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segunda-feira, novembro 14

VITIMOLOGIA E VITIMODOGMÁTICA: UMA ABORDAGEM 'GARANTISTA' - Parte III

       Ana Cláudia Lucas
       Para o Blog

               5. UM CONCEITO DE VITIMOLOGIA

Não há unanimidade doutrinária em torno de um conceito de vitimologia. Pode-se referir que Vitimologia é o estudo científico da vítima; ou que Vitimologia é parte da Criminologia que estudo o fenômeno criminoso a partir de quem sofre o ataque a bem juridicamente protegido[1].

Contudo, um aspecto parece muito claro, ou seja, de que a definição de Vitimologia está relacionada à definição de vítima. E aqui, no presente trabalho, para efeito da caracterização vitimológica, interessa o conceito de vítima como sendo aquele que a relaciona ao crime. Vítima, por isso, é a vítima do crime.

Pois bem, mas quem é a vítima, ou o que é, vítima de crime ? Pode-se dizer que vítima é toda a pessoa, física ou jurídica, violada em seus direitos fundamentais por um ato ou omissão humana.

Por outro lado, é possível estabelecer um conceito jurídico de vítima. Nesse sentido, recomenda-se a utilização da palavra vítima, em se tratando de crimes contra a pessoa; de ofendido, em se tratando de crimes contra a honra e contra os costumes; a palavra lesado, nos crimes patrimonais.

O Código Penal Brasileiro utiliza as expressões vítima e ofendido de forma indistinta, e faz apenas uma vez o uso da expressão lesado ( art. 91, II)

Por sua vez, o Código de Processo Penal, utiliza as expressões vítima, ofendido, pessoa ofendida e lesado, sem um critério rígido[2].

Há, também, quem identifique o sujeito passivo do crime com o titular do bem juridicamente ofendido ou ameaçado, sendo, também, aceitável a existência de dois ou mais sujeitos passivos em um mesmo crime.

Bettiol considera que todo o crime possui dois sujeitos passivos: um, dito constante, que é o Estado-administração, pois que todo o crime viola um interesse público e, outro, o sujeito passivo eventual, o titular do interesse concretamente lesionado[3]

É possível, ainda, distinguir-se entre vítima e prejudicado. Por exemplo, num crime de homicídio a vítima é o morto, enquanto os prejudicados são, por exemplo, os filhos, que dependiam financeiramente do falecido. O prejudicado, no campo jurídico, só poderá ser considerado uma vítima quando for, em razão do mesmo fato, também sujeito passivo. Num enfoque mais amplo de vitimologia, contudo, é possível de que ele também pode ser incluído na categoria de vítima[4].

E os crimes chamados sem vítimas ? A expressão "crime sem vítima "foi cunhada a partir da necessidade de adequação do conceito de vítima - na vitimologia tradicional - que pressupõe uma relação interpessoal entre o criminoso e sua vítima, à criminalidade moderna, da qual fazem parte integrante um sem número de tipos penais em que não há vítima específica, passível de identificação[5].

Na doutrina são divergentes as opiniões a respeito da adequação dessa expressão. Para alguns, se não há vitima, não há crime, enquanto para outros nenhum inconveniente existe na expressão, porque o sujeito passivo do delito não é necessariamente uma pessoa, podendo ser o Estado, uma pessoa jurídica, entidades coletivas etc.

Contudo, parece desadequada expressão, porque mesmo naqueles crimes de vítimas difusas, como na criminalidade econômica, nos crimes ambientais, no tráfico ilícito de entorpecentes etc seria melhor referir - para não dar a impressão de que o interesse protegido não é de ninguém - que existem crimes multivitimários, crimes vagos, ou de vítimas difusas[6].


[1] Fernandes, Antônio Scarance. O papel da vítima no processo criminal.São Paulo: Malheiros, 1995; 
[2] Código Penal Brasileiro. Saraiva, 2002; 
[3] Antonio Beristain, Victimología...p. 191; Anibal Bruno, Direito...p.209; 
[4] Aníbal Bruno. Direito Penal...p.210; Antonio S. Fernandes, O papel...p.40; 
[5] Antonio Garcia Pablos y Molina, Manual...p.85; 
[6] Jesus, Damásio Evangelista. Comentários ao Código Penal. São Paulo: Saraiva, 1985;  

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