A aprovação de projetos que criminalizam as ações de
movimentos sociais é um retrocesso, afeta direitos garantidos pela
Constituição, como o de greve e o de livre manifestação, e poderá gerar presos
políticos em plena vigência do regime democrático brasileiro.
Esse foi o alerta
feito por participantes da audiência pública realizada na quinta-feira (22)
pela Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). Tramitam no
Senado propostas que buscam penalizar pessoas ou grupos que gerem “pânico ou
perigo à integridade da comunidade ou de prédios públicos”, legislação que
afetaria, por exemplo, movimentos liderados por sindicatos e trabalhadores em
greve ou entidades da sociedade civil.
Pelo texto do Projeto de Lei do Senado
(PLS) 508/2013, do senador Armando Monteiro (PTB-PE), os líderes poderiam ser
presos e enquadrados como terroristas. Essa proposta está na Comissão de
Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). Outro projeto, o PLS 499/2013, que
define os crimes de terrorismo, só não foi votado em Plenário devido à
articulação do senador Paulo Paim (PT-RS).
Violência da polícia
Para José Maria de Almeida, representante da Central
Sindical e Popular (CSP Conlutas), atualmente os movimentos sociais já vem
sofrendo com o aumento da violência das polícias contra os manifestantes, o
desrespeito aos direitos de greve e de manifestação e os assassinatos nas
periferias, além da instauração de inquéritos responsabilizando os líderes desses
movimentos. O quadro piorará se tais propostas forem aprovadas, opinou.
O
sindicalista citou a responsabilidade do governo pela onda de manifestações,
que deixou de oferecer à população serviços decentes em educação, saúde e
segurança, e por isso agora se revolta e toma as ruas.
Também criticou a falta
de diálogo e negociação com os movimentos grevistas. Conforme dados
apresentados por ele, houve um recrudescimento da repressão e da criminalização
de dirigentes e ativistas militantes de maneira alarmante desde as
manifestações de junho do ano passado até agora. Já foram mais de dois mil
presos e destes, 370 respondem a inquéritos.
Desse modo, argumentou, pessoas
que organizaram manifestações para reduzir o valor dos transportes no Rio
Grande do Sul, por exemplo, poderão ser presas acusadas de cumplicidade numa
quadrilha organizada para promover depredações e furtos, e pegar até 20 anos de
cadeia. —Vão ser presos porque lideraram uma manifestação para baixar o preço
da passagem de ônibus. Isso é ser preso político – disse José Maria.
Quebradeiras
Segundo explicou
José Maria, as quebradeiras e destruições promovidas durante as passeatas criam
um clima político que interfere na legitimidade dos movimentos sociais.
Ele
criticou a Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013), que dá a liberdade
para as polícias, por exemplo, infiltrarem policiais nas manifestações, e
insinuou que os quebra-quebras poderiam até mesmo não ser feitos pelos Black
Blocs, como costumeiramente se acusa, mas sim em ação semelhante ao atentado do
Riocentro, durante a ditadura, protagonizado pelos próprios militares para
culpar os manifestantes.
José Maria defendeu até mesmo a desmilitarização da
Polícia Militar e ressaltou não concordar com o modo de operação dos Black Blocs.
- Polemizamos com Black Blocs por uma forma de luta que a nosso ver não ajuda,
mas não é possível responsabilizar os companheiros pela violência que ocorre
nas mobilizações – disse.
Desmoralização Matheus Gomes, membro da direção da
Assembleia Nacional de Estudantes Livres (Anel) é um dos investigados, junto
com outros cinco estudantes que, na opinião dele, estão sofrendo um processo de
tentativa de desmoralização, por parte da Polícia Civil do Rio Grande do Sul e
da Justiça.
Segundo afirmou, os policiais utilizam “gestos arbitrários e
acusações falsas” para embasar os inquéritos e comprometer os organizadores das
manifestações como mentores intelectuais de desordens e roubos ocorridos e
sobre os quais não tiveram responsabilidade.
Ele citou ainda os abusos
cometidos pelas autoridades policiais, com detenções acompanhadas de violência
física e psicológica, especialmente contra mulheres e jovens negros da
periferia que sofrem todo tipo de humilhação.
E enquanto centenas de
organizadores dos protestos respondem a processos, nenhum policial é
investigado por abusos cometidos, lembrou.
Já a representante da Secretaria de
Direitos Humanos, Deise Benedito, defendeu o direito de manifestação e
organização, importante para a construção da democracia brasileira e que foi
assegurada na Constituição por força dos próprios movimentos sociais.
Segundo
disse, é inadmissível que pessoas tenham os direitos cerceados, mas isso também
as faz responsáveis por não permitir violações de direitos humanos. - Todos têm
direito de ir para as ruas, mas todos têm também a responsabilidade.
Sei que se
vocês virem indivíduo quebrando patrimônio público, acredito que a mesma
legitimidade que os leva à rua é a de pedir que essa pessoa se retire da
manifestação – opinou.
O senador Paulo Paim, que presidiu a reunião, também se
manifestou contra a promoção do vandalismo durante as manifestações - Sempre
dei apoio aos movimentos sociais, mas não concordo com o quebra-quebra.
Tenho
certeza q essa não é a linha do movimento – opinou o senador.
Ele prometeu
realizar mais uma audiência pública sobre o tema, com a presença de
representantes da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e do Ministério da
Justiça, que não compareceram a reunião desta quinta. A intenção é convidar
alguém que responda pelo aparato policial do país, além de representantes das
centrais sindicais, ainda antes da Copa do Mundo.
Fonte: Senado Federal
Um comentário:
É fácil ser politicamente correto, o difícil é ser justo. Aceitar toda essa desordem, quebra-quebra, incêndio de ônibus e outras agressões a pessoas e ao patrimônio, por pessoas com o rosto encoberto, tudo isto em nome de um direito a manifestação, isto sim é um retrocesso.
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