A propósito do tema da aula de ontem - Direito Penal V - UCPel - mas sendo do interesse de muitos dos meus alunos, segue Acórdão que me envia o aluno Paulo Ribeiro. Omiti o nome dos envolvidos - autor e vítima - por se tratar de crime que, hoje, tramita em segredo de justiça.
EI Nº. 70.053.145.926
G/M 331 – S 05.04.2013 – P 40
EMBARGOS INFRINGENTES.
ASSÉDIO SEXUAL MAJORADO.
1. No caso
sob exame, nos lindes da 1ª fase do dimensionamento da pena carcerária do réu
(art. 59, caput, do C.P.B.), as consequências negativas mencionadas pela vítima
e pela psicóloga que a analisou não advieram dos dois ou três atos intrínsecos
de assédio praticados pelo réu - de levíssima intensidade, diga-se de passagem,
levados a cabo, modo explícito, na frente de dois alunos, e animicamente
matriciados em dolo eventualíssimo -, mas, sim, das controvérsias e críticas
que a ofendida recebeu da sua comunidade, inclusive escolar. Nesse contexto é
que o trauma psicológico apresentado pela vítima deve ser valorado, em si mesmo
não desbordando dos efeitos negativos normais decorrentes das elementares do
tipo penal incriminador em tela.
Nessa moldura, portanto, também positivadas em favor do réu
todas as demais operativas judiciais, não há razão plausível para que a
pena-base do réu afaste-se do mínimo legal aplicável à espécie (um ano de
detenção).
Por outro lado, na 3ª etapa do método trifásico, em razão da
majorante prevista no § 2º do art. 216-A do C.P.B. (crime cometido contra menor
de 18 anos), a baixa lesividade dos atos de assédio praticados e a idade da
vítima (14 anos) não autorizam que a majorante em tela seja dosimetrada em
fração superior ao mínimo legal aplicável à espécie (1/6), inclusive porque há
corrente doutrinária ponderável no sentido de que, entre professor e aluno, a
superioridade hierárquica ou a ascendência não são inerentes ao exercício do
emprego, cargo ou função docente (Nucci, "Código Penal Comentado",
Ed. RT, 11ª edição, revista, atualizada e ampliada, 2012, pp. 963/964).
Em consequência dessas valorações dosimétricas, impende
reduzir a pena carcerária definitiva do réu-embargante para um ano e dois meses
de detenção, nos termos do voto minoritário no julgamento da apelação
defensiva.
2. Por fim,
impende desconstituir a sanção adjeta de perda do cargo público de professor,
imposta ao réu-embargante com fulcro no art. 92, inc. I, letra "a",
do C.P.B., porque o crime de assédio sexual não envolve a prática de abuso de
poder e/ou violação de dever para com a Administração Pública, também não
estando elencado entre os crimes contra a administração pública.
RECURSO PROVIDO.
Embargos Infringentes
Nº 70.053.145.926
R.F.S.
..EMBARGANTE
M.P.
..EMBARGADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes do Terceiro Grupo
Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em dar provimento ao
recurso de embargos infringentes, para reduzir a pena carcerária definitiva do
réu-embargante RONI F. DOS S.
para um ano e dois meses de detenção, e, de outra parte, desconstituir a sanção
adjeta que lhe declarou a perda do cargo público de professor, mantendo as
demais disposições da sentença condenatória recorrida, vencidos o Desembargador
Ivan Leomar Bruxel, a Desembargadora Bernadete Coutinho Friedrich e o Doutor
José Luiz John dos Santos.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes
Senhores Des. Ivan Leomar Bruxel (Presidente), Des.ª Genacéia da Silva
Alberton, Des.ª Bernadete Coutinho Friedrich, Des. Ícaro Carvalho de Bem
Osório, Des. Francesco Conti e Dr. José Luiz John dos Santos.
Porto Alegre, 05 de abril de 2013.
