A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu:
mesmo antes da alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a
divulgação de fotos de crianças e adolescentes seminuas ou em poses sensuais,
ainda que sem apresentar cenas de sexo explícito, a depender do contexto em que
estão inseridas, pode ser considerada crime.
Até 2003, o artigo 241 do ECA estipulava ser crime
fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo
criança ou adolescente, prevendo uma pena de um a quatro anos de reclusão. Em
novembro de 2003, o artigo passou a ter nova redação, com descrição mais
extensiva. Para o relator do habeas corpus julgado na Turma, ministro Sebastião
Reis Júnior, mesmo antes da alteração, a previsão do dispositivo legal não se
limitava à criminalização da conduta de publicar fotos de crianças e
adolescentes totalmente despidas.
“Cabe ao intérprete da lei, buscando a melhor aplicação da
norma ali contida, diante do caso concreto, analisar se a conduta praticada se
amolda à prevista no dispositivo em questão, de modo que nada impede que se
analise, além das fotos, isoladamente, o contexto em que elas estão inseridas
(publicadas)”, afirmou o relator.
Site próprio
O entendimento, seguido à unanimidade pelos demais ministros
da Sexta Turma, manteve a condenação do advogado norte-americano Lawrence Allen
Stanley. Ele é acusado de divulgar fotos de crianças e adolescentes em poses
sensuais em site da internet de sua propriedade. A decisão foi tomada em habeas
corpus impetrado contra julgado do Tribunal Regional Federal da 1ª Região
(TRF1).
O réu foi condenado pelo juízo federal da 2ª Vara da Seção
Judiciária da Bahia a dois anos e oito meses de reclusão em regime inicial
semiaberto, com base no artigo 241 da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do
Adolescente). Houve recurso ao TRF1, que confirmou o julgado do juiz federal. O
tribunal regional entendeu que teria ficado caracterizado o crime do artigo 241
– fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo
criança ou adolescente. Os fatos pelos quais o advogado foi condenado ocorreram
em 2002, antes da mudança na lei.
O TRF1 considerou que o simples fato de a criança ser
fotografada em circunstância erótica seria o bastante para consumar o delito.
Quanto ao ato de publicar, é necessário que pelo menos uma pessoa veja a foto,
por qualquer meio disponível, incluindo a internet. Também afirmou que aquele
que publica as fotos pode não ser o mesmo que as fotografou.
Contexto pedófilo
Diante disso, o réu impetrou o habeas corpus no STJ,
afirmando haver constrangimento ilegal. Alegou que a conduta foi atípica, pois
o fato ocorreu antes da nova redação do artigo 241 do ECA dada pela Lei
10.746/2003. Logo, para configurar o crime seria necessário que as imagens
contivessem sexo explícito ou pornografia, o que não teria ocorrido no caso. A
defesa argumentou que, ao considerar haver um “contexto pedófilo” para
configurar o crime, o TRF1 ampliou o tipo penal e ofendeu a legalidade estrita.
Para a defesa, a pena foi fixada além do mínimo legal sem
fundamentação suficiente. Além disso, o regime inicial semiaberto teria sido
fixado de forma ilegal, já que deveria seguir os princípios do artigo 33,
parágrafo 2º, do Código Penal (CP) e não a gravidade abstrata do crime. Pediu a
absolvição do réu ou, alternativamente, a fixação da pena-base no mínimo legal.
Proteção
Na visão do ministro Sebastião Reis Júnior, não haveria
impedimento para analisar, além das fotos individualmente, o contexto no qual
estas estão inseridas. O magistrado destacou que a condenação está
consubstanciada em amplo contexto fático-probatório, consistente em laudos
técnicos, indicando o teor pornográfico dos sites em que as fotos foram
publicadas.
“Alcançar conclusão diversa, no sentido de que a conduta
imputada ao paciente não se amolda ao artigo 241 do ECA antes da redação da Lei
10.746/2003, importaria no reexame fático-probatório, providência inviável na
via do habeas corpus”, asseverou o relator. Não há no ordenamento jurídico
brasileiro, observou o ministro Sebastião Reis Júnior, norma que esclareça o
conceito de pornografia infantil ou infanto-juvenil, portanto a previsão do
artigo 241 do ECA não se limita à criminalização da publicação de fotos de
menores totalmente despidos.
Na interpretação da melhor aplicação da lei, explicou o
relator, o magistrado deve “se valer dos meios de interpretação colocados à sua
disposição para adequar condutas, preencher conceitos abertos e, por fim,
buscar a melhor aplicação da norma de acordo com sua finalidade, que é a
proteção da criança e do adolescente em situação peculiar de pessoas em
desenvolvimento”.
O ministro destacou que o artigo 6º do ECA traz
expressamente essa previsão, ao ordenar que a interpretação do estatuto deve
levar em conta seus fins sociais. Quanto à questão da pena-base, o relator
apontou que o TRF1 não tratou satisfatoriamente do tema e que, se o STJ
julgasse a questão, isso implicaria supressão de instância.
Fonte: Site do STJ
Nenhum comentário:
Postar um comentário