Então, eu creio que é mais uma questão de falta de rapidez
na prestação jurisdicional - no caso, penal - do que propriamente de
impunidade”, afirmou.
Schietti, que toma
posse como ministro do STJ nesta quarta-feira (28), vai integrar a Terceira
Seção, encarregada de julgamentos de matéria penal. Ele chega à Corte Superior em vaga destinada
a membro do Ministério Público, aberta com a aposentadoria do ministro Cesar
Asfor Rocha, em setembro de 2012. Na composição do Tribunal, a classe dos
advogados e o Ministério Público ocupam um terço das 33 cadeiras.
Os demais dois terços cabem a membros de Tribunais de
Justiça e de Tribunais Regionais Federais.
A trajetória de Rogerio Schietti até o STJ começou com sua
eleição pelo Pleno da Corte para compor a lista tríplice encaminhada à
presidenta Dilma Rousseff, que o indicou para a vaga. Depois disso, cumprindo o
que determina a Constituição, o novo ministro passou por sabatina na Comissão
de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal, sendo aprovado lá e no
plenário da casa.
A publicação de sua nomeação se deu no dia 30 de julho.
Legislação processual
De acordo com Rogerio Schietti, a legislação processual
brasileira deve ser modernizada para que haja equilíbrio permanente entre dois
interesses legítimos: o interesse em que as condutas delituosas sejam punidas
em tempo razoável e, de outro lado, o interesse de proteção do indivíduo,
assegurando a ele o direito de não ter um processo sumário que resulte em
condenação com violação de garantias fundamentais.
Para o novo ministro, a legislação deve ser
ajustada de modo que se tenha uma configuração que permita um processo menos
moroso, sem o sacrifício das liberdades públicas.
“No nosso direito,
só se pode executar uma pena quando não mais cabe qualquer recurso contra a
decisão que condenou o acusado. E isso, por conta da quantidade de recursos
disponíveis para a defesa, pode demandar anos. O resultado é uma sensação de
impunidade. Nós teríamos de pensar em meios de contornar essa dificuldade que,
de fato, gera frustrações no meio social”, avaliou.
Quantidade x qualidade
O novo ministro
assume no STJ com um acervo superior a dez mil processos e o desafio de
“reduzir esse patamar a um nível razoável”. Para dar conta de tanto trabalho,
sua estratégia será, primeiramente, fazer uma triagem rigorosa dos casos
pendentes de julgamento. “Minha equipe,
que foi criteriosamente formada, está ciente de que nós teremos dificuldades,
mas eu espero que, em pouco tempo, consigamos atingir um ritmo que possa nos
colocar em situação de razoável fluxo dos processos”, afirmou.
Outra preocupação de Schietti é com a qualidade dos
julgados. Ele sabe que, para cada parte envolvida num processo, a sua causa é a
mais importante. “Eu não posso prejudicar a qualidade em nome de fazer números.
Mas eu sei também que é inadmissível manter números tão elevados por muito
tempo. Além disso, é importante selecionar as questões que efetivamente possam
impactar de modo mais agudo o interesse dos jurisdicionados”, explicou. Investigação pelo MP Proveniente do
Ministério Público do Distrito Federal, Rogerio Schietti é a favor do poder
investigativo da instituição - tema que recentemente gerou grande polêmica na
sociedade, por conta da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 37, afinal
rejeitada pelo Congresso.
O ministro conta que ele mesmo já se defrontou com situações
concretas em que a investigação realizada pela polícia se mostrou insuficiente.
Segundo Schietti, nos
países que vivem sob o Estado Democrático de Direito, o Ministério Público
investiga livremente, com o auxílio da polícia ou por sua própria conta. Até
porque, em alguns países, a polícia integra a própria estrutura do MP. “Eu acho muito bom que haja essa distinção,
essa independência entre a polícia e o Ministério Público.
Mas eu não concebo um
Estado de Direito ou uma Justiça criminal em que o órgão titular da ação penal
não possa investigar”, afirmou o novo ministro.
Maioridade penal
Rogerio Schietti rechaça a ideia de redução da maioridade
penal, assunto que sempre volta a debate na sociedade cada vez que um ato
violento cometido por menor ganha repercussão na imprensa. “Penso que haja uma solução intermediária. Eu
não creio que a simples redução da maioridade penal possa resolver essa questão
da violência juvenil. Nós podemos trabalhar, talvez, com o incremento da
punição dos adultos que permitem ou se valem de adolescentes para praticar
crimes em conjunto com eles”, afirmou.