Relator
Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (RELATOR)
Trata-se de recurso de embargos infringentes interposto por RONI F.S. em combate ao
acórdão das fls. 282/289, proferido pela E. 6ª Câmara Criminal desta Corte no
âmbito da apelação criminal nº. 70.050.557.958, julgada nos autos da ação penal
pública nº 2.11.0000236-1, que o MINISTÉRIO PÚBLICO move contra o ora
embargante perante a Vara Criminal da Comarca de Alegrete.
RONI F.S.
responde ao processo em liberdade. Contudo, foi decretada a medida cautelar do
seu afastamento da função de professor, enquanto perdurar a instrução
processual (fls. 38/40).
RONI F.S.
foi denunciado e processado como incurso nas sanções do art. 216-A, § 2º, do
C.P.B. (fls. 02/08).
Ao sentenciar (08/03/2012), a digna magistrada a quo
rejeitou as preliminares e, no mérito, julgou procedente a pretensão punitiva
deduzida, para condenar RONI
F.S. nas sanções do art. 216-A, § 2º, do C.P.B., fixando-lhe a pena
carcerária definitiva de 01 ano, 05 meses e 10 dias de detenção (pena-base em
01 ano e 01 mês, majorada em 1/3, em razão da vítima LETÍCIA L.B. ser menor de 18 anos de idade),
a ser cumprida em regime inicial aberto, substituída por duas penas restritivas
de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e em prestação
pecuniária no valor de um salário mínimo, ambas a serem definidas pelo Juízo
das Execuções Criminais. Por fim, concedeu ao réu o direito de apelar em
liberdade, manteve a medida cautelar de afastamento das suas funções de
professor, decretou a perda do cargo público de professor, com fundamento no
art. 92, inc. I, alínea "a", do C.P.B., condenou-o ao pagamento das
custas processuais e deliberou sobre as providências supervenientes ao trânsito
em julgado da sentença, se e quando (fls. 192/206).
Da sentença, o réu interpôs recurso de apelação, que
resultou julgado pela E. 6ª. Câmara Criminal desta Corte.
Ao proferir o acórdão ora embargado, a E. 6ª Câmara Criminal
(Relator: Des. JOSÉ ANTÔNIO DALTOÉ CEZAR; Revisora: Desª. BERNADETE COUTINHO
FRIEDRICH; Vogal: Des. ÍCARO CARVALHO DE BEM OSÓRIO), à unanimidade, rejeitou
as preliminares e, por maioria, com o voto-líder do Relator, negou provimento
ao apelo, vencido o Vogal, que lhe dava parcial provimento, para reduzir a pena
carcerária definitiva do réu para 01 ano e 02 meses de detenção (pena-base em
01 ano, aumentada em 1/6, em razão da vítima LETÍCIA L.B. ser menor de 18 anos de idade), e
desconstituir o decreto de perda da função pública, mantendo as demais
disposições da sentença recorrida (fls. 282/289).
O Ministério Público foi intimado pessoalmente (fl. 291). A
defesa, intimada por nota de expediente (fl. 292), interpôs o presente recurso
de embargos infringentes (fl. 295).
Nas razões do recurso (fls. 295/301), em síntese, a defesa
técnica do réu sustenta, com base no douto voto vencido, a ausência de motivos
para a fixação da pena-base acima do mínimo legal, bem assim para o aumento da
pena acima do mínimo legal no âmbito da 3ª etapa. Noutro quadrante, alega a
desproporcionalidade da medida de perda do cargo público de professor. Por fim,
requer o provimento do recurso, a fim de que prevaleça o voto vencido quando do
julgamento do aresto embargado.
Nesta Corte, o digno Procurador de Justiça FLÁVIO POYASTRO
PINHEIRO opina pela rejeição dos embargos infringentes (fls. 307/310). Após, em
18/03/2013, os autos vieram conclusos para julgamento, sendo incluídos na pauta
da sessão de 05/04/2013.
É o relatório.
VOTOS
Des. Aymoré Roque Pottes de Mello (RELATOR)
A. EM
PRELIMINAR.
O recurso é cabível, próprio e tempestivo (cert. da fl. 292
e protocolo da fl. 295).
