Os Desembargadores 3ª Câmara Criminal do TJRS, em sessão
ocorrida nesta quinta-feira (14/3), decidiram manter o julgamento de Ricardo
Neis pelo júri popular. Por maioria, determinaram que o réu responda pelo crime
de 11 tentativas de homicídio simples e cinco lesões corporais.
No 1º Grau, ele havia sido pronunciado por 17 tentativas de
homicídio qualificado.
Lesão corporal
O relator do recurso, Desembargador Diógenes Vicente Hassan
Ribeiro, ponderou que das 17 vítimas apresentadas na denúncia, quatro afirmaram
ter sido atingidas por outras bicicletas e não diretamente pelo acusado. Pelo
depoimento de uma quinta vítima, não foi possível determinar quem a atingiu.
Portanto, decidiu desqualificar o crime de tentativa de homicídio para lesão
corporal, com relação a essas cinco pessoas.
Também foi excluída a tentativa de homicídio contra uma
sexta manifestante, já que ela não foi ouvida pela polícia e não compareceu à
Justiça para prestar depoimento. Dessa forma, o réu foi impronunciado em
relação a essa manifestante.
Tentativa de homicídio
Foi mantida a acusação de tentativa de homicídio contra 11
ciclistas que relataram ter sido atingidos pelo veículo do réu. Apesar de
considerar possível que Neis não buscasse a morte dos manifestantes, destacou
ser sabido que um choque de um veículo, ou a queda de uma pessoa em
consequência de um choque de um veículo automotor, é possível de levar ao
óbito.
Qualificadoras
O Desembargador analisou ainda o pedido do Ministério
Público para que fossem reconhecidas as qualificadoras de motivo fútil e perigo
comum. Por outro lado, a defesa buscava afastar a qualificadora de meio que
dificultou a defesa da vítima, que havia sido reconhecida pelo Juízo de 1º
Grau.
Em relação ao motivo fútil, o magistrado entendeu não ter
sido demonstrado pela Promotoria, que alegou que o réu queria imprimir
velocidade no veículo, encontrando vítimas pelo caminho, demonstrando egoísmo e
individualismo. O Desembargador entendeu que as provas não comprovam essa tese,
pois apontam a ocorrência de uma discussão entre o motorista e os manifestantes
que o impediam de passar. Logo, não se constata a intenção de apenas imprimir velocidade
em seu veículo.
Quanto ao perigo comum, observou que o Código Penal
estabelece que este aplica-se a crime com emprego de fogo, veneno, explosivo,
asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou que possa resultar perigo
comum. Apontou que a qualificadora de perigo comum poderia ser aplicada somente
se outras pessoas, além do alvo, pudessem ser atingidas. No caso, enfatizou, o
alvo eram todas as pessoas que estivessem impedindo o acusado de trafegar.
Dessa forma, concluiu, não cabe essa qualificadora.
Também afastou a qualificadora de recurso que dificultou a
defesa da vítima. Lembrou que, de acordo com os depoimentos dos próprios
ciclistas, por vezes os automóveis tentaram trafegar entre eles, o que era
impedido pelos próprios manifestantes. Apontou ainda que os manifestantes
ocupavam toda ou grande parte da via. Estas pessoas que circulam de bicicleta
na via de rolamento sabem que, eventualmente, podem sofrer algum tipo de
acidente, que correm esse riso. No caso dos autos, já sabendo da animosidade de
alguns motoristas, ficam ainda mais atentas.
Ressaltou ainda a prévia discussão entre o motorista e os
manifestantes. Acrescentou que todo o ataque tem uma dose natural de surpresa,
portanto não é o simples fato de se iniciar um ataque súbito que caracteriza a
qualificadora.
Concurso de crime
O Desembargador analisou também o concurso de crimes. Para o
magistrado, o crime enquadra-se no concurso formal perfeito. Assim, em caso de
condenação, deve-se aplicar a pena mais elevada ou, se iguais, a mais grave,
acrescida de um sexto à metade.
O recorrente não teve desígnios autônomos, pois teve o
desígnio de afastar-se do local, acelerando o veículo e arremetendo-o contra
quem estivesse à sua frente - os ciclistas que participavam do movimento. Por
isso, concluiu tratar-se de concurso formal perfeito.
O Desembargador Nereu Giacomolli acompanhou o voto do
relator. Enfatizou que a punição dos culpados tem que se limitar ao que
realmente fizeram. Aqui o exame é jurídico e técnico e não leigo e menos ainda
para agradar ou desagradar quem quer que seja.
Divergência
O Desembargador Jayme Weingartner Neto votou no sentido de
que Neis fosse julgado por 16 tentativas de homicídio. Para o magistrado, o
motorista que acelera e arremessa o automóvel contra as pessoas que estão à sua
frente sabe o resultado que será produzido, não só em relação aos que
diretamente acertou, inclusive pelos desdobramentos imprevisíveis decorrentes
de tumultos multitudinários.
Também divergiu quanto ao afastamento da qualificadora do
perigo comum. No seu entendimento, uma vez que o motorista atingiu direta e
indiretamente 16 ciclistas, resta clara a existência de indicativos de que
expôs a perigo tantos outros ciclistas, além de pedestres que estavam no local.
Contudo, o Desembargador restou vencido.
Ainda não está marcada a data do julgamento pelo Tribunal do
Júri.
O caso
O crime ocorreu no dia 25/2/2011, no Bairro Cidade Baixa, em
Porto Alegre, durante evento de ciclistas promovido pelo Massa Crítica.
Conforme denúncia do Ministério Público, 17 pessoas foram atropeladas pelo réu
que estava no carro acompanhado de seu filho, dirigindo logo atrás do grupo.
No dia 1º/3 do mesmo ano, a 1ª Vara do Júri decretou a
prisão de Neis, que estava recolhido no Hospital Psiquiátrico Parque Belém. Em
11/3, nova decisão determinou que o réu fosse removido para o Presídio Central,
onde ficou até o dia 7/4, quando foi liberado por habeas corpus concedido pela
3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça.
A denúncia foi recebida em 25/2/2011, dando-se início às
audiências. Foram ouvidas aproximadamente 15 testemunhas de acusação, além das
17 vítimas e cinco testemunhas de defesa.
Fonte: Site do TJRS
Comentário meu: Em um
julgamento rápido que eu assisti hoje na 3ª Câmara Criminal do TJRS, a decisão dos
Desembargadores resultou na pronúncia do acusado por 11 crimes tentados de
homicídio (simples, já que afastada as qualificadoras pretendidas pela acusação),
além de cinco lesões corporais.
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