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sábado, setembro 8

Da posição das partes nas salas de audiências criminais (*)


(*) Maurício Morimoto Doi, Defensor Público do DF


Recentemente, o Conselho Nacional de Justiça  manifestou-se sobre a posição das partes nas salas de audiências criminais.

Por mais que a decisão tenha sido no sentido do arquivamento do feito, sem resolução do mérito, o conselheiro relator, Dr. Marcelo Nobre, externou o seu entendimento no sentido de que “a igualdade, a tolerância e a conciliação são valores mais que prestigiados em desfavor da retórica, das togas e anéis” e que “o importante é definir o modelo, pois a reformulação das salas de audiência acontecerá gradualmente durante os anos.

O importante é que se nota um grande avanço na discussão dessa relevante questão que inevitavelmente esbarra em princípios constitucionais como o da igualdade substancial e o do devido processo legal. Mas como compatibilizar os diplomas legais pertinentes? Basta, primeiramente, que o magistrado, o membro do Ministério Público e o defensor/público/advogado fiquem no mesmo plano que a LC 80/94 e a Lei 8906/94 sejam respeitadas.

Após, é suficiente que o promotor de justiça/procurador da república, tome assento “imediatamente” à direita do juiz, isto é, contíguo, sem ninguém de permeio, no seu lado direito. Pouco importa o ângulo formado entre o magistrado e o representante do MP. O que importa é que não haja intermediários e que seja no lado direito daquele. Nessa hipótese, a LC 75/93 também estaria sendo cumprida e a prerrogativa ministerial efetivada.

No entanto, a insurgência de alguns órgãos do Ministério Público é no sentido de que a expressão “imediatamente à direita” impõe que seus membros fiquem germinados com o juiz. Em verdade, o Parquet procura manter uma posição de prevalência ou de superioridade simbólica, visto que transmitiriam a imagem de que seriam completamente imparciais, tal como o magistrado.

E essa simbologia hierárquica torna-se ainda mais perniciosa nas sessões de Instrução e julgamento perante o Tribunal do Júri, formado por cidadãos leigos que, muitas vezes, não distinguem as partes processuais, confundindo o Estado-juiz e o Estado-acusador.

Em diversas pesquisas realizadas, constatou-se que a figura do juiz presidente é, de longe, aquela que inspira mais confiança entre os jurados. Assim, se o órgão acusatório apresenta-se ‘grudado’ com o magistrado, a sustentação ministerial já elevaria, a priori, vantagem em relação à sustentação defensiva para fins de julgamento pelos juízes leigos. Nessa perspectiva, é imperioso distinguir as duas faces do Parquet. Se, por um lado, atua como custos legis nas causas afetas ao Direito de Família, vg., por outro ele atua como parte, sendo o dominus litis no processo penal.

Nesse cenário, de partes opostas, deve o julgador mostrar-se  e apresentar-se como figura imparcial, eqüidistante das partes. Deve efetivar a paridade de armas entre acusação e defesa. E é por isso que corajosos juízes, como o Dr Ali Mazloum, o Dr. Fábio Martins de Lima e o Dr. Bem-Hur Viza (entre outros) alteraram o layout das suas salas de audiências a fim de efetivar os princípios da igualdade substancial e do devido processo legal.

A propósito, sendo o Ministério Público o fiscal da lei, deveria ser o primeiro a requerer o cumprimento, concomitantemente com o seu estatuto, da LC 80/94 e da Lei 8906/94, pondo fim a esse ultrapassado modelo de três níveis de simbologia hierárquica, incompatíveis com a atual sistemática constitucional e legal. O Supremo Tribunal Federal já decidiu nesse sentido, asseverando que “acusação e defesa devem estar em igualdade de condições, não sendo agasalhável, constitucionalmente, interpretação de normas reveladoras da ordem jurídica que deságüe em tratamento preferencial” (RMS 21884, Rel. Ministro Marco Aurélio, j, em 17/05/1994, DJ 25.11.1994).

Merece destaque que o Ministro-relator, Marco Aurélio de Melo, no julgamento do referido RMS, ressaltou que “o inciso I do artigo 18 da Lei Complementar 75/93 deve ser entendido como norma que encerra o reconhecimento de uma tradição nos colegiados. Revela não em si uma regra processual, mas a normatização de uma prerrogativa da Instituição, muito embora, levada às últimas conseqüências, sujeita à crítica sob o ângulo constitucional, considerada o tratamento igualitário devido às partes, isso quando o órgão do Ministério Público atua com tal qualidade.” Portanto, torna-se imperioso adequar-se o modelo de cátedras das salas de audiências criminais e do Tribunal do Júri ao atual ordenamento positivo.

(*)Artigo publicado no Suplemento Direito e Justiça do Jornal Correio Braziliense,  em

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