B. NO
MÉRITO.
1. Nas duas
primeiras questões infringentes, o réu-embargante requer a fixação da sua pena-base
no mínimo legal de um ano de detenção, e, de outra parte, que a majorante
prevista no § 2º do art. 216-A do Código Penal em vigor seja dosimetrada no
mínimo legal de 1/6, daí resultando, nos termos do douto voto minoritário no
julgamento do apelo defensivo, a pena carcerária definitiva de um ano e dois
meses de detenção.
Com a máxima vênia, o presente recurso deve ser provido
nestes pontos controvertidos. Examine-se.
No caso sob exame, nos lindes da 1ª fase do dimensionamento
da pena carcerária do réu (art. 59, caput, do C.P.B.), as consequências
negativas mencionadas pela vítima e pela psicóloga que a analisou não advieram
dos dois ou três atos intrínsecos de assédio praticados pelo réu - todos de
levíssima intensidade, diga-se de passagem, levados a cabo, modo explícito, na
frente de dois alunos, e animicamente matriciados em dolo eventualíssimo -,
mas, sim, das controvérsias e críticas que a ofendida recebeu da sua
comunidade, inclusive escolar. Nesse contexto é que o trauma psicológico
apresentado pela vítima deve ser valorado, em si mesmo não desbordando dos
efeitos negativos normais decorrentes das elementares do tipo penal
incriminador em tela.
Nessa moldura, portanto, também positivadas em favor do réu
todas as demais operativas judiciais, não há razão plausível para que a
pena-base do réu afaste-se do mínimo legal aplicável à espécie (um ano de
detenção).
Por outro lado, na 3ª etapa do método trifásico, em razão da
majorante prevista no § 2º do art. 216-A do C.P.B. (crime cometido contra menor
de 18 anos), a baixa lesividade dos atos de assédio praticados e a idade da
vítima (14 anos) não autorizam que a majorante em tela seja dosimetrada em
fração superior ao mínimo legal aplicável à espécie (1/6), inclusive porque há
corrente doutrinária ponderável no sentido de que, entre professor e aluno, a
superioridade hierárquica ou a ascendência não são inerentes ao exercício do
emprego, cargo ou função docente (Nucci, "Código Penal Comentado",
Ed. RT, 11ª edição, revista, atualizada e ampliada, 2012, pp. 963/964).
Em consequência dessas valorações dosimétricas, impende
reduzir a pena carcerária definitiva do réu-embargante para um ano e dois meses
de detenção, nos termos do douto voto minoritário no julgamento da apelação
defensiva, da lavra do eminente Des. ÍCARO CARVALHO DE BEM OSÓRIO, que
transcrevo em parte, a fim de integrar as minhas razões de decidir as questões
ora sob exame, verbis:
"( ... )
Minha discordância diz respeito à pena aplicada e suas
consequências.
A vítima, segundo relatou à psicóloga e ao MP, a se sentir
assediada, saiu da sala e contou o fato aos colegas Matheus e Gabrielle, novamente entrando na
sala e sentando ao lado do professor. Não me convenci de que estivesse
seriamente amedrontada com a situação, de vez que se assim fosse, teria
aproveitado a saída e fugido do local. Ainda, o comentário com os colegas
serviu como um convite para testemunharem o fato, tanto que Matheus fotografou
a situação.
Este, Matheus, mentiu em Juízo, folha 112, ao dizer que nem
sabia que estava fotografando o assédio, já que estava apenas “regulando” a
máquina da colega. Incrível tal versão, e sequer foi repreendido por sua falta
da verdade, mormente quando seria impossível que alguém, “sem querer” tirasse
várias fotos de uma mesma situação com tamanha precisão. Com 14 anos de idade
já pode responder frente ao ECA, já que devidamente advertido e compromissado,
pelo delito de falso testemunho.
(...)
Estou fixando a pena-base então em 01 ano de detenção. No
tocante à causa de aumento, faço-a no patamar de 1/6, com o mesmo raciocínio
acima posto, ficando definitiva em 01 ano e 02 meses de detenção. Mantenho a
substituição por prd.
