O ministro Ricardo Lewandowski, revisor do processo do
mensalão no Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quinta-feira (23) pela
absolvição de João Paulo Cunha dos crimes de corrupção passiva (receber
vantagem indevida), peculato (apropriar-se de bem público) e lavagem de
dinheiro.
Lewandowski divergiu do voto do relator do processo,
ministro Joaquim Barbosa, que condenou, em seu voto, João Paulo Cunha pelos
três crimes.
Para Lewandowski, não há provas de que Cunha tenha usado a
condição de presidente da Câmara dos Deputados para beneficiar a agência
SMP&B, de Marcos Valério.
João Paulo Cunha presidiu a Câmara entre 2003 e 2005 – o
escândalo do mensalão foi revelado em 2005. Atualmente, ele exerce o quinto
mandato consecutivo de deputado federal pelo PT.
"A verdade processual, que surge dos autos, é que João
Paulo Cunha recebeu numerário para custear pesquisas eleitorais de interesse de
seu partido. Diante dessas provas robustas produzidas, não restou comprovada a
prática de nenhum ato de João Paulo Cunha para dar tratamento privilegiado à
SPMP&B. [...] Não ficou caracterizada, portanto, a prática do crime de
corrupção passiva", disse Lewandowski.
O revisor afirmou ainda que, em sua avaliação, não houve
desvio de dinheiro público.
“Parece-me insuperável a categórica afirmação dos peritos da
Polícia Federal no sentido de que os serviços contratados foram prestados e que
não foram indicados indícios de terceirização fictícios [...] Não há de se
falar em desvio de dinheiro público nem crime de peculato”, disse Lewandowski.
João Paulo Cunha (PT-SP) foi acusado pela Procuradoria Geral
da República de cometer os crimes de corrupção passiva, peculato e lavagem de
dinheiro.
Segundo o Ministério Público, João Paulo Cunha recebeu, em
2003, quando presidia a Câmara, R$ 50 mil da agência SMP&B para favorecer a
empresa de Marcos Valério em um contrato de publicidade com a Casa.
Conforme a denúncia, Cunha teria cometido um segundo
peculato ao desviar R$ 252 mil do contrato para pagar um assessor particular. A
denúncia diz que os desvios na Câmara somaram R$ 1,077 milhão, uma vez que a
agência de Valério recebia sem executar os serviços.
Na sustentação oral no púlpito do Supremo na semana passada,
o advogado Alberto Toron, que defende o deputado, afirmou que não houve desvios
e que seu cliente recebeu o dinheiro do ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares para
o pagamento de pesquisa eleitoral. Sobre os R$ 252 mil, Toron disse que o
assessor prestava serviços à Câmara e não pessoalmente para o então presidente
da instituição.
Na quarta, Lewandowski votou pela condenação de quatro
pessoas por desvios no Banco do Brasil. Nesta quinta, o ministro inocentou, em
seu voto, Marcos Valério e os sócios Cristiano Paz e Ramon Hollerbach.
Com a conclusão do voto do revisor sobre o item 3 da
denúncia, sobre desvios de recursos públicos, os demais ministros votarão sobre
o tema na próxima semana.
Corrupção passiva
Para o ministro-revisor, não há "uma prova sequer e nem
um mero indício" de que João Paulo Cunha tenha beneficiado Marcos Valério.
“O Ministério Público não colheu uma prova sequer, nem um
mero indício, de que João Paulo Cunha tenha [...] dado tratamento privilegiado
à SMP&B. Todas as provas colhidas evidenciam total autonomia dos membros da
comissão [de licitação] e rigidez do procedimento licitatório”, disse o
revisor, sobre o contrato entre a Câmara e a agência de Valério.
O ministro-revisor argumentou também que “o Ministério
Público não apontou o ato de ofício (ato realizado no exercício da função)
contrário à lei que teria sido cometido por João Paulo Cunha".
"Apenas lançou a tese abstrata de que João Paulo Cunha
teria dado tratamento privilegiado à SMP&B", completou Lewandowski.
Lewandowski afirmou que o pedido para instaurar a licitação
que culminou com a contratação da SMP&B foi não foi feito por João Paulo
Cunha, mas sim pelo então secretário de comunicação da Câmara.
“A lei exige que a comissão especial de licitação seja
composta por servidores qualificados. O presidente da Câmara escolheu
funcionários estáveis do quadro permanente da Câmara para compor a comissão.
Foi um ato de ofício, mas um ato de atendimento à lei. O presidente da Câmara
cumpriu o seu indeclinável deve de formar a comissão. Não se tratou de
tratamento privilegiado, mas de estrito cumprimento a sua tarefa legislativa”,
completou.
Para Ricardo Lewandowski, ficou provado nos autos que os R$
50 mil recebidos por João Paulo Cunha foram utilizados em pesquisas eleitorais
na região de Osasco. Ele afirmou ainda que as provas demonstram que os recursos
foram repassados pelo PT, por meio do ex-tesoureiro do partido, Delúbio Soares.
“Verifica-se que esse R$ 50 mil nada tinham a ver com a
licitação. Tinham uma correspondência clara com pesquisa eleitoral na região de
Osasco. Não há liame entre a vantagem indevida e o ato de ofício que
pretensamente teria sido realizado”, disse Lewandowski.
Peculato
O revisor destacou ainda que Cunha não pode ser condenado
por peculato porque, embora seja certo que João Paulo Cunha tivesse o poder de
autorizar as subcontratações, "como de fato autorizou", disse
Lewandowski, não se pode afirmar que ele detinha a posse dos recursos.
"João Paulo Cunha não era o executor dos contratos,
tarefa esta que estava vinculada ao diretor-geral da Câmara dos Deputados,
Sérgio Sampaio", disse. Sampaio é atualmente secretário-geral da Casa.
Na avaliação do ministro, João Paulo Cunha também não pode
ser condenado por peculato no caso da contratação do assessor. A denúncia
aponta que dinheiro desviado do contrato com Marcos Valério foi usado para a
contratação.
Segundo o revisor, a provas de que o jornalista trabalhou
para a Câmara é "farta e robusta" e, portanto, não se pode falar que
Cunha obteve vantagem pessoal.
"Fiquei impressionado com o volume das evidências que
apontam para o fato de que a empresa IFT prestou os serviços à Câmara dos
Deputados. [...] A meu juizo, robustas provas nos autos não deixam dúvidas de
que os serviços foram prestados à Câmara."
Voto 'equivocado'
Lewandowski afirmou ainda estar "equivocado" o
voto do ministro Joaquim Barbosa pela condenação do réu por peculato com base
na premissa de que quase a totalidade do serviço para a qual a SMP&B fora
contratada foi executada por meio de subcontratações.
“Verifico agora que a premissa do voto, qual seja a de que
ocorreu a contratação quase total do objeto licitado, estava, [data] vênia,
equivocado. A afirmação de que quase a totalidade dos serviços foi
subcontratada não corresponde à realidade”, disse.
De acordo com o ministro, o Tribunal de Contas da União
verificou que 88% do serviço foi subcontratado, o que seria, para o órgão de
fiscalização, um percentual "normal".
Ao votar pela condenação de João Paulo Cunha, Joaquim
Barbosa citou laudo do TCU segundo o qual 99,9% dos serviços foram executados
após subcontratações. De acordo com Lewandowski, esse laudo do órgão de
fiscalização foi revisto, substituindo-o pelo que atesta índice de 88%.
Fonte: Site G1
Nenhum comentário:
Postar um comentário