O “Caso Eliza Samúdio” é bastante propício para reflexões de natureza jurídico-penal. Por isso mesmo o blog “profeanaclaudialucas” tem dedicado algum espaço a esse episódio.
A polêmica mais recente gravita na órbita da competência do Juízo para apuração da responsabilidade penal dos acusados. A imprensa noticiou, dias trás, sobre a impetração, por parte da defesa, de uma Exceção de Incompetência “ratione loci”, ou seja, em razão do local da consumação do crime. De acordo com os advogados do goleiro Bruno, a morte teria ocorrido em Vespasiano, devendo o processo, portanto, ser conduzido por um Juiz dessa Comarca e não da Comarca de Contagem como vem ocorrendo, sob pena de haver violação ao princípio do Juízo Natural, previsto no artigo 5º, inciso LIII, da Constituição Federal.
No entanto, essa não é a única discussão sobre competência que é pertinente nesse caso. Há outro ponto a respeito de competência que poderá ser suscitado - mas em outro momento processual - e que poderá pretender a mitigação do Princípio do Juiz Natural, agora sustentado pela defesa. Trata-se do instituto do desaforamento. Vejamos:
Embora a Constituição Federal disponha que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente e essa competência esteja fixada na legislação processual penal pelos mais diversos critérios - em razão da matéria, em razão do local, pela quantidade de pena etc – quando ela for do tipo ‘ratione loci’ (quanto ao local da infração) e for relativa à crimes dolosos contra a vida, não pode ser compreendida como absoluta.
Isso porque o Juízo Natural para julgamento dos autores de crimes dolosos é o Tribunal do Júri (art. 5º, inciso XXXVIII, da CF), e como esse Tribunal é composto por pessoas do povo, criou-se um instrumento para resguardar a imparcialidade dos jurados, denominado 'desaforamento'. Esse instituto permite a prorrogação da competência, ou seja, autoriza que o autor de um crime doloso contra vida seja julgado em um foro diferente do local onde o crime ocorreu. Destaque-se que o desaforamento só tem lugar no momento do julgamento em plenário, ou seja, deve ocorrer após a sentença de pronúncia, oportunidade na qual o Juiz de Direito entrega o réu para ser julgado por seus pares.
De acordo com os artigos 427 e 428 do CPP, poderá ser determinado o desaforamento sempre que o interesse da ordem pública o reclamar ou houver dúvida sobre a imparcialidade do júri ou a segurança pessoal do acusado, bem como em razão do comprovado excesso de serviço.
Em algumas das hipóteses previstas na legislação o que se busca é afastar o acusado da animosidade excessiva existente contra ele em uma determinada cidade.
Mas como proceder quando essa animosidade se estende – ou é capaz de se estender – para o país inteiro, como sucede neste caso do goleiro Bruno? É possível que se diga que a repercussão do caso é menor aqui em Pelotas do que lá em Vespasiano ou em Contagem?
Eis ai uma boa discussão, não restrita ao Caso Eliza Samúdio, mas a todos os que têm repercussão nacional.
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