Por Gustavo Perera (*)
Imagem Ilustrativa - Disponível na Web |
Entende-se em legítima defesa
quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão,
atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
De início, imprescindível
destacar alguns elementos presentes no texto: uso moderado do meio, injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Assim, tem-se que o
indivíduo, no momento que sofre ou está prestes a sofrer injustificada
provocação, não pode respondê-la de forma desproporcional. Ainda, vale dizer
que essa ação pode ser em proteção a outra pessoa, e não somente ao indivíduo
que age em legítima defesa.
Visto isso, entramos no mérito da
legítima defesa no pacote anticrime do ministro da Justiça e Segurança Pública,
Sergio Moro. O ministro propõe, por meio do pacote, um parágrafo único com duas
novas hipóteses que deverão ser consideradas como legítima defesa:
Observados os requisitos do
caput, considera-se em legítima defesa:
I – o agente policial ou de
segurança pública que, em conflito armado ou em risco iminente de conflito
armado, previne injusta e iminente agressão a direito seu ou de outrem;
II – o agente policial ou de
segurança pública que previne agressão ou risco de agressão a vítima mantida
refém durante a prática de crimes.
Em um primeiro momento, tais
situações parecem compatíveis com o entendimento da legítima defesa. E são.
Talvez seja exatamente esta a problemática trazida no presente texto. Moro
acrescenta duas hipóteses que, mesmo antes do pacote, já seriam consideradas
legítima defesa. Veja que ambas situações se tratam de um perigo atual ou
iminente, injusto e a direito seu (inciso I) ou de outem (inciso II).
Em tempo, lembram do que foi
destacado no primeiro parágrafo deste texto? “Todo e qualquer cidadão”? Pois
bem. Ao examinar as alterações trazidas, é possível verificar que os referidos
casos são direcionados a uma classe, um grupo, qual seja, agentes policiais e
de segurança pública. No entanto, esta especificação não se sustenta, uma vez
que a legítima defesa é um direito de todo e qualquer cidadão brasileiro.
É como se no artigo 5° de nossa
Constituição Federal, o qual prevê os direitos fundamentais de todos cidadãos,
tivesse a seguinte observação ao final: “os direitos acima delineados são
válidos também para os agentes policiais e de segurança pública”. Não há motivo
para especificar um direito que é de todos.
Dessarte, tem-se que as
alterações vistas até então são, no mínimo, desnecessárias. Entretanto, existem
alguns aspectos que podem ser entendidos como nocivos para nosso ordenamento
jurídico.
Isso porque no texto trazido pelo pacote é possível notar que se
repetem alguns elementos do caput do artigo, como, por exemplo, a atualidade ou
iminência, injusta agressão e a direito seu ou de outrem.
Contudo, há um elemento que não
se repete: usando modernamente dos meios necessários. Em um resquício de
ingenuidade, não é perceptível a nocividade disso, porém é justamente a
ausência desse elemento que nos leva à possibilidade do excesso de legítima
defesa, outra alteração trazida pelo ministro Sergio Moro.
“O juiz poderá reduzir a pena até
a metade ou deixar de aplicá-la se o excesso decorrer de escusável medo,
surpresa ou violenta emoção” é o que prevê o pacote em relação ao excesso
escusável na legítima defesa. O que se critica é a abrangência desse texto.
Quem medirá o medo, a surpresa ou a violenta emoção? Quem delimitará o excesso?
O que é violenta emoção?
Ou, ainda, em um país com um
sistema comprovadamente racista e elitista, onde jovens negros são diariamente
“confundidos”, esta abrangência do texto não seria arriscada? Guarda-chuva
confundido com fuzil, celular confundido com revólver, o músico que levou 80
tiros em frente a sua família por ser confundido com um bandido e, agora, a
pequena Ágatha. São sempre as mesmas vítimas dessa confusão. São sempre os
mesmos que “encontram” as balas perdidas.
Fonte: Canal Ciências Criminais
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