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domingo, dezembro 12

O “novo” agravo aos Tribunais Superiores(*)

Breve comentário a nova redação do art. 544, CPC - Lei n. 12.322

*Por Daniel Ustárroz
Advogado e Professor de Direito Processual Civil


O agravo na nova lei: uma apresentação.

A Lei n. 12.322 “transforma o agravo de instrumento interposto contra decisão que não admite recurso extraordinário ou especial em agravo nos próprios autos, alterando dispositivos da Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - Código de Processo Civil”.

Em síntese, foram “alterados” quatro artigos do Código de Processo Civil: 475-O (execução provisória), 544 e 545 (agravo) e 736 (instrução de embargos à execução). De substancial, a reforma atinge o art. 544, pois, nas demais hipóteses, o legislador consolida as mudanças, atualizando suas referências.

Segundo o art. 544, o agravo é interposto nos próprios autos. Elimina-se, assim, a figura do instrumento (e, espera-se, todas aquelas polêmicas relativas à correção de sua formação). O prazo de 10 dias é mantido. Tal como antes, compete a parte deduzir um agravo para cada recurso não admitido (§ 1º).

Após a intimação do agravado, para a apresentação de resposta, sobem os autos ao Tribunal Superior. A atuação do juízo a quo, nesses casos, limita-se à instrução do julgamento, uma vez que, ao contrário do especial e do extraordinário, não ocorre exame bipartido de admissibilidade no agravo.

É conhecido pelos profissionais o roteiro de julgamento do agravo nos Tribunais Superiores. Embora idealizada para ser excepcional, atualmente, a decisão monocrática transformou-se em regra. É autorizada a atuação do relator tanto na análise da admissibilidade, quanto no exame do mérito do agravo e do recurso denegado.

Nesse sentido, alude o § 4º, I, do art. 544, que o relator pode “não conhecer do agravo manifestamente inadmissível ou que não tenha atacado especificamente os fundamentos da decisão agravada”. Trata-se de uma das inúmeras exemplificações possíveis, afinal um recurso que não ataca especificamente os fundamentos da decisão agravada possui fundamentação deficiente, o que inibe seu conhecimento(1).

A complementação é dada pelo inciso II, o qual autoriza o conhecimento do agravo para: “a) negar-lhe provimento, se correta a decisão que não admitiu o recurso; b) negar seguimento ao recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal; c) dar provimento ao recurso, se o acórdão recorrido estiver em confronto com súmula ou jurisprudência dominante no tribunal.” Essas alternativas já aconteciam sob a lei anterior. E geram consequências práticas importantes, como o cabimento de embargos de divergência também contra as decisões em agravo ou a inibição da sustentação oral do advogado, quando a tese é enfrentada no agravo, ao invés do extraordinário ou especial.

Por fim, na linha do paradigma recursal do século passado, que parte do princípio de que o sistema deve sempre municiar a parte com um recurso frente a uma possível decisão equivocada, o art. 545 contempla o antigo “agravo regimental”. Ou seja, no prazo de 5 dias, compete ao sucumbente – agravante ou agravado – deduzir novo recurso, a ser apreciado pelo Colegiado. A ser seguida a praxe atual, este novo agravo permanecerá com procedimento unilateral, o que não deixa de ser estranho frente a ideia constitucional de contraditório e a principiologia recursal, pois, embora raramente, a reforma do julgado pode ocorrer.

Duas questões polêmicas

Aplicação analógica do art. 544, CPC, aos feitos de natureza criminal, trabalhista, eleitoral e militar?

Uma das primeiras questões enfrentadas pelo Supremo Tribunal Federal, com a entrada da nova lei, é definir se o regramento do Código de Processo Civil deve ser aplicado nos feitos referentes às matérias especializadas, ordinariamente regradas por normas específicas, como o debate trabalhista, criminal, militar e eleitoral.

O Supremo Tribunal Federal tentou resolver este tema, editando a Resolução nº 451.  Seu primeiro artigo reza que “a alteração promovida pela Lei nº 12.322, de 9 de setembro de 2010, também se aplica aos recursos extraordinários e agravos que versem sobre matéria penal e processual penal”. Como se vê, a norma refere-se aos feitos criminais.

É correta a orientação. Trata-se de idêntica posição adotada quando da entrada em vigor da exigência de repercussão geral no recurso extraordinário (art. 543-A e 543-B, CPC). Embora prevista no Código de Processo Civil, é certo que, tanto a repercussão geral, quanto o agravo, são mecanismos que orientam a fiscalização de constitucionalidade no plano difuso. Não há, portanto, razão para se discriminar os feitos que são oriundos de uma ou outra Corte, pois a atuação do Supremo Tribunal Federal, em qualquer recurso extraordinário, pauta-se pela atenção ao art. 102, da Constituição Federal, e pela realização dos direitos fundamentais nele discutidos.

Por tais razões, a mensagem da Resolução deve ser aplicada a todo e qualquer recurso extraordinário.

Incidência da lei nova quanto aos agravos pendentes?

Talvez a questão mais polêmica resida na possibilidade de se aplicar o novo (e melhor) regramento para o julgamento dos agravos que pendem de julgamento e que já foram interpostos, na forma preconizada pela lei antiga. Figure-se o exemplo de um agravo, deduzido sem a cópia da decisão agravada ou das procurações outorgadas aos advogados das partes. A matéria de fundo envolve o direito intertemporal em sede recursal, tema extremamente complexo no sistema brasileiro.

É compreensível que alguns autores sustentem, a partir da redação do art. 1.211, CPC, que a nova lei deve atingir os recursos pendentes, afinal “ao entrar em vigor, suas disposições aplicar-se-ão desde logo aos processos pendentes”. Contudo, em que pese a nova lei representar um avanço, difícil será a sua aplicação em face dos agravos de instrumento pendentes de julgamento. É que eles atacaram atos processuais pretéritos e, desta forma, blindados em relação às alterações legislativas.

Sucede que a interposição pela modalidade antiga (na via instrumental) já ocorreu. Logo, a admissibilidade recursal deve se guiar pelos requisitos que então estavam a viger. A se admitir solução contrária, os Tribunais Superiores deverão determinar aos Tribunais de Origem a remessa de todos os autos, que permaneceram na instância ordinária, aguardando a solução do agravo de instrumento. E, ato contínuo, ignoraria o regramento vigente na data de prolação da decisão recorrida e da interposição do recurso. A lei nova estaria atingindo os atos pretéritos, algo que não se quer no direito processual.

Desta forma, parece-nos que a lei nova não irá atingir os recursos perfeitamente interpostos, consoante a lei antiga. Será reservada sua aplicação para os agravos interpostos a partir de hoje."


Enfim, são essas as observações iniciais sobre a nova lei."
     
(1)  V.g. súmula 284, do STF: “é inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia”. A súmula 287 alude, em nosso sentir equivocadamente, ao não provimento como efeito da fundamentação deficiente.
(Fonte: Site Espaço Vital) 

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