Como forma de garantir
o direito de acesso universal à Justiça, a Quinta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) concluiu que a Defensoria Pública pode representar,
concomitantemente e por meio de defensores distintos, as vítimas de um delito e
os réus do mesmo processo.
O colegiado chegou à
decisão após analisar recurso em mandado de segurança interposto por
consumidores de baixa renda que investiram valores a partir de R$ 4,9 mil como
sinal para compra de apartamentos em projetos imobiliários que não apresentavam
projetos de construção, alvará e registro.
Segundo os autos, a
Defensoria Pública ingressou com ação civil pública para verificar a existência
de patrimônio em nome dos réus para reparar os danos causados aos consumidores.
Os consumidores também
pediram habilitação para atuarem como assistentes de acusação, representados
por defensor público, em ação penal movida contra os réus, que teriam cometido
estelionato, associação criminosa e crime contra a economia popular, conforme o
artigo 65 da Lei 4.591/64.
Atribuições
O Tribunal de Justiça
de Santa Catarina (TJSC) negou o pedido sob alegação de que a atuação como
assistente de acusação não consta entre as atribuições da Defensoria Pública de
Santa Catarina (DPSC).
Para o TJSC, não seria
necessária a atuação da DP no caso porque o Ministério Público, ao conduzir a
ação penal pública, já atua em nome do Estado buscando a responsabilização do
réu.
Perante o STJ, os
consumidores alegaram ser equivocada a afirmação de que a Defensoria Pública
não pode representar as vítimas como assistente de acusação. Também
argumentaram não haver a exigência de normas regulamentares no âmbito da DPSC,
pois o artigo 268 do Código de Processo Penal garante o direito da vítima de
ingressar como assistente de acusação.
Os consumidores
ressaltaram ainda que o artigo 4º, inciso XV, da Lei Complementar 80/94
estipula que a Defensoria Pública tem atribuição de patrocinar ação penal
privada e ação subsidiária da pública, o que legitima a atuação do órgão como
assistente de acusação.
Além disso, a
Constituição Federal, no artigo 5º, inciso LXXIV, estabelece que cabe ao Estado
o dever de prover a assistência jurídica integral e gratuita às pessoas pobres.
Função constitucional
O relator do processo
no STJ, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou que o rol de
prerrogativas, direitos, garantias e deveres da DP estão elencadas na
Constituição Federal, no Código de Processo Penal, na Lei 1.060/50 e na Lei
Complementar 80/94. Portanto, não haveria necessidade de especificar a atuação
do órgão em disposição regulamentar estadual.
Ainda que não houvesse
disposição regulamentar estadual autorizando expressamente a atuação da
Defensoria Pública como assistente de acusação, tal autorização derivaria tanto
da teoria dos poderes implícitos, quanto das normas legais e constitucionais já
mencionadas,todas elas concebidas com o escopo de possibilitar o bom desempenho
da função constitucional atribuída à Defensoria Pública, ressaltou Reynaldo
Soares da Fonseca.
Em seu voto, o relator
também reconheceu o direito dos consumidores de se habilitarem como assistentes
de acusação na ação penal.
Têm razão os
recorrentes quando defendem não existir empecilho a que a Defensoria Pública os
represente e represente também alguns dos réus, no mesmo feito, pois tal
atuação não configura conflito de interesses. Situação similar ocorre quando o
Ministério Público atua como parte no feito e, ao mesmo tempo, como custos
legis, podendo oferecer manifestações divergentes a respeito da mesma causa,
sem que isso implique conflito de interesses ou nulidade, concluiu.
Processo(s): RMS 45793