(Foto: Giovani Grizotti/RBS TV) |
Um teste realizado por meio de um
sistema que mede a qualidade do sinal de celulares aponta que a intensidade de
sinal no Presídio Central, em Porto Alegre,
e no Presídio de Alta Segurança de Charqueadas é melhor do que em locais
como o Hospital de Clínicas, o prédio do Ministério Público e delegacias de
polícia da capital. A facilidade de usar
os aparelhos dentro das cadeias estimula um mercado clandestino de aparelhos,
que já gerou a apreensão de 21 mil telefones desde 2011.
A equipe da RBS TV mediu o sinal
em Porto Alegre e em Charqueadas, na Região Metropolitana (veja no vídeo ao
lado). Próximo ao Centro da capital funcionam seis delegacias que investigam
homicídios. O celular, uma das principais ferramentas de trabalho, fica mudo a
maior parte do tempo. Para fazer uma simples ligação os servidores precisam
caminhar até a rua. Dentro da sala da delegada, o teste foi feito com quatro
operadoras diferentes, usando aplicativos que medem o sinal da telefonia móvel.
No sistema, a intensidade do
sinal é medida em números sempre negativos. Quanto mais próximo de zero,
melhor. A qualidade máxima é indicada por -50. A partir de -105, a conversação
fica inviável. Durante o teste na delegacia, em uma das operadores o sinal
apareceu, mas sem condições de completar a chamada.
“No final do dia, quando eu saio
daqui, entram as chamadas perdidas. Aí sim eu posso retornar. É complicado”,
reclama a delegada Ana Rita Barbosa Loss.
A dois quilômetros de distância,
dentro do Presídio Central, a intensidade chegou a ser 80% mais forte. Enquanto
na polícia o aparelho aponta -113 pontos, no presídio são - 69 pontos. Enquanto
isso, os crimes são combinados pelos próprios detentos.
Preso: "Então, me liga
quando tu ver aí que eu vou mandar o "véio" aí, "tá?"
Contato: “Quem quer matar aquele
cara sou eu. Tu me dá o ferro aí e eu mato”.
Em outra escuta, os presos
negociam aparelhos dentro do presídio.
Preso 1: "E aí "mano
veio" tem uns aparelhinho bom, aí?"
Preso 2: "Tem tem, é uns mil pra cima"
Preso 1: "Tá e carregador?"
Preso 2: "Carregador tem, mas aí tem que comprar
separado, né"
Preso 1: "A para, dá uma força sou eu que tá
falando"
Preso 2: "Vou mandar pra ti olhar aí".
O delegado Tiago Baldin conta que
já interceptou ligações provenientes da cadeia. “Não percebi nenhuma queda de
sinal. Pelo contrário, é um sinal claro, limpo. O que acaba nos ajudando em
termos de investigação criminal. O que nos causa repulsa é saber que o sinal de
telefonia para pessoas reclusas do sistema prisional, que não deveriam ter
acesso a esse tipo de serviço, acabam tendo mais facilidade que nós”, aponta
Baldin.
A qualidade do sinal fez surgir
um mercado clandestino de telefones dentro da cadeia, entre os presos. Escutas
obtidas com exclusividade pela RBS TV flagram negociações de aparelhos. O valor
de um aparelho começa em R$ 1 mil.
Hospitais também apresentam
problemas no sinal da telefonia
O sinal que sobra no presídio,
falta em um dos principais hospitais da capital. Sobre a mesa da emergência
lotada do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, celulares ficam fora de
serviço. E de todas as operadoras. Um médico plantonista tenta ligar ao Samu,
mas não consegue contato. “Estou tentando ligar daqui de dentro, mas não dá.
Qualquer ligação tem que ser do telefone fixo”, explica o médico Márcio
Rodrigues.
No prédio do Ministério Público,
ocorre a mesma situação. Para o juiz Sidnei Brzuska, a telefonia móvel retira a
principal missão do presídio. "No momento em que o telefone celular
ingressa no presídio e o preso faz uso deste telefone celular, a principal
função da prisão, que é conter o sujeito, deixa de existir, porque os crimes de
roubo, tráfico e homicídio seguem sendo praticados com o uso deste veículo de
comunicação”, aponta Brzuska.
Em Charqueadas, na Penitenciária
de Alta Segurança (Pasc), a força do sinal foi medida, e apenas o chip de uma
das operadoras não funcionou. Os outros indicaram, em média, uma intensidade
boa, suficiente para se conversar durante horas.
“A última empresa que estava
fazendo esses testes na Pasc era uma empresa paulista e chinesa, que tinha
capacidade de fazer o monitoramento de sinal e nos trouxe relatos que o sinal
estava muito forte, o que dificultava o trabalho dos bloqueios”, contou o
superintendente da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe),
Gelson Treiesleben.
Sindicato diz que cabe ao poder
público encontrar alternativa
A farra dos telefones nas cadeias
é medida pelos números. Nos últimos dois anos e meio, 21 mil aparelhos foram
apreendidos nas penitenciárias gaúchas. “E não sabemos quantos ainda estavam e
ainda estão. De fato, o celular na mão do delinquente é uma arma ou até mais do
que isso. Permite uma comunicação que dificilmente se consegue acompanhar”,
opina o promotor de justiça Gilmar Bortolotto.
A Susepe afirma que está
intensificando as revistas e adquirindo equipamentos para coibir a entrada de
aparelhos. “Se tivéssemos o apoio das operadoras em liminar ou o perímetro das
penitenciárias com zero de sinal, seria interessante pra segurança”, afirma
Treiesleben.
A operadora Oi disse que oferece
cobertura de sinal suficiente em todo o município de Porto Alegre e em mais 397
cidades gaúchas. A Claro informou que tanto o Presídio Central, na capital,
quanto a Penitenciária de Alta Segurança, em Charqueadas, estão dentro dos
perímetros onde a empresa tem cobertura. A Vivo disse que a sua engenharia está
verificando a qualidade do sinal nos locais apontados. A RBS TV não conseguiu
contato com a Tim.
O sindicato que representa as
empresas diz que cabe ao poder público encontrar saídas para bloquear as
comunicações nos presídios e nega que haja falta de critério na distribuição do
sinal da telefonia.
“Não há falta de critério. O que
há é o planejamento de uma rede móvel que tem como uma das premissas,
justamente, a qualidade e a capacidade da rede. Então, não há discriminação
entre localidades. O que existem são projetos que dependem da condição de
propagação de sinal. Eventualmente tem alguma restrição para a instalação de
infraestrutura da operadora no local e isso pode acarretar uma situação
diferenciada. Os locais que têm condição geográfica mais favorável a principio
tem sinal de melhor qualidade”, completa Sérgio Kern, da Sintelebrasil.
Fonte: Site G1 RS
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