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terça-feira, setembro 20

Ministério Público: Princípio da Unidade versus Princípio da Autonomia Funcional

Carolina Cunha
Para o Blog

A Constituição Federal em seu artigo 127, parágrafo 1º, dispõe que são princípios institucionais do Ministério Público (MP) a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional.

Pelos princípios da indivisibilidade e da unidade todos os Promotores e Procuradores de Justiça são órgãos de um mesmo organismo, de uma instituição, que é o Ministério Público. Assim, esses membros podem se substituir, uns aos outros, sem que haja qualquer prejuízo, eis que, de qualquer forma, a parte atuante no feito será o Ministério Público.

Já o princípio da autonomia funcional prevê que os membros do MP não são subordinados intelectual e ideologicamente,  uns aos outros, tampouco a estranhos à Instituição e, por isso mesmo, gozam de autonomia para agir de acordo com seu entendimento pessoal e sua consciência individual nos termos da lei. 

Regra geral, os princípios supra-referidos coexistem de forma pacífica. No entanto, no curso do processo penal pode haver situação na qual eles passam a conflitar.

Exemplo disso é a situação hipotética que, em 2006, a Seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, ofertou para a elaboração de peça prático-profissional

O caso:

O Promotor de Justiça, quando da apresentação de alegações finais, em ação penal pública incondicionada, conclui pela inocência do réu, e postula a sua absolvição. O Magistrado, ao analisar os autos, profere sentença absolutória, acolhendo o pleito ministerial. Na ocasião da intimação da sentença, em virtude de férias do subscritor das alegações finais, outro membro do Ministério Público entende diferentemente do seu colega e do Juiz, considerando que a sentença deve ser reformada. Assim, interpõe recurso, alegando ter independência funcional consagrada na Carta Magna, afirmando que, por ser ação penal pública incondicionada, o Promotor que o antecedeu, jamais poderia ter pleiteado a absolvição, mas tão-somente a condenação. [...] [Cespe-OAB/SP 2006]

Na oportunidade, exigia-se que os examinandos elaborassem contra-razões de apelação arguindo a falta de interesse de agir, pois, em razão do princípio da Unidade do MP, faltaria, ao Parquet, a sucumbência, eis que, o Minsitério Público, pugnou pela absolvição do réu.

Não se reconhece, neste momento, qual o entendimento que prevaleceu para solução do caso ofertado pela OAB/SP.  No entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já se manifestou sobre esse tema, em julgamento de Habeas Corpus.
           
Assim, em  09 de junho de 2009, no julgamento do Habeas Corpus 2004/0166636-7, 09, a Sexta Turma do STJ assim pronunciou: Alegações finais do Ministério Público (pedido de absolvição/desclassificação). Sentença acolhimento). Recurso ministerial(apelação). Interesse de agir (ausência).
1. Não há como confundir a independência funcional do Ministério Público com o interesse de agir em determinados momentos processuais.
2. Havendo sido pleiteada pelo Ministério Público a absolvição de um dos acusados e a desclassificação do crime imputado na denúncia ao outro, teses acolhidas pelo juiz, não poderá outro promotor, em recurso de apelação, pugnar pelo agravamento da situação dos réus.
Faltar-lhe-ia, como de fato faltou, interesse de agir.
3. Habeas corpus concedido para se restabelecer a sentença. [grifamos]

Por outro lado, a Quinta Turma, do mesmo Tribunal, em 1º de setembro de 2009, ao julgar o Habeas Corpus 2007/0254324-3, assim entendeu: Processual Penal. Habeas Corpus. Tentativa de Homicídio Qualificado e Ameaça. Pedido de anulação da decisão de pronúncia. Falta de interesse de recorrer do Ministério Público. Princípios da Unidade e Indivisibilidade. Não ocorrência de vinculação de pronunciamento de seus  membros.Ordem Denegada. 1. "O princípio da unidade e da indivisibilidade do Ministério Público não implica vinculação de pronunciamentos de seus agentes no processo, de modo a obrigar que um promotor que substitui outro observe obrigatoriamente a linha de pensamento de seu antecessor". (RHC 8.025/PR, Rel. Ministro Vicente Leal,  DJ 18/12/98).
2. A circunstância de haver o Promotor de Justiça, com atuação no processo, pedido, na fase de alegações finais, a impronúncia do paciente, não impede que um outro membro do Ministério Público interponha recurso em sentido estrito impugnando a decisão, a fim de preservar a denúncia.
3. Ordem denegada. [grifamos]

Nota-se, portanto, que o tema é controvertido. De um lado há os que defendem, em razão da Unidade, inexistir interesse de agir nos casos em que o Juiz acolhe a pretensão de um membro do Ministério Público e, de outro, os que advogam a independência funcional com prevalecente, especialmente quando o interesse manifestado por outro integrante do Ministério Público seja para fazer valer a intenção primeira do processo, isto é, a ratificação da denúncia.

Por causar insegurança jurídica e se tratar de divergência quanto à interpretação do texto Constitucional, é possível que, em breve, o tema venha a ser objeto de apreciação pelo Supremo Tribunal Federal. 

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