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terça-feira, agosto 23

Seringas e ofendículos


Imagem do Site G1

Uma notícia publicada no site G1 me foi enviada pelo aluno Renê Johann Jr,  via twitter.

A matéria jornalística diz que o protesto de uma médica no condomínio RK, na cidade de Sobradinho, a 22 Km de Brasília, impressionou os vizinhos.

Cansada de ser vítima de furtos e/ou roubos, ela fixou ‘seringas’ na grade de casa, sobre o muro, e escreveu um cartaz dizendo: ‘Muro com sangue HIV positivo’ – não pule’.

Segundo a médica, ela já teve subtraído de sua residência cortador de grama, secador de cabelos, máquinas fotográficas e, da última vez, os ladrões levaram uma televisão tela plana.

A moradora foi notificada pelo condomínio, através do síndico, para retirar o material de cima do muro. Além disso, o presidente do Conselho Regional de Medicina também condenou a conduta da médica.

A notícia pode ser um exemplo, ainda que inusitado, de offendiculas? Boa questão para reflexão.

Os ofendículos ou offendiculas são utensílios ou dispositivos utilizados para impedir ou dificultar ofensas a bem jurídico tutelado pelo direito penal, mais frequentemente o patrimônio ou o domicílio.

Tais dispositivos. para serem assim considerados, devem ser percebidos pelos potenciais agressores, podendo servir como exemplos os vidros colocados sobre muros, as pontas de lanças, grades, fossos, cercas eletrificadas visíveis, cães etc. que se constituem obstáculos naturais, normais, colocados por quem deseja se proteger de eventuais ações agressivas.

As offendiculas  não se confudem com as chamadas defesas predispostas, conhecidas como ‘engenhocas’ ocultas, preparadas de modo a não serem percebidas pelos  agressores (sempre lembro do filme “A mão que balança o berço” *), consubstanciadas em armas automáticas, armadilhas, eletrificações escondidas, aptas a serem acionadas no momento da agressão.

Pois os ofendículos são reconhecidos como causa de exclusão da ilicitude: para uns, como exercício regular de um direito e, para outros, como forma de defesa legítima.

A opção pelo uso de offendiculas é, sem dúvida, exercício regular de um direito. Quando uma pessoa instala em sua propriedade um artefato que pretende dificultar a ação de agressores, está exercendo o direito de autoproteção.  E, quando o dispositivo se mostra eficaz como barreira, reação a uma agressão, então, há defesa legítima, ainda que preordenada.

O uso dos ofendículos exige cuidado extremado, porque a potencialidade lesiva de certos dispositivos será aceita como defesa, quando o agressor for o atingido, e desde que haja moderação. Não obstante, se o atingido for um inocente, haverá repulsa e censura.

Na utilização das offendiculas se deve privilegiar, sempre, a moderação, eis que situada dentro do instituto da legítima defesa, há exigência quanto à observância de todos os seus requisitos, subjetivo e objetivos, quais sejam, animus defendendi, injusta agressão, atual ou iminente, direito próprio ou alheio, e uso moderado dos meios, que deverão ser eficazes, disponíveis e menos lesivos.

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(*) No filme, arma-se uma engenhoca, com um pedaço grande de vidro, dentro de uma estufa de flores, com o propósito de atingir a pessoa que abrisse a porta e ingressasse no ambiente.

3 comentários:

Renê disse...

Diante de uma criminalidade cada vez mais criativa; cachorro, alarme e cerca elétrica já estão bem ultrapassados.
Achei muito curiosa a reportagem, por isso indiquei.
Os "freios" impostos por uma reflexão jurídica me impedem - com relutância - de concordar, mas compreendo a revolta da médica.

Abraços,
Renê B. Johann Jr./Direito UFPel

Ana Cláudia Lucas disse...

Valeu Renê! Abraço

raquel moreira disse...

Um "absurdo" imagina se a moda pega...
Além demostrar desconhecimento de infectologia, pois em poucos minutos o vírus do HIV morre fora do organismo, ela poderá incentivar um cirurgião a roubar bisturis para colocar no muro de sua casa,um proctologista vai colocar aparelhos de visualisação intestinal em seus muros,um radio onco vai fazer radioterapia super potente para garantir o limite de sua propriedade.De repente podemos entender por esta atitude o afastamento dela do trabalho.A questão da criminalidade poderia ser abordada de outra forma senão um operador do direito colocaria no muro de sua casa CP e CPP e estaria protegendo sua propriedade.E um atirador de elite o que faria? Raquel Moreira Dto.Ucpel