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quarta-feira, maio 22

Presos por assaltos em Pedras Altas serão indiciados por roubo e formação de quadrilha(*)



Um revólver calibre 38 foi apreendido na casa do vereador Adão Lemes Prestes; suspeito responderá ainda por posse irregular de arma

(*) Michele Ferreira - michele@diariopopular.com.br

Um dia antes de completar um mês dos assaltos a duas agências bancárias, que espalharam terror pelo Centro de Pedras Altas, a Polícia Civil cumpriu mandados de prisão preventiva concedidos pela Justiça de Pinheiro Machado e deteve quatro suspeitos de envolvimento nos roubos. Dois homens e duas mulheres. 

Todos presos no assentamento Nossa Senhora da Glória, no 4º distrito. Um deles é o vereador e atual vice-presidente da Câmara, Adão Lemes Prestes (PT), conduzido provisoriamente ao Presídio Central de Porto Alegre. Até a operação de terça, mais de 50 policiais da capital, de Santa Cruz do Sul, de Herval e de Bagé participaram das investigações, que ainda não chegaram ao fim.

A ação confirma um dos temores da comunidade: a possibilidade de moradores da pacata Pedras Altas, de pouco mais de 2,2 mil habitantes, terem ajudado a arquitetar os assaltos, que custam a sair da memória de quem se viu como refém, em meio a tiros, feridos e chamas. Na última segunda-feira, o Diário Popular voltou ao município - a cerca de 140 quilômetros de Pelotas - e encontrou dois cenários. Os sinais dos disparos seguem nas paredes e os armários ainda guardam os estilhaços de bala. A principal marca, entretanto, vai além dos estragos às instituições bancárias e pode ser conferida pelas ruas, com cidadãos que criam novos hábitos - fecham a porta de estabelecimentos mais cedo e anotam placa de veículos estranhos - e passam a conviver com o sentimento de desconfiança e receio.

A balconista Fernanda Costa, de 28 anos, não nega: a partir das 18h, conforme anoitece, passou a fechar a porta da farmácia e permanecer acompanhada. "Tenho procurado não ficar sozinha, uma preocupação que eu não tinha antes", afirma. "Como o caso não tá totalmente esclarecido e temos dúvida se tem envolvimento de alguém daqui, a gente fica mais atenta", reforça, depois de ouvir comentários de que a fuga da quadrilha teria sido facilitada por quem dominaria o quebra-cabeça dos caminhos do interior. Uma tese carimbada na terça.

No supermercado, a atendente de caixa Jaci Tardiz da Silva, de 64 anos, mantém o lema da precaução. Ao verificar alguma movimentação suspeita, não perde tempo. Logo, anota a placa do veículo e troca informações com outros comerciantes para tentar saber quem é e o que faz na cidade. "Como tem um pessoal trabalhando na estrada aqui perto, às vezes, aparece alguém diferente. E, depois de tudo aquilo, todo o cuidado é pouco", resume.

Naquela segunda-feira, foram os gritos de pânico da criançada que brincava na praça em frente ao estabelecimento - no meio do trajeto entre o Banrisul e o Sicredi - que quebraram a costumeira tranquilidade. Serviram de anúncio à violência. "Fechamos tudo e nos escondemos nos fundos", relembra Jaci. Apavorada, a jovem Milene Pereira Ferreira, 20, foi além: pulou o muro e pediu abrigo na casa de uma enfermeira, nas proximidades. "Foi um horror. Na hora do susto, a gente faz qualquer coisa", acrescenta. 

Hoje, o sistema de câmeras, já instalado antes dos assaltos, serve ao menos de alento a quem se vê exposto à insegurança.

Serviço reduzido

Os clientes são os de sempre no restaurante pequeno, com imagens de Nossa Senhora Aparecida colocadas sob o vidro das mesas. As trocas de gentileza e o trato pelos nomes confirmam a convivência diária. Desde o 22 de abril, todavia, quem deixar para encomendar a janta após as 21h30min tende a ficar sem a refeição. "Antes aceitávamos pedidos até a meia-noite, até a 1h da manhã, mas agora estamos mais espertos", enfatiza o aposentado Omero de Castro, de 76 anos, ao também adotar conduta preventiva.

Com medo, mas de volta às atividades

A funcionária do Sicredi aceita conversar com o Diário Popular, mas trata de fazer a ressalva: não quer ser identificada. "Não sabemos quem são os envolvidos e preferimos ser preservados", destaca ao garantir que a empresa tem oferecido suporte psicológico a todos os quatro trabalhadores, afastados das atividades por uma semana, depois de serem transformados em escudo humano, na frente do banco. "Com aquele nível de violência, sabemos que seria impossível evitar um novo assalto", preocupa-se, sentada ao lado de uma das paredes atingidas por disparos. Os vidros, claro, já foram trocados.

