O relator da Ação Penal (AP) 470, ministro Luís Roberto
Barroso, autorizou o trabalho externo de cinco condenados: os ex-deputados
federais Valdemar Costa Neto, Pedro Côrrea e Carlos Alberto Rodrigues Pinto
(Bispo Rodrigues) e os ex-tesoureiros do PT Delúbio Soares e do PL (atual PR)
Jacinto Lamas. Por outro lado, negou o benefício ao ex-deputado federal Romeu
Queiroz e ao advogado Rogério Tolentino. As decisões foram tomadas na análise
dos agravos regimentais interpostos pelos condenados contra decisões do antigo
relator da AP 470, ministro Joaquim Barbosa, nas execuções penais (EPs).
Na sessão da última quarta-feira (25), o Plenário da Corte
deu provimento ao agravo regimental interposto por José Dirceu e deferiu o
pedido de trabalho externo por ele pleiteado. Com base nas teses fixadas nesse
julgamento, o Plenário autorizou o relator a decidir monocraticamente os demais
recursos sobre a matéria.
Ao reformar as decisões anteriores que vetaram o trabalho
externo, o ministro Roberto Barroso considerou que a exigência do cumprimento
de um sexto da pena, prevista no artigo 37 da Lei de Execução Penal (LEP), para
o apenado ter direito ao benefício não se aplica aos condenados no regime
semiaberto.
De acordo com o relator, há mais de 15 anos o Superior
Tribunal de Justiça (STJ), órgão encarregado de uniformizar a interpretação do
direito federal, consolidou esse entendimento, que é seguido pelos tribunais de
justiça dos estados, responsáveis pela execução direta das penas aplicadas aos
condenados.
O ministro Luís Roberto Barroso destacou que o artigo 112 da
LEP prevê a possibilidade de progressão de regime, com a transferência a regime
menos rigoroso, por decisão do juiz, após o cumprimento de um sexto da pena. Ou
seja, caso não haja incidente atípico na execução após cumprir um sexto da
pena, o apenado em regime semiaberto passa para o regime aberto.
“Nesse momento, ela passa a ter automaticamente direito ao
trabalho externo, por ser da essência do regime aberto. Isso significaria,
então, que no regime semiaberto não haveria direito ao trabalho externo, porque
se fosse exigível aguardar o cumprimento de um sexto da pena, o condenado já
estaria no regime aberto”, fundamenta.
Segundo o relator, o trabalho externo para os condenados no
regime semiaberto também é o melhor do ponto de vista pragmático levando em
conta a atual situação carcerária do país. Relatando dados do Conselho Nacional
de Justiça (CNJ), o ministro Roberto Barroso citou que o déficit de vagas no
sistema penitenciário brasileiro é de 210.436 vagas. Além disso, diversos
estados não possuem colônias agrícolas, industriais ou similares, onde os
condenados no regime semiaberto deveriam cumprir sua pena.
“Se todos reconhecem que o sistema está abarrotado e que não
há oferta suficiente de trabalho interno mesmo nos poucos estabelecimentos que
têm o perfil adequado para o regime semiaberto, por qual razão se haveria de
negar o trabalho externo aos presos que preencham os requisitos subjetivos e
tenham uma oferta real e adequada de uma instituição pública ou privada?”,
apontou.
Delúbio Soares
Em relação ao recurso de Delúbio Soares na EP 3, o ministro
Roberto Barroso avaliou que o fato de o condenado ter solicitado trabalhar na
CUT (Central Única dos Trabalhadores), da qual é um dos fundadores e onde atuou
por vários anos, não impede a concessão do benefício.
“Como todos os demais condenados em regime semiaberto que
pleiteiam o direito ao trabalho externo, é certo que o agravante buscou uma
oportunidade junto a pessoas do seu ciclo de relações”, disse. A seu ver, o
fato de a oferta de trabalho vier de um local em que o apenado já atuou não é
causa suficiente para a revogação do benefício, pois é uma forma legítima de
reinserção social.
Valdemar Costa Neto
Na decisão referente ao ex-deputado Valdemar Costa Neto (EP
19), que exercia a função de gerente administrativo de um restaurante, o
relator sustentou que não há vedação legal ao trabalho externo em empresa
privada e que o artigo 36 da LEP fala expressamente em “entidades privadas”.
“Embora esse dispositivo cuide especificamente do trabalho externo para os
condenados em regime fechado – que deve ser realizada em obras públicas – não
seria coerente imaginar que o regime semiaberto, menos restritivo, estaria
sujeito a vedações adicionais e implícitas”, assinalou.
Conforme o ministro Roberto Barroso, o trabalho externo em
entidade privada é efetivamente praticado na realidade do sistema carcerário,
beneficiando vários condenados que se valem dessa oportunidade para encaminhar
sua reinserção social. “Também aqui, não vejo qualquer fundamento
constitucionalmente legítimo que justifique dar tratamento desigual aos
condenados na AP 470 ou, o que seria muito pior, promover um retrocesso geral
no sistema e restringir as perspectivas já limitadas dos presos no Brasil”,
observou.
Jacinto Lamas
O ministro Roberto Barroso também restabeleceu o trabalho
externo deferido a Jacinto Lamas (EP 11) pelo juízo da Vara de Execuções Penais
(VEP) do Distrito Federal. Conforme o relator, os autos atestam que Lamas vem
desenvolvendo atividades laborativas, tanto na biblioteca interna quanto na
limpeza e manutenção do estabelecimento prisional, sem anotação de
indisciplina. “Não existem razões objetivas que desabonem a conduta carcerária
do agravante”, afirmou.
