No âmbito da execução penal, é vedada a comutação e indulto
nos delitos da lei de drogas nº 11.343/ 2006, por expressa previsão nos
Decretos presidenciais promulgados, utilizando como exemplo, aduz o artigo 3º,
inciso II, do Decreto nº: 9.246 de 2017.
Art. 3º O indulto natalino ou a comutação de pena não será
concedido às pessoas condenadas por crime:
II – tipificado nos art. 33, caput e § 1º , art. 34 , art.
36 e art. 37 da Lei nº 11.343, de 2006 , exceto na hipótese prevista no art.
1º, caput , inciso IV, deste Decreto.
Há, portanto, apenas uma possibilidade de comutação e
indulto na lei de drogas que é o tráfico privilegiado, nos termos do que dispõe
o artigo 33, §4º da Lei nº: 11.343/2006.
Essa previsão legislativa possui o intuito de beneficiar os
indivíduos primários e com bons antecedentes, evitando medidas mais severas,
sendo fundamental na conjuntura atual, tendo em vista que o tráfico de drogas é
a segunda maior causa de encarceramento no país, ficando apenas atrás dos
delitos patrimoniais, conforme os dados do INFOPEN.
Nesse sentido, entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
HABEAS CORPUS
SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO.
DESCABIMENTO. EXECUÇÃO PENAL. INDULTO.
DECRETO N. 8.615/15. TRÁFICO PRIVILEGIADO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. Em consonância com a orientação jurisprudencial da Primeira
Turma do Supremo Tribunal Federal – STF, esta Corte não admite habeas corpus
substitutivo de recurso próprio, como no
caso dos autos, ressalvando-se, porém, a possibilidade de concessão da ordem, de
ofício, se constatada a existência
de flagrante ilegalidade na liberdade de locomoção do paciente. 2. O acórdão impugnado está em dissonância com o
entendimento desta Corte que o menor
grau de reprovabilidade do crime de tráfico de drogas na forma
privilegiada permite a concessão do benefício do indulto a condenados por tal
infração penal. 3. Habeas corpus não
conhecido, mas concedida a ordem, de ofício, para determinar que o Juízo das
Execuções Criminais examine o pedido da paciente consoante disciplina o Decreto
Presidencial n. 8.615/15 e a jurisprudência desta Corte. (Processo HC 522037 /
SP HABEAS CORPUS 2019/0209350-3, Ministro: Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Órgão
julgador: 5ª Turma, Data de publicação: DJe 26/08/2019).
EXECUÇÃO PENAL. HABEAS
CORPUS. SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. MODALIDADE PRIVILEGIADA DO
DELITO. ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/06. ENTENDIMENTO DO COL. SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. AFASTAMENTO DA HEDIONDEZ.
INDULTO PLENO. DECRETO N. 8.615/2015. FLAGRANTE ILEGALIDADE NA CASSAÇÃO DO
BENEFÍCIO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. I – A
Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Supremo Tribunal Federal,
sedimentou orientação no sentido de não admitir habeas corpus substitutivo de
recurso adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos
excepcionais em que, configurada flagrante
ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a
concessão da ordem de ofício, em homenagem ao princípio da ampla defesa. II – O
STF, em decisão oriunda do Tribunal Pleno, no HC n. 118.533, afastou o caráter
hediondo dos delitos de tráfico ilícito de
entorpecentes em que houvesse a incidência da causa especial de
diminuição de pena prevista no § 4º, do art. 33, da Lei n. 11.343/06. III – A
Terceira Seção desta Corte Superior, ao julgar a Petição n. 11.796/DF, adotou o
posicionamento da excelsa Suprema Corte e firmou a tese segundo a qual “o tráfico ilícito de drogas
na sua forma privilegiada (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006) não é crime
equiparado a hediondo, com o consequente cancelamento do enunciado 512 da
Súmula deste Superior Tribunal de Justiça”. IV – No caso, está configurado o
constrangimento ilegal, uma vez que o eg. Tribunal a quo cassou o indulto
concedido ao paciente com base no
Decreto Presidencial n. 8.615/2015, não obstante tenha sido condenado
pelo delito de tráfico de entorpecentes na sua forma privilegiada. Habeas
corpus não conhecido. Ordem concedida de ofício para, confirmando a liminar,
afastar o caráter hediondo do tráfico privilegiado, para todos os fins, e
restabelecer a decisão do Juiz da Execução, concessiva de indulto.
(Processo: HC 477280 / SP HABEAS CORPUS
2018/0291692-0, Ministro: FELIX FISCHER, Órgão julgador: T5 – QUINTA TURMA, Data de publicação: DJe 26/02/2019).
Em decorrência do entendimento das Cortes Superiores, a
súmula 512 do Superior Tribunal de Justiça fora cancelada, afastando o caráter
hediondo nos delitos de tráficos de drogas em sua modalidade privilegiada.
O uso das drogas e políticas proibicionistas sempre geraram
grandes discussões políticas, econômicas, históricas e sociais. Nesse sentido
RAMOS (2018, p. 46) analisa esses aspectos enfatizando que:
A questão do uso de drogas passa a ser palco dos conflitos
políticos e econômicos, a partir dos anos oitenta, quando algumas passaram a
ser uma mercadoria lucrativa que movimentava o capital transnacional de forma
inesperada, o que gera repercussões econômicas, políticas e sociais em diversos
lugares.
Outro ponto de reflexão necessária é a violência relativa ao
tráfico de drogas no Brasil. Estima-se que 56,12% dos assassinatos possuem
ligação direta com o tráfico de drogas. Os mortos em maioria são jovens, negros
e sem poder aquisitivo, entre 15 a 25 anos de idade, conforme análise no
relatório do INFOPEN. No tocante à morte de mulheres decorrente do tráfico,
estima-se que cerca de 30% das vítimas possuíam relação com o tráfico de
entorpecentes, no seu uso ou venda.
Essa guerra às drogas possui resultados drásticos
perpetuados por inúmeros abusos e ilegalidades e gerando cada vez mais
violência. Nesse sentido ressalta VALOIS (2017, p. 424).
a guerra às drogas atinge as garantias do cidadão por vários
flancos, mas, na perspectiva do direito penal, principalmente por dois. Pois,
se a natureza garantista da norma penal depende do nível de racionalidade do
sistema, a violação das garantias não se limita à ampliação da norma
incriminadora, mas essa própria norma, tendo características de irracionalidade,
por si só enfraquecedora de todo conjunto de direitos fundamentais do cidadão.
Portanto, o entendimento das Cortes Superiores que afastam o
caráter hediondo no tráfico de drogas em sua modalidade privilegiada é
fundamental, tendo em vista o aumento exponencial do encarceramento de
indivíduos com pequenas quantidades, primários e de bons antecedentes.
REFERÊNCIAS
RAMOS, Luciana de Souza. Por amor ou pela dor? Um olhar
feminista sobre o encarceramento de mulheres por tráfico de drogas. Dissertação
de Mestrado, Faculdade de Direito, Mestrado em Direito, Estado e Constituição.
Disponível aqui. Acesso em 19 de julho de 2018.
VALOIS, Luís Carlos. O direito penal da guerra às drogas. 2ª
edição. Belo Horizonte, D’ plácido, 2017.
Fonte: Canal Ciências Criminais
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