Provocações para refletir sobre uma nova maneira de
raciocinar juridicamente. Essa foi a tônica da palestra “A crise da
complexidade e o direito”, proferida por Francisco Amaral, professor da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e presidente da Academia
Brasileira de Letras Jurídicas (ABLJ), no IX Seminário Ítalo-Ibero-Brasileiro
de Estudos Jurídicos, que ocorre no auditório do Superior Tribunal de Justiça
(STJ).
A mesa foi presidida pelo desembargador federal aposentado
Carlos Fernando Mathias de Souza, que já atuou no STJ. Ele apresentou Francisco
Amaral como um abnegado pela causa do direito e um dos maiores pensadores do
direito comparado no país.
O professor Amaral disse que o grande desafio dos novos
advogados e operadores do direito é aplicar o pensamento jurídico a uma
realidade cada vez mais dinâmica. A atual sociedade da informação afeta a
construção do conhecimento em todas as áreas, incluindo os estudos jurídicos.
“O advogado é, antes de mais nada, um solucionador de problemas. Hoje, para
resolver esses problemas jurídicos, é necessário escolher quais valores e
princípios são adequados”, destacou.
Cortes revolucionárias
O STJ e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm sido, na visão
do palestrante, os órgãos mais revolucionários no direito brasileiro, aplicando
os princípios do direito quando a lei não trata do tema. Citou como exemplos o
julgamento do mensalão e o reconhecimento da união homoafetiva. “O raciocínio
lógico-dedutivo já não é suficiente para conseguir uma sentença ‘correta’. As
certezas estão diminuindo e muitos conceitos antes inabaláveis do direito estão
mudando”, comentou. Entre outros, o professor Amaral deu como exemplos a
separação dos três Poderes e a abstração das normas jurídicas.
Francisco Amaral apontou que hoje o Legislativo se queixa do
Judiciário e do Executivo por supostamente usurpar sua função de criar leis.
“Mas não havia regras para o casal gay ou para fetos anencéfalos”, ponderou.
Para ele, o grande desafio das faculdades é ensinar a raciocinar juridicamente
sobre essas questões cada vez mais complexas.
O desafio é ainda maior com a globalização, que obriga o
contraste e a compatibilização de normas de sistemas diferentes – como o
brasileiro, de origem romana, e o estadunidense e o inglês, de origem
anglo-saxã. Essa contraposição deve lidar até mesmo com sistemas jurídicos que
se separaram mais recentemente da religião, como nos casos da China e Índia.
Mais concreto
A complexidade da realidade é muito maior do que qualquer
lei ou código, ele continuou. O próprio conceito do direito mudou, superando o
“conjunto de normas”. Hoje, o conceito também engloba princípios jurídicos,
cultura e outros elementos, e o direito é mais concreto, menos abstrato,
descendo para as questões mais particulares do ser humano.
“A sistematização não é indispensável, há tipos de direito
sem ela. Mas os princípios são indispensáveis, como o da dignidade humana”,
comentou.
“Os novos advogados vão agora enfrentar uma ‘pedreira’ pela
frente. Vão ter de estudar e pensar muito e ver como a sociedade brasileira vai
evoluir”, destacou o palestrante. Pare ele, hoje o Brasil está na borda de uma
revolução no pensamento jurídico. A lei deve ser encarada como o espírito da
comunidade; e esse raciocínio jurídico, como um espelho da sua cultura.
Fonte: Site do STJ
Nenhum comentário:
Postar um comentário