,
confundindo o Estado-juiz e o Estado-acusador.
Em diversas pesquisas realizadas, constatou-se que a figura
do juiz presidente é, de longe, aquela que inspira mais confiança entre os
jurados. Assim, se o órgão acusatório apresenta-se ‘grudado’ com o magistrado,
a sustentação ministerial já elevaria, a priori, vantagem em relação à
sustentação defensiva para fins de julgamento pelos juízes leigos. Nessa
perspectiva, é imperioso distinguir as duas faces do Parquet. Se, por um lado,
atua como custos legis nas causas afetas ao Direito de Família, vg., por outro
ele atua como parte, sendo o dominus litis no processo penal.
Nesse cenário, de partes opostas, deve o julgador
mostrar-se e apresentar-se como figura
imparcial, eqüidistante das partes. Deve efetivar a paridade de armas entre
acusação e defesa. E é por isso que corajosos juízes, como o Dr Ali Mazloum, o
Dr. Fábio Martins de Lima e o Dr. Bem-Hur Viza (entre outros) alteraram o
layout das suas salas de audiências a fim de efetivar os princípios da
igualdade substancial e do devido processo legal.
A propósito, sendo o Ministério Público o fiscal da lei,
deveria ser o primeiro a requerer o cumprimento, concomitantemente com o seu
estatuto, da LC 80/94 e da Lei 8906/94, pondo fim a esse ultrapassado modelo de
três níveis de simbologia hierárquica, incompatíveis com a atual sistemática
constitucional e legal. O Supremo Tribunal Federal já decidiu nesse sentido,
asseverando que “acusação e defesa devem estar em igualdade de condições, não
sendo agasalhável, constitucionalmente, interpretação de normas reveladoras da
ordem jurídica que deságüe em tratamento preferencial” (RMS 21884, Rel.
Ministro Marco Aurélio, j, em 17/05/1994, DJ 25.11.1994).
Merece destaque que o Ministro-relator, Marco Aurélio de Melo,
no julgamento do referido RMS, ressaltou que “o inciso I do artigo 18 da Lei
Complementar 75/93 deve ser entendido como norma que encerra o reconhecimento
de uma tradição nos colegiados. Revela não em si uma regra processual, mas a
normatização de uma prerrogativa da Instituição, muito embora, levada às
últimas conseqüências, sujeita à crítica sob o ângulo constitucional,
considerada o tratamento igualitário devido às partes, isso quando o órgão do
Ministério Público atua com tal qualidade.” Portanto, torna-se imperioso
adequar-se o modelo de cátedras das salas de audiências criminais e do Tribunal
do Júri ao atual ordenamento positivo.
(*)Artigo publicado no Suplemento Direito e Justiça do Jornal Correio Braziliense, em
20 de agosto de 2012.
Nenhum comentário:
Postar um comentário