Na última quinta-feira, 04 de agosto, foram iniciadas as atividades do Curso de Pós-graduação “Doutrina Geral da Infração Criminal Revisitada”, que é uma realização do IBCCRIM em parceria com o Instituto de Direito Penal Económico, da conceituada Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Como o próprio nome alude, conceitos fundamentais da infração criminal serão tratados por renomados professores portugueses e brasileiros, considerando o atual panorama jurídico-penal.
As três aulas inaugurais, com o tema “A aplicação do Direito Penal no espaço e a revisão da territorialidade”, foram brilhantemente ministradas pela Professora Doutora Anabela Miranda Rodrigues, que é Diretora da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, membro do Conselho Superior da Magistratura e foi diretora do Centro de Estudos Judiciários de 2004 a 2009.
Os estudos sobre a aplicação do Direito Penal no espaço, assim como a revisão da ideia de territorialidade, devem-se ao advento do Tratado de Lisboa, o qual alterou os dois principais tratados da União Europeia (Tratado de Maastricht e Tratado de Roma). Em vigor desde dezembro de 2009, o referido tratado introduziu significativas modificações no quadro jurídico europeu, como a admissão da personalidade jurídica da União Europeia (UE), a simplificação do processo de decisão do Conselho Europeu, o reforço dos direitos dos cidadãos europeus e a mudança no conceito de cidadania, entre tantas outras disposições.
Tais mudanças incidiram no tratamento de questões afetas ao Direito Penal (e Processual Penal) tanto no âmbito da União Europeia, como um bloco econômico, político e social, quanto em cada um dos 27 Estados-membros que o compõem. A professora Anabela destacou a importância de as legislações nacionais estarem em harmonia com o chamado “Direito Europeu”, de modo a haver certa coesão entre elas. Essa harmonização se dá, principalmente, pela transposição das chamadas Diretivas – entendidos como atos legislativos da UE – para a legislação interna de cada país.
As diretivas exigem que os Estados alcancem determinados resultados e, em matéria penal, as indicam apenas elementos mínimos constitutivos do tipo legal de crime e das sanções. Os estados permanecem autônomos para definir o que é crime em seus territórios, mas a União Europeia pode decidir que uma determinada conduta deve ser criminalizada e, neste caso, os Estados-membros da UE estão obrigados a seguir as diretivas, o que só pode ser feito através da criação ou alteração na legislação interna. A crítica direcionada às diretivas em Direito Penal diz respeito à mera fixação de parâmetros mínimos, inexistindo critérios mais específicos para tratar internamente uma conduta criminosa, o que permite a criação de tipos penais mais graves e possibilita um “direito penal excessivo” em alguns países.
A harmonização de leis no cenário europeu é fundamental, principalmente em casos de crimes transnacionais. O Tratado de Lisboa apontou taxativamente as hipóteses de intervenção, como questões atinentes ao crime organizado, terrorismo, tráfico de seres humanos, exploração sexual de mulheres e crianças, branqueamento de capitais e crimes digitais, entre outros. Vale ressaltar que o tratado foi concebido como pedra fundamental na orientação dos Estados-membros assuntos de importância supranacional (globalização, das alterações climáticas, da energia e da segurança, por exemplo).
A professora Anabela Rodrigues também expôs a problemática do conflito de jurisdições na UE e destacou o papel da EUROJUST (Unidade Europeia de Cooperação Judiciária), que é um órgão destinado ao apoio de investigações e procedimentos penais. Este organismo facilita o diálogo entre as entidades judiciais de vários países europeus, especialmente quando se trata da criminalidade transnacional e organizada.
Por fim, foi discutida a relevância do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem para a defesa de direitos humanos, entre os quais estão alguns direitos convencionais – oriundos da Convenção dos Direitos do Homem. Qualquer Estado-membro, ou mesmo cidadão, pode interpor ação por violação de um ou mais desses direitos. No entanto, o exercício do direito de recurso, como é chamado o pedido, só é possível depois de esgotadas todas as medidas cabíveis em âmbito nacional.
Destaca-se que a aproximação das legislações penais nacionais tem ocorrido no sentido de uma maior exasperação punitiva. Esse processo tem sido alvo de críticas, uma vez considerado o caráter subsidiário do Direito Penal. A professora concluiu afirmando que o “Direito penal não pode ser a panaceia da defesa dos direitos fundamentais”.
Fonte: Site do IBCCrim
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