Pelo menos cinco mulheres são mortas por mês no Distrito Federal vítimas de violência doméstica, assaltos, brigas e dívidas com drogas. A maioria tinha entre 18 e 24 anos e morreu em regiões administrativas afastadas do Plano Piloto.
Em 2011, Recanto das Emas, Planaltina, Ceilândia, Samambaia e Taguatinga registraram, no total, 21 assassinatos de pessoas do sexo feminino — 38% dos 54 registrados pela Polícia Civil entre janeiro e outubro.
Em 2010, dos 62 crimes, 34 (54%) tiveram como autores os próprios companheiros. Os dados são do Departamento de Estatística e Planejamento Operacional (Depo) da Polícia Civil.
As mortes ocorrem mesmo diante do aumento do número de denúncias sobre violência contra a mulher no DF. Segundo Maria Lúcia Leal, coordenadora do Grupo de Pesquisa sobre Tráfico de Pessoas, Violência, Exploração Sexual de Mulheres, Crianças e Adolescentes (Violes), ligado à Universidade de Brasília, isso ocorre porque as políticas de proteção não crescem na mesma proporção que os pedidos de socorro das vítimas. “Não funcionam a tempo de desconstruir a violência.
O Estado precisa ser mais eficaz. E a Justiça tem de responsabilizar imediatamente o agressor, o que não ocorre. Hoje em dia, um processo demora tanto para ser constituído que, neste período, aumenta a raiva do agressor. A punição precisa ser mais imediata”, ressalta, acrescentando, porém, que o mais importante é a prevenção.
A comerciária Ana Cléa de Sousa Nascimento, 23 anos, é a mais recente vítima no DF da violência doméstica. Ela foi assassinada a tiro dentro de uma lanchonete no centro de Taguatinga, no último sábado. O acusado do crime é o ex-companheiro Cláudio Rodrigues Mourão, 32. Familiares da vítima disseram ao Correio que, depois da morte da jovem, ficaram sabendo por meio de amigos que o homem já tinha feito ameaças à ela (Leia reportagem abaixo).
Em 2011, as delegacias investigaram 36 tentativas de homicídio contra mulheres. Oito delas (22%) haviam denunciado agressões por parte dos homens. A violência doméstica e a relação com as drogas aparecem entre as principais causas dos assassinatos.
“São situações desse tipo que costumam terminar em homicídios”, avalia a delegada Ana Cristina Melo, titular da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam). Segundo a investigadora, antes de ocorrer um assassinato, mulheres sofrem humilhações e ameaças. Muitas vezes, permanecem caladas diante das agressões.
Assim foi com Tatiana Jacaúna, 28 anos. A polícia encontrou o corpo dela carbonizado, em 26 de setembro do ano passado, em uma matagal, no Recanto das Emas. Segundo a polícia, o marido, Célio Gledson Rufino de Oliveira, 29, a matou a marretadas após uma discussão em casa. À noite, colocou o corpo da mulher no porta-malas do veículo e o enterrou próximo a uma fazenda.
A família de Tatiana chora a perda. “Ainda nem acordei. Para mim, ela viajou e vai voltar um dia. Ele ‘judiava’, mas ela ficava guardando (o sofrimento), porque sabia que se falasse para a família a gente ia se meter”, disse uma tia, a telefonista Francisca Rodrigues da Silva, 50 anos. Ela conta que a sobrinha tinha medo do companheiro. “Eles estavam havia três meses separados e ela não queria mais manter o relacionamento. Mas, de tanto insistir, aceitava manter relações sexuais após a separação. Algumas vezes, ela comentou com a mãe dela que tinha medo de largá-lo com medo de ele fazer algo pior.”
“Vivo com medo”
As estatísticas mostram, no entanto, que as mulheres têm se encorajado a denunciar. Desde 2006, por conta da Lei Maria da Penha, o número de inquéritos policiais pulou de 66, no primeiro ano de vigência, para 3.086, até julho de 2011. Nas unidades policiais do DF, os registros passaram de 5.294, em 2010, para 6.069 em 2011, com aumento de 775 casos. Rita*, 30 anos, está entre as vítimas que procuraram a delegacia para denunciar a violência dentro de casa. Ela relatou o drama vivido na Deam no fim de 2011.
Há um ano, ela conheceu um homem que alterou o rumo de sua vida. A marca física que ficou é a cicatriz de uma facada durante um dos surtos de ciúme do namorado. As consequências foram além disso. Hoje, ela não tem mais emprego, trancou a faculdade e mantém a calma à custa de remédios controlados. “Eu vivo com medo e fugi dele em um momento de desespero total. Por várias vezes, eu tive a certeza de que ia morrer”, contou.
Antes da facada, o companheiro a ameaçava verbalmente, dava tapas. A violência psicológica ocorria diariamente. “Ele brincava com a faca no meu pescoço. Eu tremia tanto que achei que eu mesma pudesse me ferir, com a arma tão perto de mim. O rosto dele era de ódio”, recorda. A mulher ainda diz amar o ex-companheiro, mas não pretende dar mais chances a ele.
Fonte: Correio Braziliense
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