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"Revela-se patente a aludida 'ascendência', em virtude da 'função' – outro elemento normativo do tipo –, dada a atribuição que tem a cátedra de interferir diretamente no desempenho acadêmico do discente, situação que gera no estudante o receio da reprovação."
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, entendeu que o crime de assédio sexual – definido no artigo 216-A do Código Penal (CP) e geralmente associado à superioridade hierárquica em relações de emprego – pode ser caracterizado no caso de constrangimento cometido por professores contra alunos.
No voto seguido pela maioria, o
ministro Rogerio Schietti Cruz destacou que, embora não haja pacificação
doutrinária e jurisprudencial acerca do tema, é preciso considerar a relação de
superioridade hierárquica entre professor e aluno, nas hipóteses em que o
docente se vale da sua profissão para obter vantagem sexual.
"Ignorar a notória
ascendência que o mestre exerce sobre os pupilos é, equivocadamente,
desconsiderar a influência e, mormente, o poder exercido sobre os que admiram,
obedecem e, não raro, temem aquele que detém e repassa o conhecimento",
afirmou Schietti.
O caso
Segundo o processo, o réu, em
2012, ao conversar com uma aluna adolescente em sala de aula sobre suas notas,
teria afirmado que ela precisava de dois pontos para alcançar a média
necessária e, nesse momento, teria se aproximado dela e tocado sua barriga e
seus seios.
Em primeira instância, o acusado
foi condenado a um ano e quatro meses de detenção mais multa, pela prática do
delito descrito no artigo 216-A, parágrafo 2º, do CP. A sanção foi substituída
por pena restritiva de direitos.
A defesa apelou, e o Tribunal de Justiça
de São Paulo (TJSP) deu parcial provimento ao recurso para reduzir, de um terço
para um sexto, a fração de aumento pela majorante aplicada em virtude de ser a
vítima menor de 18 anos. Com isso, a pena final foi estabelecida em um ano e
dois meses de detenção.
No recuso ao STJ, o professor
alegou que não foi comprovada a intenção de constrangimento com fins de obter
vantagem ou favorecimento sexual e que a aluna nem precisava dos pontos para
aprovação na matéria.
Ele afirmou ainda que o crime de
assédio sexual não pudesse ser considerado no caso, pois não havia relação hierárquica com a suposta vítima.
Exemplo de conduta
Em seu voto, o ministro Schietti
sustentou que o vínculo de confiança e admiração entre professor e aluno
pressupõe inegável superioridade, capaz de "alterar o ânimo da pessoa
perseguida".
"Revela-se patente a aludida 'ascendência', em virtude da 'função'
– outro elemento normativo do tipo –, dada a atribuição que tem a cátedra de
interferir diretamente no desempenho acadêmico do discente, situação que gera
no estudante o receio da reprovação."
Para fundamentar a tese que
prevaleceu no julgamento, o magistrado citou o texto original da Lei
10.224/2001, que incluiu no CP o artigo 216-A, cujo parágrafo único estendia o
conceito de assédio sexual para os atos cometidos "com abuso ou violação
de dever inerente a ofício ou ministério".
Schietti ressaltou que, embora o
texto tenha sido posteriormente vetado para evitar bis in idem (duplicação
de punição por situações já previstas no artigo 226 do CP), "é notório o
propósito do legislador de punir aquele que se prevalece da condição como a
narrada nos autos para obter vantagem de natureza sexual".
"Faço lembrar que o
professor está presente na vida de crianças, jovens e também adultos durante
considerável quantidade de tempo, torna-se exemplo de conduta e os guia para a
formação cidadã e profissional, motivo pelo qual a 'ascendência' constante do
tipo penal objeto deste recurso não pode se limitar à ideia de relação
empregatícia entre as partes", disse o ministro.
O número deste processo não é
divulgado em razão de segredo judicial.
Fonte: STJ
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