Onde não houver respeito pela
vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições mínimas
para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver limitação de
poder, enfim, onde a liberdade e a autonomia, a igualdade e os direitos
fundamentais não forem reconhecidos e minimamente assegurados, não haverá
espaço para dignidade humana e a pessoa não passará de mero objeto de arbítrio
e injustiças. – Ingo Wolfgang Sarlet
A situação carcerária brasileira está à beira do colapso, ou
melhor, é o verdadeiro colapso, assunto que é exaustivamente veiculado pelas
mídias. Mas como uma situação tão assombrosa ainda é tratada com tanto descaso?
Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul é um péssimo
exemplo, onde diariamente presenciamos situações vexatórias, presos
acorrentados em viaturas policiais, latas de lixo, nas mais humilhantes
situações, a cadeia pública, antigo e “famigerado” Presidio Central, considerado
pior presídio da América Latina ainda é referência de como um presídio não deve
operar.
Na terça-feira (24/09/2019), 95 presos estavam algemados em
18 viaturas, em um terreno na rua Salvador França em Porto Alegre, o número
conforme a juíza da 1ª vara de execuções penais flutua diariamente, dependendo
da quantidade de detenções e liberação de vagas no sistema.
Com muita frequência presenciamos situações onde presos
provisórios são sentenciados a penas inferiores ao tempo que estiveram
segregados em condição mais gravosa, ou ainda, respondem por processos onde a
pena máxima que poderia ser arbitrada em caso de condenação não corresponde ao
“castigo” em cumprimento.
Infelizmente grande parcela da população vê mérito nesse
tipo de trato, entende que quanto piores as condições melhor, e conclui, “Tá
com pena? Por que não leva para casa? ”
O senso comum não perdoa e a ignorância impera,
diuturnamente voltamos a arguir, quem defende que haja o cumprimento de pena de
forma digna, com a finalidade de reinserção do indivíduo na sociedade, não é a
favor da impunidade, a causa vai muito além da labuta criminal, a causa é
humanitária, exige senso de humanidade.
Enquanto houver viaturas lotadas com presos aguardando vagas
em presídios, enquanto os presídios funcionarem como depósitos humanos, todos
estão em risco, o tratamento desumano ultrapassa a figura do suspeito, ele
chega aos agentes de segurança pública que também sofrem com as condições
precárias deste tipo de custódia.
É um mal banalizado que coloca todos em risco, inclusive
aqueles que aplaudem e esquecem que o efetivo que permanece custodiando os
presos em delegacias, por exemplo, deveria estar circulando nas ruas.
Quem defende que haja sofrimento àqueles que cometeram
delitos, esquece que não existe prisão perpétua no Brasil. Não conta que esse
indivíduo voltará ao convívio social um dia, e se tratado de forma que não
proporcione sua reinserção no meio social, a probabilidade de voltar a cometer
delitos é grande.
O Estado que fomenta o crime
Dentre vários problemas ocasionados, um dos mais penosos ao
estado é que retroalimentar o sistema com o aprisionamento em massa condiciona
o fortalecimento das facções criminosas, onde os encarcerados são captados para
o os exércitos do tráfico, o cliente do sistema carcerário é na maior proporção
o mesmo, negros, pobres, pessoas que não viram o estado chegar, senão na hora
de aplicar a reprimenda penal.
Acertadamente, BUENO DE CARVALHO (2013, p. 98) traz em sua
obra a concepção desvirtuada que se tem, a uma, de que no tempo em que
permanece preso o indivíduo pelo menos não estaria cometendo mais crimes, um
exercício trágico de futurologia que é exercido por grande parte dos “gênios da
segurança”, e outra, é de conhecimento que na prática existe uma extensa gama
de delitos praticado de dentro dos muros dos presídios para fora destes,
acabando o Estado que por via de uma punição, acaba por organizar o crime
dentro dos presídios.
A violência acaba por ser institucionalizada, o estado acaba
operando para contribuir com o pioramento do cidadão, ao invés de se inibir o
crime, acaba sendo ferramenta essencial para aumento do mesmo. Em tempos onde o
óbvio precisa ser dito, essa bandeira não pode deixar de ser levantada, é dever
do operador do direito não aceitar essas situações como normais, sempre é hora
de lutar, sempre é hora de ser voz.
Fonte: Canal Ciências Criminais
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