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sábado, janeiro 21

BBB: caso oferece pontos para debate


Temos recebido de vários  leitores do Blog perguntas sobre as possíveis teses defensivas a serem utilizadas no ‘Caso do BBB’.

É importante dizer que as ideias lançadas como teses defensivas neste artigo são suposições, até porque não há qualquer acusação formal contra o ‘brother’ Daniel. Se quer houve conclusão de Inquérito Policial, portanto nãohá indiciamento, menos ainda denúncia.

Carolina Cunha
Colaboradora do Blog
Nossa pretensão aqui neste espaço do Blog é discutir Direito Penal, aproveitando-nos da situação evidenciada neste evento do BBB 12.

A primeira questão que nos indagaram alguns leitores é quanto à possibilidade de a defesa de Daniel utilizar em seu benefício a sua própria embriaguez, como elemento justificador para seus atos.

A segunda situação é sobre a probabilidade de ser alegada – acaso comprovada a letargia de Monique –  a circunstância de que Daniel não foi o responsável pela ingestão de bebida alcoólica por parte da ‘sister’ e, assim, não é ‘culpado’ pela vulnerabilidade dela. Ou seja, não foi ele a colocá-la em situação de vulnerabilidade.

O terceiro ponto é saber por que as investigações continuam, se Monique consentiu na prática de todos os atos sexuais praticados por ambos.

E, por fim, se a ação penal no crime de estupro de vulnerável é pública incondicionada também nessa situação em que a vulnerabilidade é passageira, resultante da ingestão de bebida alcoólica por iniciativa da própria vítima.

Para todas essas circunstâncias  pode-se dar as seguintes respostas:

Quanto a possível embriaguez de Daniel, o artigo 28 do Código Penal Brasileiro (CPB), em seu inciso II, dispõe, expressamente, que a embriaguez, voluntária (quando o sujeito se embriaga por vontade própria) ou culposa (por excesso imprudente), pelo álcool ou substância de efeitos análogos, não exclui a culpabilidade.

A doutrina explica essa situação - em que o sujeito, por ato voluntário ou descuidado, se coloca em situação de “incapaz para agir” - através da teoria da acto libera in causa e, para ilustrar essa teoria André Estefam cita exatamente esse exemplo: [...] se o agente propositadamente - acrescentemos, ou por imprudência - se embriaga visando perder a inibição para importunar ofensivamente o pudor de uma mulher, o estado inebriante verificado, ainda que possa comprometer a capacidade de discernimento do sujeito, será irrelevante para efeito de sua responsabilização penal; isto é, a ele se imputará a infração sexual correspondente ao ato praticado. (Direito Penal, vol. 1 - Parte Geral, pg. 268. São Paulo: Saraiva, 2010)

Observe-se, também, que no artigo 61 do CPB, que trata as circunstâncias que sempre agravam a pena, consta, na alínea  “l”, a embriaguez preordenada.

Todavia, para que incida como agravante, a embriaguez precisa ser voluntária e deve ter por escopo  “encorajar-se” à pratica do crime.

 Vê-se, portanto, que alegar o estado de embriaguez não é boa tese defensiva a ser adotada

Para a segunda situação - quanto ao agente não ter colocado a vítima no estado de vulnerabilidade -  não é necessário que o agente tenha colaborado, de qualquer modo, para a vulnerabilidade da vítima, pois basta que ele tenha ser aproveitado dela (situação) para o seu agir. Antes mesmo do advento da Lei 12.015/09, os Tribunais manifestavam esse entendimento quando referiam ao estupro presumido ou ficto.

Parece ajustado o entendimento, pois as demais causas de vulnerabilidade, quais sejam, menoridade e doença mental, também são circunstâncias pessoais tanto quanto à embriaguez e, nelas, não se exige qualquer participação do agente para que se possa responsabilizá-lo por estupro de vulnerável.

Por outro lado, se for realizada prova no sentido de que tenha sido Daniel o responsável pela embriaguez de Monique para, com isso, tornar ‘fácil’ a prática de atos libidinosos, poderá alegar-se tenha havido o delito de violação sexual mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima, introduzido no Código Penal Brasileiro pela Lei 12015/09, no artigo 215.

Assim, se o sujeito ministra bebida alcoólica à vítima com a intenção de fazer com que ela não possa resistir às suas investidas sexuais, ele poderá ser responsabilizado por violação sexual mediante fraude, mas não por estupro de vulnerável.

Atente-se, também para o fato de que a pena para o comportamento previsto no artigo 215, do CPB, é de 2 a 6 anos de reclusão e, portanto, bastante inferior à do estupro de vulnerável, que é de 8 a 15 anos de reclusão. Além disso, a violação sexual mediante fraude, diferentemente do estupro de vulnerável, não está no rol de crimes hediondos.

Por fim, o fato de a polícia ter dado pouca importância – na percepção de alguns – ao depoimento da suposta vítima, negando o possível estupro, e ter mantido as investigações pode ser justificado em razão da natureza da ação penal que, como já se disse, é pública incondicionada, por força do artigo 225, parágrafo único, por se tratar, a vítima, de pessoa vulnerável (ou em estado de vulnerabilidade).

Na ação penal  pública incondicionada o titular é o Ministério Público, detentor exclusivo dela. Assim, ainda que a vítima não tenha interesse na apuração da responsabilidade do suposto autor do fato, ou afirme que ele não ocorreu, ainda assim, confere-se ao órgão acusador a titularidade da ação, especialmente porque nesses crimes o bem juridicamente tutelado é a dignidade sexual, e o Estado o entende como indisponível tal como a vida, por exemplo.

De tal modo, ante a indisponibilidade do bem, ainda que a pessoa abusada seja considerada  vítima imediata, o Estado também é vítima mediata, ou indireta, e, justamente por isso, tem interesse em apurar as circunstâncias e exercer o seu direito de punir.

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