“A antecipação terapêutica do parto na anencefalia constitui
exercício de direito fundamental da gestante. Com isso, não se está afirmando que
as mulheres devem ser obrigadas a interromper a gestação nesta hipótese, o que
seria uma terrível violência para aquelas que, em decisão livre, preferissem
levar sua gravidez até o final.
O que se está sustentando é que a escolha sobre o que fazer,
nessa difícil situação, tem de competir à gestante, que deve julgar de acordo
com os seus valores e a sua consciência, e não ao Estado. A este cabe apenas
garantir os meios materiais necessários para que a vontade da mulher possa ser
cumprida, num ou noutro sentido”, sustentou.
Dois pareceres
Ao firmar esse posicionamento, o procurador-geral ratificou
o parecer assinado anteriormente (2009) pela vice-procuradora-geral da
República, Deborah Duprat, que defendeu a total procedência da ADPF 54. Em
sentido contrário, houve também um parecer assinado, em 2004, pelo então chefe
do Ministério Público, Claudio Fonteles.
De acordo com Gurgel, sua opinião no julgamento de hoje foi
formada a partir do exame cuidadoso do volumoso material reunido nos dois
sentidos propostos e, acima de tudo, baseada em muita reflexão.
“Essa convicção se lastreia na conjugação de fundamentos
científicos e fundamentos jurídicos, notadamente constitucionais”, afirmou.
Dados científicos
Ao destacar dados científicos tratados no próprio pedido inicial
da ADPF 54, o procurador-geral ressaltou que cerca de 65% dos fetos anencéfalos
morrem no período intrauterino. Aqueles que chegam até o final da gestação,
sobrevivem apenas algumas horas ou minutos após o parto.
Gurgel ainda destacou que depois de diagnosticada a
ancenfalia não há nada que a ciência médica possa fazer para salvar o feto e
que a continuação da gravidez é potencialmente perigosa, colocando em risco a
vida da gestante. Também ressaltou que esse julgamento não pressupõe o debate
acerca do aborto e de sua criminalização no Brasil, pois a hipótese tratada é
mais simples, na medida em que a antecipação do parto situa-se no campo da
medicina, quando não há qualquer possibilidade de vida extrauterina.
Conduta atípica
Ao defender a descriminalização da antecipação do parto de
anencéfalos, o procurador-geral destacou que a prática “não lesa os bens
jurídicos tutelados pelos artigos 124 a 128 do Código Penal”. Isso porque o bem
jurídico protegido pelas normas que tipificam o aborto é a vida do feto. E, na
interrupção de gravidez de feto anencefálico, não é a ação da gestante ou de
profissionais da saúde que impede o seu nascimento com vida.
“O anencéfalo é um natimorto cerebral e, portanto, o tipo
não se caracteriza”, destacou Gurgel ao defender a procedência integral da APDF
54.
Fonte: Site do STF
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