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quarta-feira, janeiro 23

As agências executivas como máquinas de policiar: tratando-se de sistema penal todos os policiais são vítimas!


Por Marcelo Oliveira de Moura(*)

Inicialmente, importante destacar que esta reflexão não tem qualquer objetivo de criar polêmica acerca do equívoco ou acerto das duas ações policiais que mencionarei abaixo.

Hoje durante a manhã, pela internet, tomei conhecimento dos dois fatos lamentáveis envolvendo agentes das policias militar e civil do Estado do Rio Grande do Sul.

Um primeiro caso, de um policial civil que reagiu a um assalto em um estabelecimento comercial na cidade de Porto Alegre e acabou, assim como sua mãe que o acompanhava, morto em troca de tiros com os assaltantes. (http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/policia/noticia/2013/01/mae-e-filho-policial-sao-mortos-a-tiros-em-porto-alegre-4018689.html)

No segundo caso, também na capital gaúcha, um agente da Brigada Militar, no interior de um trem (Trensurb), buscando dar conta de um “tumulto” causado por um homem que portava uma faca e ameaçava os passageiros, dispara contra o abdômen do mesmo, sendo que o projétil transpassa o corpo lesionandoa perna de um passageiro do coletivo. (http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/geral/noticia/2013/01/policial-atira-em-suspeito-que-ameacava-passageiros-com-uma-faca-no-trensurb-4018879.html)

Os dois episódios encontram, por óbvio, inúmeras conexões. No entanto, gostaria de destacar um aspecto relacionado com um debate que me parece abandonado (ou ocultado) no âmbito das nossas discussões (especialmente acadêmicas) e que encontrei, pela primeira vez, sugerido no capítulo quarto do livro clássico “Em busca das penas perdidas” do jurista latino-americano Eugenio Raúl Zaffaroni, cuja denominação utilizo na primeira parte do título: as agências executivas como máquinas de policiar!

Neste livro, cuja primeira edição nos remete para o início dos anos 90, Zaffaroni já alertava: Tem se falado bastante, nos últimos anos, no processo de criminalização, mas tem-se falado muito pouco no processo de policização, igualmente deteriorante... (p. 138). Resumidamente, ele representa um processo de deterioração daqueles que se incorporam às chamadas agências militarizadas do sistema penal (destaca-se aqui as polícias militares e civis, sendo estas últimas também consideradas militarizadas em sua estruturação e regulação) e que promove o esfacelamento da identidade original e substituição por uma identidade artificial, funcional ao exercício do poder da agência (p. 141).

Tal processo é, sem dúvida, de caráter complexo e multifacetado e a apreciação aprofundada dele não cabe neste pequeno texto.

Apenas gostaria de destacar aquilo que, desde meu ponto de vista, está relacionado com a produção dos “estereótipos do policial e sua profecia auto-realizadora” como “herói”, “justiceiro”, uma espécie de “Stallone Cobra” (o crime é a doença eu sou a cura). Aquele que na “guerra contra o inimigo”, na “luta contra o crime”, é empurrado a comportar-se ora como homicida, ora como suicida.
Aqui se começa a perceber o liame olvidado entre os dois casos: indiferença em relação à morte alheia e coragem nos limites suicidas, que são produzidos por discursos moralizantes das próprias instituições policiais e potencializados pela mídia.

Parece-me que se revelam aqui dimensões importantes no que diz respeito à “socialização policial violenta” do agente de polícia, o que, resgatando a segunda parte do título, nos mostra: tratando-se de sistema penal todos os policiais são vítimas!

(*) Professor do Curso de Direito da Universidade Católica de Pelotas

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