A controvérsia começou, no plano doutrinário, na década de
1980 e entrou na agenda política na década seguinte, quando o Governo Fernando
Henrique estimulou os Estados a terceirizar a gestão de estabelecimentos
penais. Segundo os dirigentes do Ministério da Justiça da época, a
terceirização desburocratizaria os presídios e possibilitaria uma significativa
economia de recursos, num período em que nem a União nem os Estados dispunham
de recursos suficientes para investir no setor.
Nesse sistema, os serviços básicos - como segurança - são de
responsabilidade de empresas privadas. Nos EUA, a iniciativa privada assume
total responsabilidade pela direção e gestão administrativa, financeira e
disciplinar de algumas prisões. Na França, Bélgica e Holanda, empresas privadas
e poder público compartilham essas funções.
No Brasil, Paraná e Pernambuco foram os primeiros Estados a
adotar esse modelo, há mais de dez anos. Com o tempo, alguns Estados entregaram
a gestão de algumas penitenciá rias às Associações de Proteção e Assistência
aos Condenados - ONGs especializadas na gestão de unidades com 60 presos de
menor periculosidade e sem ligações com organizações criminosas. Essas unidades
são geridas por voluntários oriundos das mesmas cidades dos condenados, o que
ajuda na sua reeducação e ressocialização.
O problema desse modelo é sua escala, pequena demais face à
magnitude dos problemas do sistema penitenciário, que tem um déficit de 194 mil
vagas, segundo o Ministério da Justiça. Em 1994, o País dispunha de 511
presídios. Em 2009, eram 1.806. Apesar do número de presídios, cadeiões e
penitenciárias ter triplicado, entre 2000 e 2009, o sistema penitenciário
recebeu, em média, 65% mais presos do que as vagas disponíveis. Em 2010, as
penitenciárias tinham 303.850 vagas, mas a população carcerária era de 498.500
presos. Por causa do déficit de vagas, 57.195 presos aguardavam julgamento em
carceragens policiais.
Construída por um consórcio de cinco empresas, a primeira
unidade do complexo penitenciário com gestão privatizada na região
metropolitana de Belo Horizonte foi planejada para acolher 608 presos. A
alimentação, a saúde e a educação deles ficarão por conta de um consórcio, que
vai receber mensalmente do governo mineiro R$ 2,8 mil por preso, durante os
próximos 27 anos. Ao justificar esse valor, as autoridades mineiras afirmam que
o investimento foi alto, pois a unidade conta com duas torres de monitoramento,
300 câmeras de segurança e dispositivos para abertura e fechamento de portões e
funcionamento de energia elétrica - além de oficinas de trabalho, colchões
antichama, lâmpadas de baixa voltagem e paredes sem tomadas elétricas.
Esse modelo de gestão penitenciária, contudo, sempre foi
criticado pelo Ministério Público , por juízes criminais e por especialistas em
segurança pública. Eles alegam que a experiência não deu certo nos Estados
Unidos, Japão, Itália, França e Inglaterra - entre outros motivos porque não
reduziu o déficit de vagas do sistema prisional e não criou condições para a
reeducação e ressocialização dos presos, submetendo-os a um tratamento
desumano.
Também apontam a incompatibilidade entre o regime de
confinamento dos presos nas penitenciárias terceirizadas e os direitos a eles
concedidos pela Lei de Execução Penal.
Nessa polêmica, os defensores do modelo afirmam que a
terceirização dos presídios torna a gestão das penitenciárias mais racional,
uma vez que as empresas entram numa competição para ver qual delas é a mais
eficiente e lucrativa. Já os críticos lembram que, no Estado de Direito, a
responsabilidade pela gestão prisional é função pública exclusiva do poder
público, por envolver privação de liberdade, não podendo ser delegada a
terceiros. No que têm toda a razão.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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