Para ele, o melhor é implementar as medidas socioeducativas
do Estatuto da Criança e do Adolescente que até hoje não entraram em vigor. “As
medidas de semiliberdade e liberdade assistida são quase letra morta no
estatuto, e a medida mais drástica, que é a internação, tem sido executada em
estabelecimentos absolutamente impróprios, com superlotação, sem a oferta de
meios de acompanhamento pedagógico dos menores infratores”, lamentou
Schietti. Entretanto, o novo ministro
destaca que para aqueles casos muito graves, de violência muito palpável,
pode-se pensar no aumento do número de anos de internação.
“Em certos casos, após estudos criteriosos, não se tem a
expectativa de que o adolescente possa retornar ao convívio social sem expor a
sociedade a riscos. Em tais hipóteses, considero razoável manter o infrator sob
a custódia do estado por mais de três anos, limite máximo previsto na
legislação atual”, assinalou.
Execução penal
Segundo Schietti, o sistema penitenciário brasileiro, que a
cada ano encarcera mais e mais pessoas, é um produtor e reprodutor de crimes.
“Um ministro da Justiça do governo Thatcher, na Inglaterra, afirmou que a
prisão é uma maneira muito cara de tornar as pessoas piores. Infelizmente, para
muitos casos, não existe outra solução”, disse.
Entretanto, o novo ministro reconhece que há pouco
investimento estatal nos estabelecimentos prisionais, não se qualificam
suficientemente os agentes penitenciários e a sociedade civil não se envolve
positivamente nessa questão. “Além disso”, acrescenta Schietti, “a Lei de
Execução Penal, assim como o Estatuto da Criança e do Adolescente, não é, com o
perdão do trocadilho, executada.”
De acordo com
Rogerio Schietti, as penas alternativas, quando aplicadas, não recebem
acompanhamento e a necessária fiscalização, descumprindo seu papel de mecanismo
eficaz de substituição da pena privativa de liberdade. “E, para agravar essa situação, não há
qualquer amparo psicossocial ao condenado que readquire sua liberdade, o que o
leva a encontrar as mesmas condições familiares e sociais que concorreram para
a violação da lei penal. As chances, portanto, de algum egresso do sistema
penitenciário não delinquir novamente são mínimas”, concluiu.
Olhar os dois lados
Questionado se o fato de vir do Ministério Público o fará um
magistrado mais “duro”, Rogerio Schietti afirmou que não haverá mudança radical
em sua maneira de pensar. “Eu tenho as minhas convicções, meus valores, minhas
ideias, minha visão de mundo, e não acredito que tudo isso vá altera-se de modo
radical simplesmente pela mudança de cargo”, declarou.
Entretanto, o novo ministro admite que a transposição de uma
carreira para outra pode produzir algum efeito: “Eu não sei exatamente que
nível isso vai atingir, mas eu posso dizer que sempre fui um representante do
Ministério Público preocupado em espelhar o próprio nome que denota sua função:
promotor de Justiça.”
Assim, Schietti afirma que vai continuar a ter a mesma
preocupação de olhar o lado da sociedade, mas também o lado do acusado que
precisa ser protegido contra eventuais abusos ou excessos do estado
punitivo. “O ponto de equilíbrio é o
ponto ótimo da atuação do promotor de Justiça e do magistrado.
Tanto o Ministério Público quanto a magistratura têm em
comum a preocupação em realizar a justiça a partir da obtenção da verdade,
esteja ela do lado que estiver - da acusação ou da defesa”, ponderou.
Formação profissional
Mestre e doutor em
direito processual pela Universidade de São Paulo e professor de direito
processual penal nos cursos de pós-graduação da Escola Superior do Ministério
Público do Distrito Federal e do Instituto Brasiliense de Direito Público
(IDP), o novo ministro do STJ entende que as escolas profissionais têm um papel
relevante para quem ingressou nessa carreira, inclusive para promover sua
reciclagem.
Tendo lecionado por
quase 20 anos em cursos de pós-graduação e cursos de formação para magistrados
do Distrito Federal, oferecidos pela Escola de Magistratura do DF, o novo
ministro entende como absolutamente indispensável o treinamento de magistrados
e membros do MP.
“É preciso um treinamento em que se trabalhe a conexão entre
a academia e o foro, de modo que o profissional compreenda a dimensão concreta
de seu aprendizado e a importância de ver o direito como um instrumento para a
realização da justiça, do bem comum e de transformação da realidade social”,
avaliou.
Fonte: Superior
Tribunal de Justiça
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