Antes da reforma do Título VI do Código Penal Brasileiro pela Lei 12.015/2009 os crimes contra a liberdade sexual eram todos de ação penal privada, em regra geral, submetendo-se à ação penal pública incondicionada os que fossem praticados com abuso do poder familiar, ou da qualidade de padrasto ou madrasta, tutor e curador, e aqueles dos quais resultassem lesão corporal de natureza grave ou morte; e de ação penal pública condicionada à representação da vitima quando esta, por sua condição de pobreza, não pudesse prover as despesas do processo sem prejuízo próprio ou da família.
A nova redação dada ao artigo 225 do Código Penal Brasileiro foi muito mais singela, sendo que hoje, conforme estabelece o dispositivo legal, nos crimes definidos nos capítulos I e II do Título VI - dentre eles o estupro – a ação penal é pública condicionada à representação da vítima, sendo, entretanto, de ação penal pública incondicionada aqueles que vitimizam pessoas menores de 18 anos ou vulneráveis (menores de 14 anos, pessoas enfermas ou deficientes mentais, e incapazes de oferecer resistência).
Portanto, não mais se pode considerar a ação penal privada para os crimes sexuais, salvo aqueles que tenham sido cometidos antes da entrada em vigor da lei 12.015, em 07 de agosto de 2009.
Nesse novo contexto, é de perguntar-se se, de fato, para o crime de estupro do qual decorre lesão corporal de natureza grave ou morte a ação penal deve ser a pública condicionada à representação, ou a gravidade deste resultado (lesão grave ou morte) é suficiente para que se exija ação penal pública incondicionada?
No que respeita ao crime de estupro, a seguir-se o artigo 225, a ação penal, mesmo que do crime decorra resultado mais grave – lesão grave ou morte – deve ser pública condicionada à representação da vítima.
Contudo, teria sido essa a “intenção” legislativa, ou essa situação decorre de um disparate da legislação?
Quer parecer que a falha ocorreu em face da revogação do artigo 223 do Código Penal Brasileiro, que não integrava os capítulos I, II e III do Título VI do diploma legal em comento, não estando, portanto, sujeito ao anterior preceito do artigo 225. Antes da reforma promovida pela Lei 12015/09, como já se disse, havendo lesão grave ou morte decorrente do estupro, a ação penal era pública incondicionada.
Ora, partindo do pressuposto de que houve falha legislativa, e de que seja razoável que a ação penal no crime de estupro qualificado pelo resultado lesão corporal grave ou morte consista em ação penal pública incondicionada é de utilizar-se, para subsidiar essa postura, o artigo 101 do Código Penal Brasileiro, que trata da ação penal em crime complexo. O estupro, sem dúvida alguma, é crime complexo, particularmente quando seguido de lesão grave ou morte. Por isso mesmo, se um dos seus elementos - lesão grave ou morte – permite ação penal pública incondicionada, a ação penal deve se dar por iniciativa do Ministério Público, através de ação penal incondicionada, tal como preceitua o referido dispositivo penal.
Matéria interessante para o debate, que certamente será consolidada tanto pela doutrina, quanto pela jurisprudência.
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