A 11ª Câmara Cível do TJ do Rio condenou ontem (dia 14 de dezembro) a Sony Music a pagar uma reparação por danos morais a entidades de combate à discriminação racial, por causa da divulgação da música "Veja os Cabelos Dela", cantada por Francisco Everardo Oliveira Silva, o Tiririca.
A indenização, equivalente ao que foi arrecadado com a divulgação da música, será revertida para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, que desenvolverá programas contra o preconceito racial. O valor será apurado em liquidação de sentença. As partes estimam - em posições antagônicas - que o valor indenizatória vá fixar entre R$ 650 miç e R$ 1,3 milhão.
Os desembargadores consideraram a letra da música ofensiva à mulher negra e negaram provimento, por maioria de votos (4 a 1), ao recurso da Sony.
A relatora, desembargadora Marilene Melo Alves, foi acompanhada em seu voto pelo revisor, desembargador Cláudio de Mello Tavares, e pelos desembargadores José Carlos de Figueiredo e Luiz Eduardo Rabello, presidente da Câmara.
O desembargador Paulo Sergio Prestes foi voto vencido. A música, de autoria de Tiririca, em determinados trechos dizia: "Veja, veja, veja os cabelos dela / Parece bombril de ariar panela / Quando ela passa, me chama atenção / Mas os seus cabelos não têm jeito não / A sua catinga quase me desmaiou / Olha eu não aguento o seu fedor...".
Segundo os desembargadores, a Sony lamentavelmente não fez a análise da obra antes de adquirir os direitos autorais. A relatora classificou o texto de "chulo e inapropriado para o contexto sócio-cultural brasileiro". Ela avaliou que "a conduta foi, senão discriminatória, altamente ofensiva, ao comparar pejorativamente o cabelo da mulher negra a uma esponha Bombril".
A magistrada ressaltou também que, embora jocosa e feita para uma pessoa determinada - a Sony alegou que Tiririca compôs a música para sua esposa -, "não há como deixar de associar a música a todos as mulheres da raça negra e principalmente às crianças".
O acórdão dispõe que "a música é ofensiva às crianças em formação, uma vez que suas características são depreciadas com expressões pejorativas, prejudicando a formação da juventude brasileira".
A relatora disse ainda que "não importa se a música foi criada para uma pessoa específica, porque a obra artística tem vida própria que transcende ao contexto em que foi criada".
O revisor, desembargador Cláudio de Mello Tavares, destacou que em nenhum momento verificou que a música destinava-se à companheira de Tiririca. Segundo ele, "qualquer pessoa negra, estando numa festa, vai sentir dor, tristeza, amargura quando ouvir esta música".
Ele comparou que cabe a reparação por dano moral e sugeriu que a decisão sirva de exemplo para as outras gravadoras. "É devida a reparação por dano moral para que a gravadora Sony e as outras gravadoras avaliem antes de colocar este tipo de música no mercado", concluiu.
O desembargador José Carlos de Figueiredo afirmou que não viu conotação racista do compositor e da Sony, mas reconheceu que o texto é chulo e de profundo mau gosto. "Ele não teve o ânimo de ser racista, mas foi - e a divulgação e repercussão foram racistas e humilhantes", disse. Os embargos infringentes foram interpostos pela Sony contra o Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (CEAP), Instituto de Pesquisas das Culturas Negras (IPCN), Grupo União e Consciência Negra do Rio de Janeiro, Instituto Palmares de Direitos Humanos (IPDH) e Criola.
A ação civil pública do CEAP foi proposta na 33ª Vara Cível da capital, que julgou improcedente o pedido. O CEAP apelou e a 16ª Câmara Cível reformou, por dois votos a um, e condenou a Sony Music.
Por causa de um voto divergente, a gravadora entrou com embargos infringentes julgados ontem. (Proc. nº 0032791-25.1997.8.19.0001).
Fonte: Site Espaço Vital
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