Até o momento, 20 senadores assinaram emendas para modificar
diferentes trechos do projeto, entre os quais os dispositivos que tratam dos já
conflituosos temas do aborto e da legalização das drogas para consumo pessoal
em pequena quantidade. As sugestões alcançam ainda outros pontos que na fase de
elaboração do texto inicial levantaram polêmica, como os que se referem aos
crimes contra o patrimônio, os delitos praticados por índigenas e os que
atentam contra os animais.
Delito sem violência
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), por exemplo, incluiu
entre as 43 emendas que registrou de uma só vez, na quinta-feira passada (24),
sugestão para que qualquer delito patrimonial cometido sem violência ou grave
ameaça – o furto, por exemplo – fique sujeito a representação por parte da
vítima. Nesse caso, a investigação só seria convertida em processo judicial por
decisão da pessoa atingida, que ainda poderia se contentar em ser reparada e
fechar acordo com o autor do delito.
Pelo projeto, que foi elaborado por uma comissão de juristas
com membros indicados pelos líderes partidários do Senado e tramita desde
agosto, esse tipo de solução serviria para delitos patrimoniais de pequeno
valor, com base no princípio da insignificância. Para o senador, esse conceito
é “circunstancial” e não reflete automaticamente o valor do que foi subtraído
da vítima.
“Caso a vítima procure o Estado e noticie o crime, o delito
deixa de ser insignificante. A prevalecer a tese [do projeto] estaremos
fomentando a prática de crimes patrimoniais, em virtude de seu pequeno valor
para alguns, mas de inquestionável importância para outrem”, argumenta Aloysio.
Antonio Carlos Valadares (PSB-SE) é autor de outro grande
lote de emendas, um total de 29 proposições que tendem a reduzir condenações
por ações com danos ínfimos e a aplicação de penas alternativas para um número
maior de crimes, desde que também cometidos sem violência ou grave ameaça.
Com relação aos indígenas, Valadares sugere que os juízes
possam adotar como solução às penas alternativas previstas no Código os métodos
adotados pelas próprias comunidades indígenas para reprimir delitos cometidos
por seus membros, desde que compatíveis com o sistema jurídico nacional e com
os direitos humanos
internacionalmente reconhecidos.
Ortotanásia
Ainda se destacam pela quantidade de sugestões de emendas os
senadores Magno Malta (PR-ES), com 28 propostas, Tomás Correia (PMDB-RO), que
assinou 26, e Maria do Carmo, com 10.
Os três parlamentares também compartilham a disposição em
mudar o texto para rever dispositivos adotados pelos juristas que são menos
rígidos em relação ao aborto e à ortotanásia – que consiste na suspensão de
cuidados para prolongar por meios excessivos a vida de pacientes terminais,
quando essa for a vontade expressa pelo paciente ou quando houver autorização
do responsável.
“Não se confundindo com uma liberdade, não se inclui no
direito à vida o direito por não viver. Na medida em que os poderes públicos
devem proteger esse bem, a vida deve ser preservada, apesar da vontade em
contrário de seu titular”, argumenta Tomás Correia.
Quanto ao aborto, hoje a lei autoriza sua prática diante de
risco de morte para a gestante ou quando a gravidez resultar de estupro,
havendo ainda decisão favorável ao ato no Supremo Tribunal Federal (STF) no
exame de caso de anencefalia. O texto dos juristas também descriminaliza o ato
até 120 dias desde a fecundação se houver laudo médico ou psicológico atestando
incapacidade da mulher em levar a gravidez adiante (uma gestante com alta
dependência de drogas, por exemplo). Contra esse ponto se insurgem os três
parlamentares.
Jogos de azar
Tomás Correia pretende ainda retirar do texto o dispositivo
que tornou crime a exploração de jogos de azar, a exemplo o jogo do bicho, na
atual legislação uma simples contravenção penal, com penas brandas que quase
sempre não levam os praticantes à prisão. Para o senador, o mais adequado seria
regulamentar totalmente os jogos, já que o próprio Estado realiza e patrocina
alguns jogos de azar.
Os crimes ambientais, em parte onde se incluem os delitos
contra os animais, punidos de maneira mais rigorosa no projeto, mereceram a
atenção do senador Jayme Campos (DEM-MT).
Autor de cinco emendas, o senador busca por meio de uma delas eliminar
do texto dispositivo que sugere prisão de um a quatro anos para quem
“transportar animal em veículo em condições inadequadas, ou que coloquem em
risco sua saúde ou integridade física ou sem a documentação exigida”.
Para Jayme Campos, as leis atuais já tratam modo adequado a
questão do transporte animal, inclusive por meio de leis referentes à
agropecuária e aos padrões sanitários de produção animal. A seu ver, o
dispositivo é redundante e se confunde com a previsão punitiva do artigo que
trata de maus-tratos a animais. “Além disso, prevê uma pena que nos parece
bastante elevada, sem ao menos admitir multa como uma alternativa possível”,
reclama o senador.
Bullying
Lídice da Mata (PSB-BA) dedicou uma de suas nove emendas à
questão do bullying, tipificado com o nome de “intimidação vexatória” na
proposta, com aplicação de medidas sócio-educativas se o praticante condenado
for menor de idade. No entanto, na contramão do clamor pela punição do
bullying, Lídice da Mata se empenha em suprimir do texto o dispositivo.
“Ao criminalizar o bullying, a proposta retira do âmbito
educacional a possibilidade dos educadores atuarem conjuntamente na busca de
soluções destes conflitos a partir de uma cultura de paz”, avalia a senadora.
Já Paulo Paim (PT-RS) assina três emendas, uma delas para
defender tratamento penal mais duro contra autor de roubo de cargas, de forma
semelhante ao que o texto sugere para o roubo praticado para o roubo contra
veículo de transporte de valores. Nesse caso, o roubo é “qualificado”, com pena
de quatro a oito anos de prisão.
“Não se pode esquecer a ameaça à integridade física dos
motoristas envolvidos nas operações de transporte, que convivem com os
sentimentos de medo e insegurança no dia a dia de suas atividades
profissionais”, salienta o senador.
Cronograma
Pelo cronograma atual, a comissão especial do Senado que
examina o projeto do novo Código Penal, relatado pelo senador Pedro Taques
(PDT-MT), receberá até o dia 5 de novembro as emendas dos parlamentares.
A votação dos relatórios parciais deverá terminar no dia 20
de novembro, enquanto o prazo para a apresentação do relatório final do relator
ficou para o dia 27 do mesmo mês. Já a data de entrega do parecer final da
comissão será até 4 de dezembro.
Porém, tanto o relator como o presidente da comissão, senador
Eunício Oliveira (PMDB-CE), já defendem a dilatação do calendário.
Em reunião a ser realizada ainda nesta semana, a comissão
decidirá sobre a proposta, que pode significar mais 20 dias úteis para cada
fase da tramitação.
Fonte: Agência Senado de Notícias
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