Por maioria de votos, a Segunda Turma do Supremo Tribunal
Federal (STF) concedeu um Habeas Corpus (HC 115729) para trancar ação penal que
tramita na 17ª Vara Federal Especializada Criminal da Seção Judiciária da Bahia
contra A.B.Q., operador de uma rádio comunitária no Município de Camaçari (BA).
Ele foi denunciado pela prática do delito previsto no artigo
183 da Lei 9.472/97, que prevê detenção de dois a quatro anos e multa de R$ 10
mil para quem desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicações.
Inicialmente, a denúncia foi rejeitada pelo magistrado de primeiro grau, que
aplicou ao caso o princípio da insignificância. No entanto, o Ministério
Público Federal recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que
deu provimento ao recurso para determinar o retorno dos autos à origem para o
prosseguimento da ação penal.
Voto
O relator do caso, ministro Ricardo Lewandowski, apresentou
o voto condutor do julgamento e concedeu a ordem para trancar o processo contra
o denunciado. O ministro destacou que uma perícia efetuada pela própria Anatel
(Agência Nacional de Telecomunicações) constatou que o serviço de radiodifusão
utilizado pela emissora não possuía capacidade de causar interferência
prejudicial aos demais meios de comunicação, o que demonstra que o bem jurídico
tutelado pela norma, ou seja, a segurança dos meios de comunicação, permaneceu
incólume.
Lewandowski citou
exemplo de rádios que atuam em São Paulo e que chegam a interferir na torre de
controle e comunicações dos pilotos de aeronaves em razão da proximidade com o
aeroporto, mas ressaltou que este não é o caso da rádio baiana, que nem mesmo
interfere na frequência das rádios oficiais.
O relator observou ainda que a rádio comunitária era operada
com o objetivo de evangelização por meio de programas religiosos e prestação de
serviços sociais. Para o ministro, essa situação já demonstra a “ausência de
periculosidade social da ação e o reduzido grau de reprovabilidade da conduta
imputada ao paciente”. Com isso,
concedeu o HC para trancar a ação penal, mas frisou que uma possível
apuração dos fatos atribuídos a A.B. poderá ser feita na esfera administrativa,
no âmbito da Anatel, por exemplo, que poderá até mesmo apreender os
equipamentos, “mas do ponto de vista penal estou entendendo que é
insignificante a ação tida como criminosa por parte do paciente”, afirmou.
Seu voto foi acompanhado pelo ministro Celso de Mello e pela
ministra Cármen Lúcia. O ministro Celso destacou que tramita no STF uma Ação
Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que questiona a regra que impede que
determinadas rádios comunitárias desenvolvam atividade de proselitismo e a
questão foi colocada sob a perspectiva da liberdade religiosa.
“Seria lícito ao poder público, mediante lei, interferir
nesta livre circulação de ideias, ainda que se cuide de um serviço público
concedido? Poderia a União impor essa restrição e impedir a propagação de
ideias religiosas?”, questionou o ministro ao destacar que esse é um tema
“muito interessante”. No caso analisado, o ministro afirmou que consideradas as
circunstâncias indicadas no processo, “estamos diante de um fato
insignificante”.
A ministra Cármen Lúcia, por sua vez, destacou que concede a
ordem apenas porque diante dos fatos relatados no processo, não haveria nenhuma
lesividade que pudesse configurar prejuízo penal para a sociedade.
Divergência
O ministro Teori Zavascki foi o único a divergir e ressaltou
que nesta fase de análise do processo não é possível debater o conteúdo da
programação da rádio, pois só é possível avaliar a partir das informações do
processo. E, de acordo com o ministro Teori, não é possível conceder o HC sem
atacar a própria norma tipificadora (a lei que prevê o crime).
“Aparentemente, aplicar o princípio da insignificância nesse
caso, representa descriminalizar a própria conduta tipificada como crime”,
afirmou.
Processos relacionados
HC 115729
HC 115729
Fonte: Site do STF
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