É o que mostra um levantamento de 2003 a 2012 feito pela SAP
(Secretaria da Administração Penitenciária) a pedido da Folha.
O total, 50.108 presos, equivale a quase toda população
carcerária de Minas e preencheria 65 unidades prisionais em São Paulo --o
Estado tem 156.
O índice dos que não voltaram oscila muito durante os dez
anos. Em 2003, era de 7,5%. Em 2012, de 5,5%.
A saída temporária é um direito previsto em lei e depende de
autorização judicial. Os condenados que cumprem pena em regime semiaberto e têm
bom comportamento podem pedi-la.
Na prática, porém, quase todos os presos que estão no regime
semiaberto são colocados nas ruas. No final do ano passado, por exemplo, dos
23.254 presos no regime semiaberto, apenas sete deles não tiveram o benefício
concedido.
Para o procurador de Justiça Pedro Juliotti, grande parte
dos que não voltam o faz para cometer crimes.
É o caso de Diego Campos, 20, suspeito de matar o menino
boliviano Brayan Capcha, 5, mês passado. Condenado por roubo, ele fora
beneficiado pela Justiça com a saída do Dia das Mães.
Também foi numa dessas saídas que o preso Francisco Antonio
Cesário da Silva, o Piauí, ligado ao PCC, ordenou a morte de seis PMs em 2012,
segundo a Secretaria de Segurança Pública. Ele foi preso meses depois em Santa
Catarina.
PROJETO DE LEI
Casos com o de Brayan e Piauí levaram a senadora Ana Amélia
(PP-RS) apresentar um projeto de lei para endurecer a concessão do benefício. O
projeto deve ser voltado na Comissão de Constituição e Justiça ainda este ano.
Atualmente, a lei permite o benefício após o preso entrar no
regime semiaberto, independentemente de o detento ser ou não reincidente. No
projeto de lei, a saída temporária deverá ocorrer apenas uma vez ao ano e ser
concedida somente aos primários.
Ana Amélia admite que as prisões são "oficinas do
crime", mas diz que o projeto responde ao "sentimento de
impunidade" da população. "O pessoal dos direitos humanos vai achar
que isso é muito radical, mas estou preocupada com a população, com as pessoas
que estão reféns do crime."
O comandante-geral da PM, coronel Benedito Meira, defende a
mudança da legislação e diz que a recaptura dos presos é um
"retrabalho" para a polícia. "Um dos grandes fatores que
contribuiu para essa sensação de insegurança não é a falta de policiamento, mas
principalmente a impunidade (...). E a impunidade está relacionada com a
benevolência da lei."
Segundo, o coronel, há muitos casos de detentos que cometem
crime no mesmo dia em que saem às ruas.
A ideia é corroborada pelo procurador de Justiça Pedro
Juliotti, que vai mais além ao afirmar que o benefício deveria acabar.
"Não deveríamos ter mais a saída temporária. Ela
deveria ser extinta pois não se justifica na situação de criminalidade que nós
enfrentamos", disse o procurador que, no final do passado, pediu à Justiça
que detentos comprovadamente ligados a facções, como o PCC, tivessem suas
saídas barradas. O pedido foi negado. Na ocasião, 1.478 presos (6,5% dos
beneficiários) não retornaram a prisão.
Para o coordenador do programa de justiça da ONG Conectas,
Rafael Custódio, o projeto de lei propõe o rompimento do modelo progressivo do
cumprimento de pena adotado no país--que prevê o retorno do preso ao convívio
social gradativamente.
"Esse modelo deve ser fortalecido e melhorado. Não é o
caso de regredirmos nessa discussão", disse. Entre suas características
estão a concessão do regime semiaberto e as saídas temporárias após o detento
cumprir um período da pena.
"No Brasil é comum se fazer políticas públicas do
sistema prisional com base nas exceções do sistema", afirmou ao apontar a
minoria não retorna às prisões. Segundo Custódio, o projeto de lei da senadora
pode aumentar a tensão entre os presos, que já vivem em condições desumanas.
O sociólogo e professor da USP Álvaro Gullo corrobora a
ideia. Segundo ele, um dos principais fatores que contribuí para os presos não
retornarem são as condições das prisões do país.
Ele ressalta ainda que se a mudança da lei pode culminar
numa rebelião em todo o sistema carcerário. "A criminalidade não reduz com
o endurecimento das leis, mas com a melhoria das condições de vida da
população."
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