Ao revelar os nomes dos delinquentes que mais dão trabalho aos policiais gaúchos, um levantamento da Brigada Militar escancara uma chaga na segurança pública: a reincidência sem fim de criminosos, facilitada pela fragilidade nos albergues. O estudo mostra que, em menos de três anos, pelo menos 61 apenados dos regimes aberto e semiberto escaparam duas vezes de albergues e foram recapturados em outros dois crimes no Rio Grande do Sul. Quatro dos mais frequentes fujões foram pegos até quatro vezes em flagrante nesse período.
Diferentemente do que se possa imaginar, os campeões da reincidência não são sequestradores, bandidos sanguinários, quadrilheiros ou assaltantes de carros-fortes. São autores de pequenos roubos e crimes de menor potencial ofensivo como receptação, furtos e estelionatos. Sem apoio de facções criminosas para “desaparecer do mapa”, eles logo são recapturados pela polícia.
O caso mais notório é o de Deverson Luís de Azevedo, o Alemão, 39 anos, de Caxias do Sul. Entre idas e vindas a presídios e albergues, ele foi detido quatro vezes desde março de 2009 – em 10 anos, foram 40 indiciamentos por golpes (veja texto ao lado).
O tráfico de drogas aparece como outro delito comum entre os reincidentes. Em Porto Alegre, é o tipo de crime com mais alto índice de recorrência entre os 13 indicadores que fazem parte da estatística oficial da Secretaria da Segurança Pública.
Estudo do Comando de Policiamento da Capital indica que 92% das pessoas (sem considerar foragidos) presas em flagrante mais de uma vez são vendedoras de entorpecentes, especialmente o crack (veja, na página ao lado, a relação de cinco dos mais reincidentes neste ano em Porto Alegre).
– Tem gente que só sabe viver do delito, não consegue se ressocializar. Cada um deles que volta ao crime é mais retrabalho para BM, Polícia Civil, Susepe, Judiciário. Gastamos recursos que poderiam ser investidos em outras necessidades – lamenta o coronel João Carlos Trindade, comandante-geral da Brigada Militar (BM).
Estado registra média de 20 fugas por dia
O refluxo às ruas de foragidos e presos provisórios há tempos provoca controvertidos debates. Um dos raros pontos de convergência é que as deficiências no regime semiaberto contribuem para a situação, ao abrir caminho para uma média diária de 20 fugas, a se levar em conta o balanço do ano passado da Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). O próprio governo reconhece o problema e promete amenizá-lo com a construção de novas unidades nos próximos meses.
A polêmica começa quando se discutem outras faces da situação. O promotor Fabiano Dallazen, coordenador do Centro de Apoio Criminal do Ministério Público estadual, reclama da frouxidão da lei e da complacência da Justiça ao liberar presos por causa da superlotação dos albergues. Autoridades policiais fazem coro às críticas contra uma parcela de magistrados.
– É uma questão de interpretação da lei. Alguns juízes são mais benevolentes, outros têm a mão mais pesada. Nosso sentimento em relação à lei para o usuário de drogas, por exemplo, é de que estamos enxugando gelo. Deveria ser mais severa – diz o delegado Luís Fernando Martins Oliveira, do Denarc.
O desembargador Túlio Martins, presidente do Conselho de Comunicação do Tribunal de Justiça, considera compreensível quando um policial se queixa do vaivém de presos. Para ele, as reclamações só diminuirão quando houver uma revisão na legislação.
– O Congresso é que formula as leis. Se há um clamor por regras mais severas, as pessoas devem votar em quem pensa dessa forma – defende o magistrado.
(Fonte: Zero Hora)
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