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domingo, janeiro 13

Embriaguez ao volante: como provar?


Carolina Cunha,
Para o Blog

O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) disciplina, nos artigos 165 e 306, o tratamento a ser dispensado aos motoristas que dirigem após a ingestão de bebida alcoólica.

O primeiro dispositivo trata da infração administrativa de “dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”. A conduta configura infração gravíssima, sujeita à aplicação de multa e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze meses).

 O artigo 306, por sua vez, traz o comportamento típico penal de quem “conduz veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência.”.

O comportamento configura crime e a pena é de detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Vê-se, assim, que a diferença entre os comportamentos é a elementar do tipo penal “com capacidade psicomotora alterada” e, justo por isso, muito se discute – e é importante para a segurança jurídica que se discuta – sobre o que configura ou como se demonstra  essa alteração da capacidade psicomotora.

Em sua origem, na norma de  1997, a redação do artigo 306 CTB criminalizava a conduta de  “conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem”.

A partir de 2008, a polêmica e propalada Lei 11.705 operou alteração na redação do artigo 306 e acrescentou, como elementar do tipo penal, o parâmetro de 6 (seis) decigramas de álcool por litro de sangue como limite máximo de tolerância para o condutor.

O parágrafo único do mesmo dispositivo legal determinava que o Poder Executivo estipulasse a equivalência entre este parâmetro e os demais testes de alcoolemia possíveis e, atendendo esta disposição, foi fixado o índice de 0,3 miligramas de álcool por litro de ar pulmonar, a ser verificado através do teste de etilômetro, conhecido popularmente como bafômetro.

Ocorre que, sob o abrigo do princípio constitucional de que ninguém é obrigado a produzir prova contra si, a grande maioria dos motoristas negava-se a soprar o bafômetro e, assim, não era possível afirmar-se que estavam embriagados, pois aquela quantidade de álcool no sangue ou no ar pulmonar era elementar do tipo e, portanto, indispensável. 

 A partir desta percepção e, por razões de política criminal, outras provas da embriaguez passaram a ser defendidas como aptas a configurar o crime do artigo 306 do CTB: vídeos, testemunhas, etc. No entanto, sempre se esbarrava na ausência de comprovação da elementar do tipo “concentração de álcool”.

Por isso, em 2012, às vésperas dos feriados de final de ano, foi sancionada a Lei 12.760, através da qual o índice de álcool no sangue deixou de ser elementar do tipo penal e passou a ser tratado apenas como uma das formas de constatar a embriaguez.

É nestes termos a redação do parágrafo primeiro do artigo 306: 

As condutas previstas no caput serão constatadas por:        
  
 I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou         
 
II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.

E o parágrafo segundo complementa, apontando que a verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova. No parágrafo terceiro, a Lei determina que caberá ao  Contran dispor sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia.

Estas regras vêm sendo aplicadas desde a publicação da Lei 12.760/2012, em 20 de dezembro de 2012, porém, a nosso ver, ainda hoje a única forma de comprovar a embriaguez – nos termos da Lei – é através da concentração de álcool no sangue.

Explica-se:

Consta no inciso II do artigo 306 que o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) deverá determinar quais são os sinais que indicam alteração na capacidade psicomotora, mas ainda hoje não há essa regulamentação.

É de se perguntar: estes sinais seriam algo como andar cambaleante? Ou seria “fala enrolada”? Seria reagir agressivamente quando abordado? Seria ter garrafas de bebida no carro? Ou seria o hálito de quem bebeu?
Que sinais são esses?

Trata-se, portanto, de Lei Penal em branco e que somente poderá ser aplicada quando seu preceito primário estiver completamente preenchido, sob pena de se violar o princípio da legalidade.

Os que defendem que a lei é autoaplicável apoiam-se nas disposições do parágrafo 2º do artigo 306 do CTB e também na Resolução CONTRAN n. 206, de 20 de outubro de 2006, de idêntico teor. 

No entanto, a nosso sentir, a lei deixa claro que uma coisa são os sinais capazes de demonstrar alteração na capacidade psicomotora e outra coisa são as formas como se pode comprovar a presença  destes sinais.

As formas de comprovação estão previstas na Lei e na Resolução 206 do Contran, ma não existem indicações, na lei, tampouco na resolução, de quais sejam os sinais que indicam estar o condutor embriagado.

Para  melhor ilustrar a diferença, afirma-se: um vídeo pode comprovar a embriaguez, pois que a lei dispõe que essa é uma prova aceitável; mas, o que precisa conter nesse vídeo? Qual circunstância ou comportamento de quem está sendo filmada indica a existência da embriaguez? Seria a fala do condutor dizendo que bebeu? A sua aparência cambaleante? A imagem de um motorista realizando manobras arriscadas?

Isso não se sabe, pois a legislador delegou esta tarefa para o Contran, que ainda não a cumpriu.

Assim, enquanto não houver regulamentação pelo Contran, somente o bafômetro e/ou exame de sangue são capazes de comprovar a embriaguez necessária para configuração do crime do artigo 306 do CTB, sob pena de se verem violados o princípio da legalidade e a segurança jurídica. 

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