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sexta-feira, agosto 3

Mensalão: entendendo o julgamento (1º dia de julgamento)

Carolina Cunha
Para o Blog

O julgamento do mensalão iniciou a partir da votação de uma “questão de ordem” suscitada pelo advogado do réu José Roberto Salgado.

Primeiro, cumpre esclarecer que “questão de ordem” é uma expressão que pode equivaler às preliminares de mérito do processo penal. Em linhas gerais, significa a solicitação de esclarecimento quanto à condução dos julgamentos, dúvida no tocante a interpretação do Regimento Interno do STF ou possível afronta à Constituição Federal.

No caso do mensalão, a “questão de ordem” decidida ontem era relativa a uma provável afronta à Constituição Federal, no que pertine a competência para julgamento. Em alguns momentos, inclusive, pôde-se ouvir os Ministros referirem “este não é um Tribunal de Exceção”, em clara referência ao dispositivo constitucional que veda a instituição destes Tribunais.

A percepção do advogado suscitante partia da premissa de que, de acordo com a própria Constituição, o Supremo Tribunal Federal só tem competência para julgar réus que com prerrogativa de foro em razão da função (o que se costuma denominar foro privilegiado) e, dos trinta e oito réus deste processo, apenas três (os deputados federais Valdemar da Costa Neto, João Paulo Cunha e Pedro Henry) gozam desta prerrogativa.  Assim, o defensor do ex-diretor do Banco Rural pretendia que os outros acusados tivessem seus processos remetidos à justiça de primeiro grau, o que foi negado pelos Ministros, por nove votos contra e a dois a favor.

Analisada apenas a norma Constitucional, divorciada das demais regras, a inconformidade do advogado parece pertinente, no entanto, existe, no âmbito processual penal, o instituto da conexão, que é causa modificativa da competência.

Assim, no caso julgado pelo STF, os processos foram reunidos porque, conforme o artigo 76, inciso I, do Código de Processo Penal, a competência será determinada pela conexão se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar.

Em sendo assim, parece não haver dúvida: os processos devem ficar reunidos.

No entanto, o artigo 80 do Código de Processo Penal prevê a possibilidade (facultatividade) de separar-se o processo, em determinadas situações, nas quais o juiz entenda conveniente, como nos casos exemplificados na lei, excessivo número de réus ou quando as infrações tiverem sido praticas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes. Estas duas possibilidades incidiriam no caso do mensalão e, assim, parece possível a divisão.

Esta previsão, porém, é facultativa e caberá ao julgador optar por dividir ou não, de acordo com a conveniência processual. 

O STF, em alguns casos, tem optado pela separação e, exatamente por isso, o advogado suscitou a questão de ordem. No entanto, os Ministros optaram por não cindir o processo, apoiados na súmula 704, da Casa, que dispõe: não viola as garantias do juiz natural, da ampla defesa e do devido processo legal a atração por continência ou conexão do processo do co-réu ao foro por prerrogativa de função de um dos denunciados.

Esclareceram, ainda, que nos casos em que o Supremo adotou a determinação do artigo 80 do CPP, o fez logo no início do processamento exatamente para evitar que o trâmite se prolongasse e, assim, não havia qualquer razão para separar o processo no dia da sessão de julgamento, pois que isso teria efeito contrário ao que pretende a lei, qual seja: a celeridade. 

Um comentário:

Anônimo disse...

Obrigado professora... Sou estudante do 7º semestre de Direito e suas explicações clarearam o meu entendimento. Parabéns!