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quinta-feira, março 29

Lei Seca perde força na Justiça (*)


(*)Matéria publicada no Jornal Zero Hora


Por decisão do STJ, só o teste do bafômetro e o exame de sangue valem como prova de embriaguez em processos criminais


O Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu ontem que apenas o bafômetro e o exame de sangue servem como prova da embriaguez de um motorista e podem ser levados em consideração em processos criminais. A Justiça não aceitará mais como provas o depoimento de testemunhas ou o exame clínico, no qual a presença de álcool é atestada a partir de sinais exteriores, como desequilíbrio ou odor. A mudança enfraquece a chamada Lei Seca.

A partir de agora, o motorista que se recusar a fazer o teste do bafômetro ou de sangue, o que é um direito de todo cidadão, não poderá ser acusado ou punido pelo crime de dirigir embriagado, mesmo que haja sinais evidentes de que está embriagado. A lei determina que é crime dirigir com uma quantidade de álcool acima de seis decigramas por litro de sangue.

A decisão do STJ, por cinco votos contra quatro, deverá ser adotada por todos os tribunais do país. O desembargador convocado Adilson Macabu conduziu o voto vencedor.

– Para os fins criminais, há apenas bafômetro e exame de sangue. Não se admitem critérios subjetivos. Mais de 150 milhões de pessoas não podem ser simplesmente processadas por causa de uma mera suspeita – disse Macabu.

Na mesma linha, o ministro Og Fernandes foi incisivo:

– Não é crime dirigir sob efeito de álcool. É crime dirigir sob efeito de mais de seis decigramas de álcool por litro de sangue.

Com a decisão de ontem, no caso de haver processo criminal, o juiz poderá se amparar, para sua decisão, somente em prova resultante do bafômetro ou exame de sangue, mas na área administrativa a decisão do STJ terá pouco impacto, segundo especialistas gaúchos.

A observação da autoridade continuará válida para a aplicação de multas de trânsito.

São dois âmbitos diferentes.

– Os tribunais do Rio Grande do Sul vinham considerando as provas testemunhais de forma equivocada. Para efeitos de caracterizar o crime de embriaguez ao volante, não valem. Quanto à infração de trânsito, não é necessário que se comprove teor alcoólico. Na parte administrativa continua a mesma coisa – afirma Nei Mitidiero, ex-juiz especializado em crimes de trânsito.

Uma pessoa cambaleando ou com hálito que acuse o consumo de álcool não necessariamente consumiu quantidade proibida por lei, argumenta o advogado André Moura, especialista em trânsito e diretor-geral da Escola Superior de Ensino Jurídico do Instituto dos Advogados do Estado:

– O processo administrativo difere do criminal. No administrativo, a recusa em fazer o exame de bafômetro enseja a autuação que vai desencadear um processo de suspensão do direito de dirigir.


Em entrevista ao Jornal Zero Hora, o ministro Gilson Dipp manifestou-se dizendo ter sido voto vencido na decisão.  
  

ZH – Qual o impacto da decisão do STJ?

Gilson Dipp – A verificação da embriaguez só pode ser feita pelo bafômetro ou exame de sangue. Houve empate, e a presidência da sessão desempatou. Eu fui voto vencido. Exame clínico ou depoimento da autoridade policial não servem mais para caracterizar crime. Considera-se crime quando a concentração de álcool atinge certos percentuais. Se não houver bafômetro ou exame de sangue, não se pode aferir se esses percentuais foram atingidos.

ZH – A reforma do Código Penal poderá aceitar outra prova?

Dipp – Há uma proposta que simplifica a questão. Retira a dosagem no sangue para constatação de embriaguez. Se não é preciso verificar se tem tantos decigramas, não precisa ser por meio de bafômetro ou exame de sangue. Há tendência de que isso seja aprovado.

ZH – A aprovação do novo código, com essas alterações, pacificaria essa questão?

Dipp – Se for aprovado, passar pelo Congresso, vira lei. Os tribunais têm de seguir a lei



Zero Hora  publica, também, uma síntese sobre o que muda com o entendimento explicitado pela decisão do STJ.

Ônus da prova

— Quando o motorista se nega a fazer o teste do bafômetro, ele pode ser considerado embriagado pela autoridade de trânsito, pela inversão do ônus da prova. Para fins criminais, no entanto, isso não terá validade.

Exame clínico

— O agente leva o motorista até um médico, que preenche um laudo onde são assinalados pontos como existência de odor de álcool, vestes desalinhadas, equilíbrio, exaltação, olhos vermelhos e agressividade. Essa avaliação deixa de ter valor para a Justiça.

O que continua valendo

Teste do bafômetro

O bafômetro indica o número de miligramas de álcool por litro de ar expelido dos pulmões, demonstrando se o motorista está dentro do permitido por lei. Pode ser feito no momento da abordagem.

Exame de sangue

Verifica a quantidade de álcool no sangue e se o motorista consumiu além do permitido. É feito no Departamento Médico Legal.

As mudanças

O que diz a legislação?

É crime, com pena de seis meses a um ano, dirigir com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas.

O que o STJ decidiu?

Para fins criminais, só o bafômetro e o exame de sangue são válidos como prova. Testemunhos e sinais exteriores não têm validade judicial.

A Lei Seca fica esvaziada?

Ninguém é obrigado a produzir provas contra si e, por isso, o motorista não precisará fazer o teste do bafômetro ou exame de sangue, o que inviabiliza a comprovação da embriaguez para efeitos penais.

A decisão muda as blitze da Balada Segura?

Não. Na blitz, o motorista poderá sofrer penas administrativas. Na área administrativa, que envolve as multas, continua valendo como evidência a observação da autoridade de trânsito.

O que muda na área criminal?

Caso o MP processe o motorista por embriaguez, o processo deverá ser trancado quando chegar ao STJ, que não vai aceitar outras provas.


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