Boca de fumo na favela Mandela põe aviso de que vai proibir a venda de crack: é como uma farmácia anunciando que não vai vender mais remédios de tarja preta |
O tráfico de drogas vai proibir a venda de crack nas favelas
do Jacarezinho, Mandela e de Manguinhos.
A informação foi publicada na coluna
de Ancelmo Gois de hoje com a foto acima. A medida, decidida pela maior facção
do tráfico no Rio, ocorre dois meses depois de lançado no Rio o programa
"Crack, é possível vencer" -- do governo federal.
A ordem de proibir a venda de crack partiu de chefes do
tráfico, que estão presos. A informação vinha circulando pelas comunidades, mas
ontem pela primeira vez apareceu o cartaz anunciando a proibição, "em
breve", ao lado da cracolândia da favela Mandela, na Rua Leopoldo Bulhões,
na chamada Faixa de Gaza. Os traficantes ainda têm ali cerca de dez quilos de
crack. Cada pedra custa R$ 10,00. Há informações de que os criminosos temem que
a Força Nacional de Segurança ocupe aquelas favelas, como ocorreu na comunidade
Santo Amaro, no Catete, onde está há um mês e já apreendeu 1.513 pedras.
-- Gostaria que essa decisão se espalhasse por todas as
favelas do Rio porque o crack é uma droga devastadora e tem produzido só dor e
sofrimento -- diz o líder do Rio de Paz,
Antônio Carlos Costa, que desde 2009 faz trabalhos sociais na Mandela.
Durante muito tempo o crack era vendido apenas em São Paulo.
Dizia a lenda que os traficantes do Rio não queriam produzir
"zumbis". Dependentes de crack vivem nas imediações das bocas de
fumo, atraindo a atenção da mídia e de operações do poder público. O tráfico no
Rio alegava que a clientela de crack -- miserável -- traria problemas à venda
de maconha e cocaína, mas capitulou após supostas alianças com a facção
paulista, e começaram a oferecer o entorpecente vendido junto com a cocaína.
O combate ao crack virou uma questão de honra para o governo
Dilma, que anunciou investimentos da ordem de R$ 4 bilhões no programa lançado
em dezembro do ano passado. A grande dificuldade, segundo o ministro da
Justiça, Eduardo Cardozo, é a falta de pessoal capacitado para lidar com os
dependentes de crack em todo o país. No Rio o programa foi implantado em abril,
com a participação do governo do estado e da prefeitura. Só no Estado do Rio, a
previsão de verbas da União é de R$ 240 milhões.
De alguma forma a prioridade dada pelo governo ao combate ao
crack chegou ao conhecimento dos chefes da maior facção criminosa, que vende a
droga nas favelas. Um sinal de que o governo federal vai combater com firmeza o
problema pode estar no envio da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) ao
Rio, apesar do desinteresse inicial manifestado pelo governo do estado. No
domingo fez um mês que integrantes da Força Nacional de Segurança -- a tropa de
elite subordinada ao Ministério da Justiça -- ocuparam a comunidade de Santo
Amaro, que ainda não foi pacificada, na Zona Sul do Rio. Em um mês de ocupação,
a Força Nacional realizou na favela 6.929 abordagens e apreendeu 650 papelotes
de cocaína, 1513 pedras de crack, 840 gramas de maconha. Além disso, foram
recolhidas munições, explosivos e armas.
Durante 180 dias, serão realizadas ações de polícia
ostensiva, judiciária, bombeiros e perícia, em apoio às Secretarias de Saúde,
Assistência Social e de Segurança do Estado do Rio de Janeiro, nas áreas onde
serão desenvolvidas as ações de implantação do Programa Crack, é Possível
Vencer.
Nas favelas de Manguinhos, traficantes foram informados que
a área poderia ser ocupada pela Força Nacional se o crack não fosse retirado de
lá. Isso pode ter motivado a decisão dos traficantes. A decisão agradou muitos
moradores da favela Mandela. Eles são testemunhas diárias do estrago causado
pelo crack na comunidade. No Jacarezinho é possível ver usuários de crack na
entrada da favela, mesmo por quem passa no asfalto. As operações policiais têm
sido recorrentes, mas o problema está longe de ser resolvido.
Há três anos fazendo trabalhos sociais na favela Mandela, o
líder do Rio de Paz, Antônio Carlos Costa, afirma que tem visto a tragédia
causada pelo crack na comunidade. Ele lembra que já teve que solicitar ajuda da
Justiça para levar a um abrigo três crianças que eram abandonadas pelos pais,
usuários de crack. A ONG Rio de Paz -- que nasceu envolvida cm a redução de
homicídios -- tem um projeto social, que prevê a construção de uma
padaria-escola e o apadrinhamento de crianças por famílias de classe média --
até a universidade.
Assista ao vídeo em que Antônio Carlos entrevista dona
Veruska, uma usuária de crack. Ela confessa que é "uma droga
maldita":
- Eu fumo para deitar e acordo para fumar - diz a moradora
da favela Mandela.
Fonte: O Globo
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