Em decisão unânime tomada nesta terça-feira (27), a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou decisão judicial que, por falta de intimação do assistente de acusação, que era a vítima no processo, impediu o trânsito em julgado de sentença que havia reconhecido a prescrição da pretensão punitiva do Estado contra o réu. Segundo explicou o ministro Gilmar Mendes, relator do caso, o direito da vítima de exercer o papel de assistente de acusação foi processualmente negado por “exclusiva omissão” do magistrado de 1ª instância da causa.
A matéria foi julgada na análise de Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC 106710) interposto pelo réu no processo, acusado pelo Ministério Público por denunciação caluniosa contra um desembargador do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJ-AM). A denúncia começou a tramitar na Justiça federal, mas, posteriormente, foi transferida para a Justiça estadual, considerada competente para julgar o processo.
Quando isso ocorreu, todos os atos processuais da Justiça Federal foram anulados. Inclusive o pedido da vítima para ingressar na denúncia como assistente de acusação. Na Justiça estadual, o magistrado de 1ª instância deixou de admitir a vítima como assistente de acusação. O réu foi condenado e somente a defesa apelou, argumentado em favor da prescrição da pena, que acabou sendo reconhecida.
Contudo, por meio de uma reclamação apresentada ao TJ-AM, a vítima conseguiu reverter a decisão que decretou a extinção da punibilidade do réu e obteve o direito de ser intimada da decisão de 1ª instância, para apresentar seu recurso de apelação.
No STF, o réu afirmou que uma vez declarada a prescrição da pretensão punitiva do Estado, a mudança dessa decisão por meio de uma apelação criminal da defesa significaria uma reforma em seu prejuízo (reformatio in pejus). Em outras palavras, ao reconhecer a necessidade de intimação de assistente não formalmente habilitado no processo, vítima no processo, o Tribunal estadual teria reformado a sentença de 1º grau prejudicando o réu, sem que houvesse sido interposto recurso Ministério Público, o titular da ação.
O ministro Gilmar Mendes rebateu o argumento. Ele explicou que a transferência da denúncia para a Justiça estadual anulou todos os atos praticados pela Justiça federal, inclusive o pedido da vítima de figurar como assistente de acusação, mas “não teve o condão de desconstituir o direito material da parte ofendida de figurar no pólo ativo da demanda”.
Segundo o relator, o direito da vítima de exercer a figura de assistente de acusação foi processualmente negado por exclusiva omissão do magistrado da 5ª Vara Criminal da Comarca de Manaus, que deixou de despachar o pedido efetuado. “As nulidades absolutas podem ser arguidas a qualquer tempo, porque os atos nulos não podem gerar efeitos processuais. O assistente de acusação deve ser intimado de todas as decisões e, caso não tenha sido, tem-se a nulidade dos atos praticados após a omissão”, disse. Assim, não há como alegar a ocorrência de trânsito em julgado para a acusação diante da ausência de intimação do assistente.
“Dessa forma, a omissão consistente em desconhecer o pleito de habilitação da vítima na qualidade de assistente, bem como de negar-lhe o direito de figuração no pólo ativo da demanda representa, a meu ver, ofensa ao devido processo legal, que nulifica os atos posteriores à omissão”, reiterou.
O ministro também citou decisão do Supremo no sentido de que o prazo para o assistente da acusação interpor recurso começa a correr a partir do encerramento do prazo do Ministério Público. Ele afirmou ainda que jurisprudência consolidada da Corte determina que o assistente de acusação tem legitimidade para recorrer da decisão que absolve o réu nos casos em que o Ministério Público não interpõe recurso.
Fonte: Site do STF