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domingo, maio 16

O tipo culposo - Agir descuidado, previsibilidade, previsão e resultado

Outro dia, nas turmas em que leciono a disciplina de Prática do Processo Penal, propus uma tarefa que consistia na elaboração de petição “resposta do acusado”, em face de processo penal originado por denúncia pela prática de crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor.

O caso hipotético oferecido versava sobre situação de morte no trânsito, decorrente de culpa exclusiva da vítima, eis que a condutora causadora do atropelamento dirigia o veículo observando todo o dever de cuidado exigível nesta atividade. Por isso mesmo, o fundamento para a absolvição sumária que se impunha estava no artigo 397, inciso III do Código de Processo Penal, ou seja, o fato a ela atribuído não caracterizava infração penal.

Alguns alunos tiveram dúvidas sobre o motivo para esta alegação, o que acabou por instigar-me a escrever sobre os elementos que constituem o chamado crime culposo, a partir da explicação que lhes dei verbalmente.

O tipo culposo tem uma estruturação muito diversa daquela que existe no tipo doloso, sendo elementos constitutivos desse tipo legal de crime:

a) a inobservância de um cuidado objetivo;
b) a produção de um resultado não desejado;
c) a previsibilidade objetiva do resultado;
d) a previsão (em se tratando de culpa consciente).

Por isso mesmo se pode dizer que no crime culposo há uma conduta voluntária com a produção de um resultado involuntário.

A inobservância de um cuidado objetivo é a falta do cuidado, ou seja, o descumprimento de um dever objetivo de cuidar, que consiste em reconhecer a existência de um perigo para o bem jurídico protegido, preocupando-se com as possíveis conseqüências que uma conduta descuidada pode determinar-lhe.

O segundo elemento – a produção de um resultado não desejado – também integra o tipo culposo. Esse resultado decorre do agir descuidado, negligente, imprudente e imperito. Justo porque o resultado integra o tipo culposo, não há crime culposo quando o resultado lesivo não advier. Por isso, se uma norma de cuidado for desobedecida, se uma ação for descuidada, temerária, mas não houver resultado, não há delito culposo, por falta de tipificação.

O terceiro elemento na culpa é a exigência de que o resultado seja objetivamente previsível. Ou seja, nos crimes culposos, o resultado deve decorrer de uma possibilidade, ou seja, de uma previsibilidade. Para as condutas das quais resultem conseqüências lesivas totalmente fortuitas, não se pode atribuir a qualidade de serem culposas, pela total aleatoriedade do resultado. A previsibilidade, como segundo elemento da culpa, evidencia que o resultado, embora involuntário, poderia ser previsto pelo agente. Não havendo previsibilidade se estaria nos limites alheios da culpa, no terreno do caso fortuito ou da força maior.

A previsibilidade é um dado objetivo; assim, quando alguém não prevê o dano ou o perigo, quando lhe era possível fazê-lo, o afastamento da culpa não existe. Por isso, se diz, a culpa reside, exatamente, na falta de prever o previsível. Se o previsível não era possível ao agente, não se pode falar em culpa. Em outras palavras, sendo imprevisível o resultado, não há falar-se em culpa.

A previsão, o quarto elemento integrante do agir culposo ocorre quando o agente pré-enxerga, prevê o resultado, significa dizer, em agindo com descuido e tendo a possibilidade de prever o resultado, o agente o prevê, mas acredita, firmemente que ele não ocorrerá, superestimando a sua capacidade de evitar o resultado.

Este elemento está presente apenas nos tipos culposos conscientes, não integrando o crime culposo, por culpa inconsciente, hipótese em que, estando presentes os três primeiros elementos do tipo culposo o agente acaba por dar causa a um resultado sequer previsto, muito embora lhe fosse possível prever.
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2 comentários:

Anônimo disse...

Suas considerações são excelentes. Vão direto ao ponto e são muito claras.

Unknown disse...

Estou estudando sobre culpa e amei sua explicação, super clara!! Tirou todas as minhas dúvidas!!! Obrigada!!!