Outro lado
O Site G1 procurou os quatro médicos réus no processo de homicídio contra os quatro pacientes para comentar as acusações. Todos se defenderam, seja pessoalmente ou por meio de seus advogados. Disseram que havia um programa de transplante, sim, mas que os rins eram retirados de pacientes com morte encefálica e mediante autorização das famílias deles. Alegaram ainda serem inocentes dos crimes.
Disseram que o Conselho Regional de Medicina os considerou inocentes das acusações e que tiveram prejuízos na carreira profissional e na vida pessoal por conta do que chamaram de acusações mentirosas.
“Ficou comprovado que [os pacientes] estavam em morte encefálica. Estavam mortos. Se os indivíduos estavam mortos, não tem como eu ser acusado de uma coisa, se eles estavam mortos. O que eu fiz...a minha participação foi no diagnóstico da morte encefálica”, disse o neurocirurgião Mariano Fiore Júnior, de 62 anos.
A respeito do julgamento, Fiore Júnior disse que aguarda somente ser absolvido pelos jurados. “Eu espero ser considerado inocente, né? Já que eu fui envolvido numa situação na qual eu não acho justa porque eu só fiz o diagnóstico da morte encefálica. Não participei de retirada de órgãos, não sei fazer isso, não entrei no centro cirúrgico, não tive contato com enfermagem de centro cirúrgico, não sei de nada disso. Isso daí foi a equipe de doação. A minha função era fazer o diagnóstico. Minha função como plantonista era fazer o diagnóstico da morte encefálica. E escrever e dizer para o médico intensivista: ‘está em morte encefálica’.
Ele ou alguém do hospital comunicava a equipe de captação de órgãos que fazia... Eu não fazia parte da equipe de captação de órgãos. Desconheço a razão dessa acusação de envolvimento na morte encefálica porque eu não fiz... Eu só fiz o diagnóstico da morte encefálica”, afirmou.
O urologista Rui Noronha Sacramento, de 60 anos, também rebateu as acusações do Ministério Público. “Em primeiro lugar, é uma mentira a acusação. Em segundo, eu há 36 anos sou médico para cuidar da vida das pessoas e para melhorar a vida delas. Nunca agi contra a vida em nenhum momento da minha carreira.
Na equipe que há vinte e tantos anos, na cidade de Taubaté, realizou retiradas de rim, nefrectomias de
cadáver para transplante renal, e que realizou transplante renal na cidade de Taubaté e em outras cidades lá, eu era o cirurgião responsável pela retirada do órgão e pela colocação nos outros pacientes que precisavam do transplante. Nunca foi feita retirada de órgão de paciente que tivesse o menor sinal de vida”, disse.
O advogado João Romeu Correa Goffi, que defende Rui Sacramento, o nefrologista Pedro Henrique Masjuan Torrecillas e o neurocirurgião Aurélio de Carvalho Monteiro, também afirmou que seus clientes são inocentes das acusações.
“Esses rapazes [médicos] estão sendo injustiçados, profundamente injustiçados. Quando foram feitas as retiradas dos rins, não estavam somente eles, equipe de transplante, presentes na sala. Havia estudantes de medicina, anestesistas, havia um grande corpo clínico, pessoas que se interessavam em conhecer o procedimento. Então, como num contexto desse pode ter havido algo tão grotesco? Eles disseram que pelo que foi apresentado a eles, não dava para afirmar que os pacientes estavam mortos. Só que nós alegamos que houve manipulação de documentos. Havia um convênio entre a equipe daqui e a polícia para fazer esse serviço. E depois com o Exército. A aeronave do Exército fazia o transporte desses órgãos para São Paulo. Era uma coisa totalmente pública”, disse o advogado Correa Goffi.
A reportagem do G1 entrou em contato com a Polícia Rodoviária Federal em São Paulo e com o Exército, com sede na capital paulista, para comentar o assunto.
O departamento de comunicação da Polícia Rodoviária Federal disse desconhecer o transporte de órgãos humanos nos anos 80.
“Não é uma prática comum, corriqueira. Nem o transporte nem a escolta para o transporte. Se existir uma eventual solicitação, essa solicitação tem de ser devidamente documentada e oficiada. A polícia informa ainda que desconhece transporte de órgãos na década de 80. Os policiais têm treinamento de resgate, primeiros-socorros, e não transporte de um órgão humano. Nenhum policial rodoviário está autorizado a transportar órgãos”, informou o departamento de comunicação.
O Exército divulgou nota na qual nega que tenha auxiliado no transporte de órgãos de Taubaté a São Paulo. “Considerando que o primeiro voo com origem na Base Aérea de Taubaté ocorreu em abril de 1989, a Força não possui registros anteriores a esta data”, informou a nota.
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