( ... )."
2. A
terceira questão controvertida neste recurso infringente diz com a
circunstância da sentença condenatória recorrida ter aplicado, adjetamente, ao
réu-embargante, a perda do cargo público de professor por ele titulado.
Neste ponto, também impende prover o recurso, para
desconstituir a sanção adjeta de perda do cargo público de professor, imposta
ao réu-embargante com fulcro no art. 92, inc. I, letra "a", do
C.P.B., porque o crime de assédio sexual não envolve a prática de abuso de
poder e/ou violação de dever para com a administração pública, também não
estando elencado entre os crimes contra a administração pública. Neste passo,
inclusive, vem à colação ilustrativa da questão as anotações doutrinárias que
acima referi sobre as relações não verticalizadas entre professor e aluno.
Como se vê, não há a possibilidade de RONI F.S. perder o seu
cargo público de professor, pois a sua ação não foi praticada com abuso de
poder, tampouco com violação de dever para com a administração pública.
A situação fática revelada pelos depoimentos carreados aos
autos evidencia que o assédio praticado foi circunstancial e não-hierárquico,
âmbito em que RONI F.S.
aproveitou que a ofendida estava ao seu lado, na sala de aula (e na frente de
dois alunos), para cometer a conduta descrita na denúncia. Não houve qualquer
ordem ou determinação do réu-embargante no sentido de subjugar a vítima, a fim
de submetê-la à sua lascívia, o que não configura os referidos requisitos
legais.
Portanto, não estando presentes os requisitos previstos para
o decreto de perda do cargo público.
3. Portanto,
renovada vênia, entendo deva prevalecer, no recurso infringente sob exame, o
douto voto minoritário no julgamento da apelação defensiva.
C. DISPOSITIVO
DO VOTO.
Diante do exposto, o meu VOTO é no sentido de dar provimento
ao recurso de embargos infringentes, para reduzir a pena carcerária definitiva
do réu-embargante RONI F. DOS S. para um ano e dois meses de detenção, e, de
outra parte, desconstituir a sanção adjeta que lhe declarou a perda do cargo
público de professor, mantendo as demais disposições da sentença condenatória
recorrida.
É o voto.
Des. Francesco Conti (REVISOR) - De acordo com o(a)
Relator(a).
Des.ª Bernadete Coutinho Friedrich
Voto em divergência, desacolhendo os embargos, mantendo
posicionamento manifestado ao tempo do julgamento do recurso de apelação na
Câmara.
Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório
Acolho os embargos, nos termos do voto que proferi nos autos
da Apelação Criminal nº 70050557958.
Dr. José Luiz John dos Santos
Com a vênia do em. Relator, desacolho os embargos, pelos
fundamentos que constam no percuciente voto condutor da maioria no acórdão
originário.
Des. Ivan Leomar Bruxel (PRESIDENTE)
Voto por negar provimento aos embargos infringentes.
Des.ª Genacéia da Silva Alberton - De acordo com o(a)
Relator(a).
DES. IVAN LEOMAR BRUXEL - Presidente - Embargos Infringentes
e de Nulidade nº 70053145926, Comarca de Alegrete: "POR MAIORIA, DERAM
PROVIMENTO AO RECURSO DE EMBARGOS INFRINGENTES, PARA REDUZIR A PENA CARCERÁRIA
DEFINITIVA DO RÉU-EMBARGANTE RONI F. DOS S. PARA UM ANO E DOIS MESES DE
DETENÇÃO, E, DE OUTRA PARTE, DESCONSTITUIR A SANÇÃO ADJETA QUE LHE DECLAROU A
PERDA DO CARGO PÚBLICO DE PROFESSOR, MANTENDO AS DEMAIS DISPOSIÇÕES DA SENTENÇA
CONDENATÓRIA RECORRIDA, VENCIDOS A DESA. BERNADETE, O DR. JOHN E O DES.
BRUXEL.”
Julgador(a) de 1º Grau: CARLA BARROS SIQUEIRA PALHARES
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