O Supremo Tribunal Federal (STF), durante a sessão
plenária desta quinta-feira (2), deu início ao julgamento de inquérito (INQ
2606) para apurar a suposta prática do crime de peculato, por Jayme Campos,
atualmente senador da República. Até agora, apenas o relator, ministro Luiz
Fux, proferiu voto. Para ele, a denúncia deve ser aceita pela Corte.
De acordo
com os autos, a denúncia foi oferecida pela Procuradoria Regional da República
da 1ª Região em relação ao crime de peculato e ao delito tipificado no artigo
89 da Lei 8.666/93 [dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses
previstas em lei] e confirmada pelo procurador-geral da República.
Posteriormente, o procurador-geral retificou os termos da denúncia para apontar
a prescrição da pretensão punitiva em relação ao delito licitatório, mas manter
o pedido de abertura de ação penal para o crime de peculato. Jayme Campos e
outros dois indiciados teriam desviado verbas da União, repassadas por convênio
à Secretaria de Saúde do Estado de Mato Grosso, mediante a suposta aquisição,
em outubro de 1994, de equipamentos e materiais hospitalares superfaturados,
com dispensa de licitação fora das hipóteses previstas em lei.
Consta do
inquérito que o denunciado Moacy Lopes Suares, então presidente da comissão de
licitação, comunicou por meio de ofício a Domingos Sávio Pedroso de Barros, à
época secretário estadual de Saúde, a necessidade urgente de utilização de
recursos liberados por meio do convênio, a fim de diminuir o cenário caótico
que se encontrava a saúde do Estado.
O secretário estadual de Saúde encaminhou
proposta de dispensa de licitação ao então governador do Estado para a sua
homologação. Em 7 de outubro, o governador ratificou a dispensa do procedimento
licitatório com base no inciso IV do artigo 24 da Lei 8.666/93 que prevê
dispensa à licitação nos casos de emergência. O valor total da licitação foi de
R$ 323.232,33.
Em síntese, os acusados alegam que ficou comprovada a situação
de emergência devido a um surto de cólera e meningite, além de casos de raiva e
malária, que justificaria a dispensa de licitação. Também sustentam não haver
provas quanto ao superfaturamento dos produtos adquiridos.
Voto do relator
O
ministro Luiz Fux, relator do inquérito, votou no sentido de receber a denúncia
em relação ao atual senador da República Jayme Campos, uma vez que houve
desmembramento quanto aos demais acusados. Para ele, o caso apresenta indícios
de autoria e materialidade.
“Devemos aguardar o processo penal para ver quem
tem efetivamente razão”, disse. Entre as razões apresentadas pelo ministro,
está a suposta inexistência do estado de calamidade. Isso porque, segundo ele,
apesar de a verba ter sido requisitada com dispensa de licitação a pretexto de
situação emergencial, os remédios permaneceram no almoxarifado. “Há várias
provas que precisam ser aferidas judicialmente”, afirmou o relator, ressaltando
a importância de uma testemunha que depôs perante delegado de polícia ser
ouvida também em juízo. “Não estou aqui diante de uma denúncia que se limita a
narrar um fato abstratamente enquadrável”, completou.
Para o relator, o
Ministério Público conseguiu comprovar por meio de laudos, pesquisa de preços,
auditorias, entre outros, que a suposta dispensa da licitação foi indevida, bem
como a existência de superfaturamento de preços na aquisição de materiais
médico-hospitalares, “concluindo que a licitação serviu para acobertar o
superfaturamento dos preços de materiais adquiridos conforme o laudo contábil
anexado pelo Instituto Nacional de Criminalística”.
Além disso, acrescentou o
ministro Luiz Fux, o Ministério da Saúde também informou que não houve a
aplicação correta dos recursos federais repassados à Secretaria de Saúde
mediante o convênio em questão. “Tais elementos a meu juízo são suficientes
para amparar o recebimento da denúncia”, concluiu.
Questão constitucional
No
início dos debates, o ministro Celso de Mello levantou a questão de a causa
especial de aumento de pena - prevista no parágrafo 2º do artigo 327 do Código
Penal* - contrariar ou não o princípio da reserva legal em matéria penal, tal
como formulado na denúncia. Os ministros entenderam ser necessário discutir o
tema, com a formação completa da Corte, sobre a inaplicabilidade do dispositivo
aos agentes políticos detentores de mandato eletivo.
O ministro Celso de Mello
destacou que tal análise é fundamental para examinar o inquérito, pois caso não
incida a causa de aumento na hipótese ficaria reconhecida a prescrição da
pretensão punitiva. Ele lembrou ainda que a Corte já se pronunciou a esse
respeito quando do recebimento da denúncia no Inquérito 1769.
Na ocasião, por
seis votos a cinco, a Corte entendeu inaplicável a causa especial de aumento de
pena para governador de estado, como ocorre no caso. EC/AD * Art. 327 - Considera-se funcionário
público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem
remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.§ 2º - A pena será
aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo
forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento
de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública
ou fundação instituída pelo poder
público.
Fonte: Supremo Tribunal Federal
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