O relator reforçou que o ex-tesoureiro do PL entregou-se
voluntariamente para o cumprimento da condenação e não há qualquer elemento que
sugira o risco de que venha a se evadir. Constatou, ainda, a aptidão para o
trabalho pretendido, na linha do que exige o artigo 37 da Lei de Execução Penal,
portanto, sob o ponto de vista pessoal, não existe impedimentos à adoção da
medida.
Lamas recebeu oferta de emprego formulada por empresa de
engenharia estabelecida no Distrito Federal há mais de 20 anos, sem que haja
qualquer indicativo de inadequação.
Pedro Corrêa
Em relação a Pedro Corrêa (EP 16), o relator reconsiderou a
decisão questionada para restabelecer o trabalho externo em uma clínica de
Garanhuns (PE). Segundo o ministro Roberto Barroso, a VEP de Pernambuco
realizou procedimento de análise da adequação da proposta, incluindo a inspeção
no local de trabalho, além de determinar a utilização de dispositivo de
monitoramento eletrônico.
O relator salientou que não há anotação de indisciplina do
ex-deputado e também não há razões objetivas que indiquem falta de
responsabilidade para o trabalho externo. Lembrou ainda que Corrêa também se
entregou voluntariamente para o cumprimento da condenação e não há qualquer
elemento que sugira o risco de que venha a se evadir.
Quanto à questão da saída temporária, para evitar distinções
em relação aos demais condenados que cumprem pena em Pernambuco, o ministro
Roberto Barroso restabeleceu a decisão da VEP. O relator autorizou a saída para
visitação à família, impondo a utilização de dispositivo de monitoramento eletrônico,
com a ressalva de que seja observado um intervalo mínimo de 45 dias entre as
saídas.
Carlos Alberto Rodrigues
O condenado Carlos Alberto Rodrigues Pinto (Bispo Rodrigues)
recebeu convite para trabalhar em uma Estação de Rádio sediada em Brasília. Ao
decidir na EP 17, o ministro Roberto Barroso mais uma vez frisou que o trabalho
externo em entidade privada é não apenas possível, mas efetivamente praticado
na realidade do sistema, beneficiando numerosos condenados que se valem de
oportunidades como essa para encaminhar a sua reinserção social.
O ministro lembrou que o sentenciado entregou-se
voluntariamente para o cumprimento da condenação e não ha qualquer elemento que
sugira o risco de que venha a se evadir.
Além disso, constata-se que o Bispo Rodrigues apresenta a aptidão para o
trabalho pretendido – de supervisor de manutenção na Rádio Antena 9 –, na linha
do que exige o artigo 37 da LEP. “Sob o ponto de vista pessoal, portanto, não
verifico impedimentos a adoção da medida”, concluiu o relator ao reconsiderar a
decisão e permitir o trabalho externo para o condenado.
Romeu Queiroz e Rogério Tolentino
Com relação ao pedido de trabalho externo formulado pelo
ex-deputado Romeu Queiroz e pelo advogado Rogério Tolentino, o ministro Roberto
Barroso desproveu os agravos por eles interpostos, respectivamente nas EPs 12 e
20, e manteve decisão do então relator, ministro Joaquim Barbosa, que impedia a
prática de trabalho externo para os apenados.
Queiroz pretendia obter autorização para trabalhar na
empresa RQ Participações S.A., de sua propriedade. Já Tolentino pedia
autorização para trabalhar na mesma empresa e para estudar fora.
Para o relator, da documentação juntada aos autos, não se
verifica a realização de diligências prévias para aferição da idoneidade da
proposta de emprego. O ministro Roberto Barroso ponderou que o convênio firmado
entre Minas Gerais e a empresa do ex-deputado não especifica a jornada de
trabalho a ser cumprida, “limitando-se a estabelecer o máximo de oito horas
diárias”. Salientou ainda que “embora o convênio estipule as obrigações do
empregador, não há menção aos mecanismos de controle da jornada de trabalho e
das tarefas realizadas”.
O ex-deputado pretendia ainda reverter decisão do então
relator que não autorizou sua saída da penitenciária para participação em curso
de Teologia, na modalidade ensino a distância, no horário de 19h30 às 23h30.
Ao decidir sobre o pedido de estudo externo, o ministro
levou em consideração os mesmos princípios observados em relação às condições
que permitem autorizar o trabalho externo e que, em sua avaliação, dispensam o
cumprimento de um sexto da pena. “Considero que a exigência do requisito
temporal esvaziaria o instituto da saída temporária e a própria possibilidade,
relevante para a ressocialização, de estudo externo”, ressaltou. Entretanto, o
ministro registrou que, no caso de estudo, “esse entendimento não se encontra
cristalizado na jurisprudência nacional”.
Contudo, o relator destacou que, embora no pedido tenha sido
especificada a unidade de ensino a ser frequentada, inexiste na decisão do
juízo da VEP qualquer determinação ou ressalva quanto à fiscalização da rotina
de estudo e datas de início e fim do curso.
Dessa forma, ele afirmou que tal
autorização está “em contrariedade à determinação legal de que o afastamento da
unidade prisional deve durar o período necessário à realização da atividade
educacional (LEP, artigo 124, parágrafo 2º)”. O mesmo critério foi utilizado
pelo ministro para rejeitar o pedido de estudo externo para Tolentino.
Fonte: Site do STF