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quinta-feira, janeiro 13

Quando a culpa também é do professor

Por Cleber Benvegnú*

Vi meu pai, em idos tempos, ser convidado à mesa de autoridades simplesmente porque ostentava, no pequeno lugarejo em que morávamos, o título de professor. E, naquela época, tal qual hoje, o salário não era algo que enricasse alguém. Longe disso. O que lhe garantia essa condição, a mesma que tantos mestres de outrora ostentavam, era tão somente uma postura de quem respeitava e se dava por respeitar. De quem conhecia, moderava e ponderava. De quem tinha consciência da profissão que escolheu e, apesar das agruras, a ela se dedicava de corpo e alma.

Sim, esta é minha pauta: o magistério. Ocorre, porém, que não vou reproduzir odes às virtudes e à importância social da categoria – isso já fazem às pampas. Quero é reclamar do professor, mesmo sabendo que necessariamente desagradarei. Como desagrada o que foge ao politicamente correto e ao coro das multidões. Como desagrada o que contraria imexíveis zonas de conforto e grandes grupos de interesse – principalmente se escorados em influentes sindicatos.

Não importa. É hora de colocar na berlinda também os professores, pessoas físicas com nome e sobrenome. Não todos, por óbvio, mas aqueles que se encaixam num estereótipo decadente que tenho visto aumentar nos últimos anos. Aqueles que têm parcela significativa de culpa no cartório dos maus resultados da educação, apesar de quase sempre se esconderem nas supostas injustiças do sistema.

Reclamo do professor que só reclama, a ponto de transformar seu cotidiano numa lamúria permanente. Um chororô insuportável. Um fardo para si e para os outros – para os alunos, especialmente. Reclamo do professor que perdeu o charme, que não lê sequer o jornal do dia, não entra em biblioteca, vai dar aula com roupa de ginástica e só entende de novela. Daquele que jamais prepara uma aula e nunca tentou sequer ligar um computador. Daquele que não gosta do que faz e, por isso mesmo, não cria, não se valoriza. Só se lamuria, só choraminga. É triste e entristece.

Reclamo daquele que a tudo culpa o baixo salário. Explica sua muita preguiça na pouca cifra que recebe, como se isso justificasse a incompetência latente. Como se o magistério fosse a vítima escolhida para todos os males possíveis. A fila anda, ora bolas. Tem gente querendo esse lugar. E o dinheiro do povo é que paga essa conta, inclusive os interessantes dois meses de férias por ano. É preciso honrar o concurso por que passou. Fazer jus ao emprego público que escolheu – até porque já sabia das condições antes de nele entrar. Amar a profissão, apesar dos pesares. Ou dela desistir.

Não, não proponho parar de lutar ou abdicar da consciência crítica. Lutem por seus direitos, tudo bem. Protestem. Mas o professor tem de recuperar o autoconceito para além dos vencimentos. Para além do clichê sindicalista, que nada inova, nada propõe, nada desafia. Falo em fazer o que está ao seu alcance para melhorar a jornada, sem culpar os outros durante todo o tempo. Falo em superar essa cultura do coitadismo que se instalou em muitos corações e mentes. Afastar o baixo-astral. Falo, enfim, em vontade própria, em autoestima e, principalmente, em autocrítica – virtude indispensável a qualquer profissional.


*Advogado e jornalista

Fonte: Jornal Zero Hora

Comentário meu: Uma amiga me disse, outro dia, enquanto curtíamos a beira da praia do Laranjal que admirava minha paixão e devoção ao magistério. Eu respondi a ela que a par de todos as dificuldades do ensino superior, das mais variadas desconsiderações a que são submetidos os professores, não troco minha atividade docente por qualquer outra. Tenho consciência da importância do meu papel na formação dos meus alunos, e cumpro com dedicação e alegria o meu mister. Sei que meus alunos reconhecem isso. Publico, assim, o artigo do  advogado e jornalista Cléber Benvegnú, por sintetizar exatamente o que eu penso e tenho defendido perante muitos de meus colegas. O articulista faz referência ao modelo que foi seu pai. Eu não me surpreenderia se algum dos meus filhos - ou os dois - optassem por ser professor um dia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu também sou professor e embora todas as agruras da profissão não pretendo abandonar "o barco". Isto não quer dizer que não podemos lutar por melhores condições de trabalho e de salário. É muito interessante que o douto articulista não notou as mudanças da sociedade e o quanto os mestres perderam de prestigio, não por suas atitudes e sim por que a sociedade não nos reconhece.