No Banrisul, o cimento esconde parte dos estragos provocados naquela manhã, em que as balas ultrapassaram uma das divisórias instaladas na agência. Na perna direita do bancário Pierre Costa Moraes, de 52 anos, ainda cicatriza a ferida do tiro que o pegou de raspão, ao se tornar uma das primeiras vítimas da ação criminosa. "Não temos muita opção. Os horários são os mesmos. Os caminhos são os mesmos e temos que trabalhar", afirma. "O que dá para dizer é que hoje estamos muito mais receosos", resume, com o peso de quem já foi alvo de assalto em outros dois momentos na carreira, em 1998 e 1999.

Como ficam as investigações?

As quatro prisões preventivas, na manhã de terça-feira, não colocam fim às investigações. As duas mulheres e os dois homens serão indiciados por roubo e formação de quadrilha, embora não tenham atuado na linha de frente. O vereador Adão Lemes Prestes ainda tem o agravante da posse irregular de arma de fogo, já que um revólver calibre 38 - irregular junto à Polícia Federal (PF) - foi encontrado em sua residência, no assentamento Nossa Senhora da Glória.

Durante a tarde, na Delegacia de Roubos do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic), em Porto Alegre, o quarteto decidiu não se manifestar; direito que a lei concede aos suspeitos. Ao conversar com o Diário Popular no início da noite de terça, entretanto, o delegado Joel Wagner, que comandou a ação, foi enfático: "Eles deram apoio antes da prática do crime, deram suporte com alimento e abrigo e ajudaram inclusive na retirada da quadrilha, na madrugada de quinta para sexta-feira, em 26 de abril", explicou. "Foi tudo premeditado".

Possivelmente hoje os quatro devem ser conduzidos ao Presídio Regional de Bagé, vinculado à Vara de Execuções Criminais (VEC) de Pinheiro Machado. Na terça, os homens foram levados ao Presídio Central e, as mulheres, à Penitenciária Feminina Madre Pelletier, ambos em Porto Alegre. "Agora, o inquérito segue na identificação e na responsabilização de outros dois membros da quadrilha".

Entenda melhor

Investigações já desencadeadas pela Polícia Civil de Santa Cruz sobre a ação de bandidos nos Vales do Rio Pardo e do Taquari juntaram-se às apurações do caso de Pedras Altas e levaram à prisão de Marcelo Barros Martins, 33, na manhã do sábado, 27 de abril, no Centro de Lajeado. O grupo liderado por Alemão, como é conhecido, costumava promover assaltos a residências, a estabelecimentos comerciais e a propriedades rurais e, há pouco, começava a migrar a roubos a bancos. "Dos quatro presos na terça-feira (21), três são familiares de Marcelo", ressalta o delegado.

No domingo, 5 de maio, outro suspeito, de 28 anos, foi morto ao tentar roubar uma residência em Vera Cruz junto com um comparsa, que conseguiu fugir. Quando a dupla tentava ingressar na casa de um empresário foi surpreendida por uma equipe de 16 policiais, 12 agentes e quatro delegados. Agora, resta capturar os outros dois encapuzados do assalto.

BM mais perto de ganhar reforço

A partir de segunda-feira, o efetivo da BM deve praticamente dobrar em Pedras Altas, com o reforço de quatro policiais. "Vamos ficar muito próximo do 100% previsto no quadro da organização, que é de 11 policiais", afirma o comandante do 3º Batalhão de Policiamento em Área de Fronteira (BPAF) de Jaguarão, major Sílvio César Gomes Cardoso.

Até o assalto das agências bancárias, entre e cinco e seis soldados se revezavam nos plantões, em geral sozinhos, considerados afastamentos por problemas de saúde, períodos de férias e licenças. Após o episódio, o policial rendido pelos ladrões, que já negociava remanejo, foi então transferido ao 6º Batalhão da BM, em Rio Grande. A escassez de pessoal, que já inviabilizava ações como barreiras policiais, ficou ainda maior.
Quanto ao conserto da viatura, com sérios danos no motor, o major admitiu: não há previsão de a caminhonete Nissan voltar a rodar. "Não podemos atribuir esse problema à ação da quadrilha, mas agora estamos na fase de tomada de preços". Um primeiro orçamento indicou o custo de R$ 30 mil, inviável aos cofres do Estado.

Relembre

Quatro homens fortemente armados, com toucas ninjas e três deles com coletes militares renderam o único soldado da Brigada Militar de plantão e começaram o ataque a duas agências bancárias, por volta das 10h. Rapidamente, estava estabelecida uma cena de guerra. Na ação, os bandidos atiraram para aterrorizar os reféns e, pelo menos, duas pessoas ficaram feridas sem gravidade. Os criminosos atearam fogo no veículo utilizado para chegar à cidade e, na fuga, utilizaram, inclusive, uma viatura roubada da Brigada Militar. Os reféns foram soltos em estradas do interior.

Cerca de 120 policiais da BM de Pelotas, de Rio Grande e de Jaguarão juntaram-se à caçada à quadrilha, além de integrantes da Polícia Civil de Pinheiro Machado e da Polícia Rodoviária Federal (PRF), que utilizou helicóptero para sobrevoar a área. A quantia levada não foi revelada pelas instituições.

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