Mãe e pai são principais 'violadores' dos direitos da
criança e adolescente.
Bernardo Boldrini, 11, procurou juiz para trocar de família
antes de morrer.
A negligência familiar é a campeã de denúncias sobre
violações de direitos fundamentais de crianças e adolescentes no país. Dos pelo
menos 28.465 casos de problemas de convivência familiar e comunitária levados
aos Conselhos Tutelares no ano passado, 13.218 relatavam negligência dos pais.
O dados são do Sipia (Sistema de Informações para Infância e
Adolescência), sistema nacional do governo federal que reúne as queixas de
4.945 dos 5.924 Conselhos Tutelares existentes em municípios e estados.
O Conselhos Tutelares são responsáveis por receber e apurar
denúncias sobre violações dos direitos da criança e do adolescente, que incluem
maus-tratos, crianças fora da escola, trabalho e prostituição infantil ou do
adolescente.
Os dados mostram que o número de casos de negligência dentro
das famílias vem aumentando desde 2011. Apenas em 2014, foram apresentadas
3.031 denúncias aos conselhos (veja tabela ao lado).
A mãe é apontada como violadora em 33,5% das notificações, e
o pai, em 20,6%. Em seguida aparecem a creche, com 11,21% dos casos, e a
escola, com 6,83%.
A discussão sobre negligência ganhou força após a morte do
menino Bernardo Uglione Boldrini, de 11 anos, no Rio Grande do Sul. Ele se
queixava de abandono familiar – pela morte da mãe, em 2010, e pela ausência do
pai, o médico Leandro Boldrini – e chegou a procurar o Judiciário para trocar
de família. O pai, a madrasta e uma assistente social amiga do casal estão presos
por suspeita de envolvimento no crime.
Como mostrou reportagem do G1, denúncias de crianças e
adolescentes relatando a negligência de pais e responsáveis têm aumentado a
cada ano no Brasil e já superam as de violência física e sexual no Disque 100
da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
Dificuldade de punir
No dicionário, negligência quer dizer desleixo, descuido,
desatenção, menosprezo, preguiça, indolência. Mas nem o Estatuto da Criança e
do Adolescente (ECA) nem o Código Penal a tipificam (apontam a conduta
criminosa).
“O ECA e a
Constituição tratam da negligência, porém, não há uma tipificação penal, nem no
ECA, nem no Código Penal e ninguém pode ser punido, exceto se o caso se
configurar como maus-tratos ou abandono de incapaz, previstos no Código Penal”,
afirma o advogado Ariel de Castro Alves, membro do Condeca (Conselho Estadual
dos Direitos da Criança e do Adolescente) e fundador da Comissão Especial da
Criança e do Adolescente do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do
Brasil) de São Paulo.
O estatuto só prevê penas de multa em casos de pais que
descumprem os deveres do poder familiar, como sustento, guarda e educação dos
filhos.
Um projeto de lei do senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) prevê
alterar o ECA para incluir o abandono moral como ilícito civil e penal, mas
está parado desde 2007.
Conforme o projeto, "compete aos pais (...) prestar aos
filhos assistência moral, seja por convívio, seja por visitação periódica, que
permitam o acompanhamento da formação psicológica, moral e social da pessoa em
desenvolvimento".
O autor da negligência passa a ser sujeito a pena de
detenção de 1 a 6 meses, e o juiz poderá aplicar medida cautelar para
afastamento do agressor da moradia. “Tem vezes que o pai abriga, dá comida,
casa, mas despreza, humilha, bate. Trata o filho como peso”, afirma o senador.
“Muitas vezes a negligência é tratada com menos relevância
por não deixar marcas aparentes, mas tudo começa pela negligência. É claro que
a maioria das vítimas não são assassinadas de forma tão cruel como o menino
Bernardo, mas a negligência é um primeiro sinal de alerta com relação ao
possível risco que a criança sofre”, completa Alves.
Fonte: Site G1
Comentário meu: o que a pesquisa revela sobre a negligência familiar liderar o ranking de violações nos Conselhos Tutelares, obriga a que a rede de proteção a criança e ao adolescente seja cada vez mais atenta, cada vez mais cuidadosa e diligente no trato às demandas das crianças e dos jovens. Daí resultar uma necessidade ímpar de qualificação pessoal e estrutura dos órgãos protetivos, mas sobretudo, do compromisso 'das gentes', ou seja, das pessoas que atuam nesses setores, promotores, juízes, conselheiros tutelares, assistentes sociais e toda a sociedade civil.
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