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quinta-feira, março 10

Retorno e destino de Sanfelice

A discreta volta à prisão gaúcha

Em 16 de março de 2007, o empresário Luiz Henrique Sanfelice cruzou o portão da Penitenciária Modulada de Montenegro, comemorando a transferência para o regime semiaberto, trampolim para a fuga internacional, 13 meses depois.

Ontem, Sanfelice estava de volta à mesma prisão, em situação adversa. Capturado ano passado na Espanha, ele chegou ao Rio Grande do Sul pela manhã, repetindo a frase que sustenta desde o dia que foi acusado da morte da mulher, a jornalista Beatriz Helena de Oliveira Rodrigues, queimada viva no Dia dos Namorados de 2004, em Novo Hamburgo.

– Sou inocente, sou inocente – defendeu-se ao ser cercado por jornalistas na porta do Departamento Médico Legal (DML), onde foi submetido a uma exame de lesões.

O grito de Sanfelice e a mobilização da imprensa na Capital foram o desfecho de uma viagem que até então havia sido marcada pela discrição. Nas 16 horas em que cruzou o Atlântico e parte do território brasileiro, o empresário passou despercebido, como conta ZH conta nesta reportagem.

Três sacolas formam bagagem

A viagem de volta ao Brasil começou em Madri, às 21h50min (17h50min no horário de Brasília) de terça-feira. Desde o dia anterior, Sanfelice aguardava em uma cela do aeroporto de Barrajas, sob custódia da polícia local, a chegada dos agentes brasileiros. Carregava três sacolas de roupas que usava na cadeia nos arredores de Sevilha, onde estava recolhido enquanto a extradição era definida. Ficara ali a pedido dele próprio, para estar perto da segunda mulher e do filho, que há 15 dias retornaram ao Brasil.

Por volta das 19h (15h, no Brasil), quando o delegado Farnei Franco, representante da Interpol no Estado, e um agente chegaram ao aeroporto para escoltá-lo, Sanfelice foi retirado da cela. Recebeu orientações dos brasileiros.

Pouco antes do voo, foi conduzido pelos espanhóis até a escada do aviação. Sua mãos estavam presas por uma espécie de algema plástica.

11 horas sem levantar da poltrona

Ao contrário de outros passageiros, Sanfelice entrou no avião pela porta de trás. A escolha fazia sentido: ele sentou na última fileira de três assentos bem no meio de um Airbus da TAM. Vestindo calça jeans, tênis branco e jaqueta esportiva azul com capuz, o empresário viajou sem algemas, por não apresentar risco, segundo Farnei Franco.

No voo, o empresário não se preocupou em esconder o rosto envelhecido pelos cabelos e barba grisalhos. Sentou entre os dois policiais e atravessou o Oceano Atlântico com as mãos livres, cochilando, folheando e lendo revistas de bordo, sem trocar muitas palavras com os policiais. Jantou e tomou café pela manhã.

Evitando o constrangimento de ser acompanhado ao banheiro, não deixou a poltrona nas 11 horas de voo.

A discrição surtiu efeito. Os passageiros não perceberam o viajante especial. Só a tripulação se mostrou atenta ao pedir orientações aos policiais sobre os procedimentos durante o trajeto.

A revelação da rota de fuga à PF

Após 11 horas do voo 8065, o empresário desceu às 4h55min no Aeroporto de Cumbica em Guarulhos (SP). Foi retirado da aeronave pela mesma porta que entrou e levado por uma acesso secundário a uma sala da PF. Ali, permaneceu por quase três horas e resolveu falar aos agentes.

Disse estar preocupado com o futuro, com o assédio da imprensa e ter passado dificuldades nos primeiros dias na Espanha, trabalhando na construção civil de dia, porteiro de prédio à noite, comendo e dormindo em albergues.

Segundo os agentes federais, ele ainda detalhou a rota de fuga até a Espanha, em 2008. Ele contou que escapara por um caminho que incluiu uma estada em Santa Catarina, passando por Foz do Iguaçu (PR) e Buenos Aires, na Argentina, de onde tomou um voo à Espanha. A suspeita anterior é de que o empresário teria usado o Uruguai ou o Rio como caminho à Europa.

Desconforto na viagem à Capital

No último trecho da viagem, Sanfelice adotou novo comportamento. Às 7h50min, com capuz escondendo parte do rosto, surgiu cabisbaixo de uma caminhonete estacionada na pista e entrou pela porta traseira do Airbus da TAM.

Foi o último a ingressar e se acomodou na poltrona final (38F), na janela. Passou desapercebido durante a uma hora e meia do voo 3501. Observado por ZH, que embarcou no mesmo avião, Sanfelice demonstrava resignação. Durante o trajeto, tirou o capuz, ignorou o seriado A Grande Família, que passava na TV diante do banco e, de novo sem algemas, leu revistas, conversou com os policiais e aceitou o kit com duas torradas, cookies, geleia e requeijão.

Quando a aeronave chegou à Capital, foi o primeiro a descer, novamente pelos fundos e com a cabeça coberta. Pisou em solo gaúcho às 9h29min e foi levado para o DML.

Começaria, ali, uma nova jornada. De carro, chegaria à prisão de Montenegro, seu destino final, às 11h40min.

Fonte: Jornal Zero Hora

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