Um psiquiatra conversa com ela e usa técnicas de hipnose para quebrar barreiras do trauma. Em poucos minutos, ela revela as informações e em outro ponto da sala um retrato falado do criminoso ganha formas. Embora pareça cena de ficção, o método do hipnotismo é a próxima aposta da Polícia Civil de São Paulo na investigação de crimes graves.
O Departamento de Homicídios e de Proteção à Pessoa (DHPP) pretende criar o primeiro setor de hipnose forense do Estado, em sua sede, no centro da capital paulista. O objetivo é extrair informações do subconsciente das pessoas hipnotizadas, para que relembrem informações que consideram esquecidas. O mesmo modelo existiu com sucesso, por mais de dez anos, na Secretaria de Segurança do Paraná, mas acabou suspenso por falta de especialistas.
A proposta surgiu na polícia paulista no fim do ano passado e já foram realizadas duas reuniões com médicos do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas (HC) para formalizar um convênio. Enquanto isso, começaram os planos para mudanças na estrutura física do prédio do DHPP. Uma sala específica para o setor de arte forense (onde se elaboram retratos falados) está sendo criada com aspectos de consultório médico: ambiente com isolamento acústico, sofá confortável e antessala para parentes de testemunhas.
Esse setor vai ser inicialmente utilizado pela arte forense e é ali que o DHPP pretende realizar as sessões de hipnose. "A princípio, a orientação para toda a polícia de São Paulo é aperfeiçoar os retratos falados, ferramentas importantes nas investigações", diz o diretor do DHPP, Marco Antônio Desgualdo. "Mas também vamos trabalhar com técnicas para despertar o que testemunhas têm na memória, como foi feito no Paraná. Negociamos um convênio e depois vamos submeter à Delegacia Geral."
Detalhes.
Com a ansiedade neutralizada - no chamado "estado alterado de consciência", ou "transe hipnótico" -, vítimas e testemunhas poderão relembrar detalhes que ajudem a elucidar os crimes. A vítima vai lembrar, por exemplo, da roupa que o criminoso usava, ou de marcas em seu rosto. Também recordará detalhes do local do crime. No Paraná, uma pessoa hipnotizada lembrou do emblema de empresa em um caminhão e, a partir dali, encontrou-se o motorista que testemunhou um caso de atropelamento. O criminoso foi encontrado.
A técnica é vista com entusiasmo no DHPP. "Tem tudo para dar certo. Amplia o leque de ferramentas que a polícia tem para elucidar crimes", disse a delegada Fabiana Sarmento, coordenadora do setor de Inteligência do DHPP, que encabeça as negociações do convênio. "Será um setor (o de hipnose) aberto para toda a polícia, útil para ajudar vítimas de crimes graves, que chegam bloqueadas e poderão relaxar e passar mais informações", disse Sidney Barbosa, coordenador de arte forense do DHPP.
A exemplo do Paraná, porém, a hipnose em investigações deve sofrer críticas em São Paulo.
A validade desses depoimentos é questionada. "Ao depor, a pessoa deve estar livre e consciente, como prevê a lei. Qualquer depoimento tomado com alguém hipnotizado será visto como prova ilegal", disse o advogado criminalista Carlos Kauffmann, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, seção São Paulo (OAB-SP). "A defesa questionará a autenticidade do inquérito."
Para minimizar esse tipo de problema, segundo o DHPP, a técnica será usada apenas em testemunhas e vítimas - suspeitos não serão hipnotizados. Pessoas submetidas à hipnose também deverão autorizar por escrito as sessões.
Fonte: O Estadão
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