*Newton Fabrício, Juiz de Direito
A minha intenção não é escrever sobre a demissão do juiz Mezzomo. Não o conheço e não li o processo. Portanto, nada vou escrever a respeito do que não conheço. Mas vou utilizar uma frase dele – transcrita no próximo parágrafo – para abordar um outro assunto, este sim o meu foco.
A frase é a seguinte: “O juiz é apenas um cargo público”.
Não é verdade. Ao longo da História, o juiz foi sempre a figura que distribuía justiça. Desde a antiga Babilônia foi assim. Não por acaso, está nas palavras do príncipe Hammurabi, na introdução do seu Código de Leis: “O juiz existe para punir o mau e o perverso, para impedir que o forte oprima o fraco, para proteger os órfãos e as viúvas, para que a justiça, como o sol, resplandeça no país”.
Mas, de poucos anos para cá, alguns juízes e desembargadores vêm sustentando que, nas audiências criminais, se o promotor não está presente, o juiz nada deve perguntar para as vítimas, réus e testemunhas. Não importa que a vítima seja uma menina estuprada. Se o promotor não está presente, o juiz deve ficar calado, inerte, omisso e amorfo.
O motivo? Entendem esses juízes e desembargadores que a prova criminal deve ser produzida pelo órgão acusador. Em outras palavras: deve o promotor fazer as perguntas às vítimas e às testemunhas. E também ao réu. Se o promotor não está presente, o juiz nada deve perguntar, porque estaria deixando de ser imparcial.
Essa corrente se entende progressista, porque estaria garantindo o direito dos acusados, o direito dos réus.
De minha parte, nada vejo de progressista nessa forma de pensar. Porque talvez não percebam os juízes e desembargadores que defendem esse posicionamento que essa “neutralidade” é a mesma dos juízes da época em que a burguesia chegou ao poder. Mais ainda: é a mesma “neutralidade” do juiz da Baixa Idade Média, época em que as disputas na Justiça eram decididas por duelos ou, ainda, pelas ordálias, “os juízos de Deus”. Em síntese: ao que vencesse o duelo, o juiz dizia que tinha ganho a causa. Ou, no caso das ordálias: o procedimento era atirar o acusado em um rio, encerrado dentro de um saco, junto com uma cobra. Se sobrevivesse, era a vontade de Deus que vencesse a causa. O juiz nada perguntava. Apenas proclamava o resultado.
É triste pensar que há quem defenda que o juiz nada deva perguntar para a pobre vítima, nem para as testemunhas, muito menos para o réu.
É triste pensar que estamos retrocedendo à Baixa Idade Média, quando o juiz nada perguntava.
Se esse pensamento prevalecer, o juiz vai ser, sim, apenas o ocupante de um cargo público.
Quieto, calado, inerte, omisso e amorfo.
Fonte: Jornal Zero Hora
Fonte: Jornal Zero Hora
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